The Casual Vacancy – Morte Súbita


De certa maneira, acho o título Morte Súbita muito apropriado para o livro que eu li. Se iniciando com a morte repentina de Barry Fairbrother e a vacância que ele deixa no Conselho de Pagford (daí que vem o nome original, The Casual Vacancy), o livro parte disso para contar a história de uma cidade inteira. De suas pessoas, suas vidas, seus problemas, seus medos. E termina de um jeito de partir o coração, com outro funeral com semelhanças ao inicial, mas muito mais emotivo e difícil de acompanhar na leitura.
O aperto no coração é profundo. O nó na garganta é irreparável. Meus olhos estavam esbugalhados durante as últimas 100 páginas de livro e, não tenho vergonha de admitir, fui correndo deitar no colo da minha mãe em busca de um pouco de consolo. Que ainda não adiantou. É um daqueles livros que você sabe que são ótimos, extremamente bem escritos, mas que você não tem certeza se lê-lo faz bem. É uma história muito pesada, e as últimas partes me deixaram com uma tristeza tão profunda e genuína que eu demorei para superar. De verdade.
Morte Súbita é a história de Pagford (claro que não podemos esquecer Fields), um vilarejo na Inglaterra onde muitas vidas acontecem, muitas histórias se conectam, e todas elas tem uma precisão gigantesca. Uma coisa admirável que JK Rowling conseguiu fazer. Comecei a ler o livro já chocado, pela narrativa tão bem escrita (ela é um máximo!), mas pela diferença abismal daquilo que estávamos acostumados. Sem medo dos palavrões, de ser explícita ou de ser cruel, o livro tem uma linguagem muito mais adulta; e mais do que isso, uma história muito mais adulta que você precisa de um certo preparo para digeri-la.
A partir de uma morte repentina e de uma vaga no Conselho de Pagford, Rowling nos guia pela história desse vilarejo, apresentando uma brilhante variedade de personagens. Vários núcleos, todos envolvidos de algum jeito, e trabalhando juntos para contar uma só história. A narrativa é surpreendentemente real, e depois de ler o livro parece que você realmente conhece cada uma daquelas pessoas, as entende e as ama. E elas parecem fazer parte da sua vida, parecem existir em algum lugar por aí.
Barry e Mary Fairbrother, Howard e Shirley Mollison, Miles Mollison, Samantha Mollison, Krystal, Robbie e Terri Weedon, Colin Wall (Pombinho), Tessa Wall, Stuart (Bola), Andrew Price, Simon e Ruth Price, Parminder, Vikram e Sukhvinder Jawanda, Gavin Hughes, Kay e Gaia Bawden…
E os temas abordados.
J.K. Rowling apresenta uma narrativa contundente e repleta de boas histórias. Mortes, assassinatos, suicídios, TOC em estágios elevados e preocupantes, infelicidade de todas as maneiras, traição, desejos, drogas, estupro, abandono de crianças, tentativas de chamar atenção, adoção, espancamento de um pai autoritário, ambição, cobiça, egocentrismo, crítica social, bullying, entusiasmo, esperança… sem nunca temer a realidade em suas palavras. Cada uma das histórias se desenvolve da maneira mais elaborada possível, com veracidade em cada linha, crueldade e angústia.
E a tudo isso ainda se mistura uma grande briga política que foi nosso ponto de partida, amplamente influenciada pelas crenças e desejos de cada um. E seus problemas. O Fantasma de Barry Fairbrother é uma jogada genial e presente na realidade, e eu amei ver cada uma das discussões. Torcer por um lado ou por outro, entender os motivos de ambos sem nunca abandonar o meu. Aplaudir de felicidade quando Jawanda diz tudo o que queríamos ouvir na sua última reunião no Conselho. Detestamos verdadeiramente personagens com mente pequena que só pensam no próprio bem, com um egoísmo inesgotável, admiramos outros que parecem mais conscientes politicamente, e que querem soluções e que mostram porque têm a razão… é inteligentíssimo.
Eu amo Kay. E eu amo Krystal.
O livro é uma grande montanha-russa de emoções. Você se diverte, você ri, você se sente como Andrew de vez em quando, porque os detalhes tornam isso inevitável. Mas você sofre ao lado de cada um, você sofre com Krystal, com Terri… você sente nojo verdadeiro de pessoas como Simon Price. Sente ódio, raiva de Stuart Wall. Compaixão misturada a um pouco de indignação de Sukhvinder, raiva de Howard. E um desejo para que as coisas dêem certo, mesmo quando você sabe que elas não darão. É incrível como as emoções são verdadeiras e tomam todo nosso ser – parece realmente o que sentimos por uma pessoa de verdade, sentimentos raramente experimentados durante a leitura de um livro.
É um retrato da vida. E sabe de uma coisa? A vida não é justa.
Eu jamais, JAMAIS voltarei a escutar Umbrella sem lágrimas se juntar nos olhos. Na verdade, no momento, não quero nem pensar em passar perto dessa música, mesmo com tudo o que ela significa para aquelas cenas da equipe de remo, tão bem utilizadas por Sukhvinder para terminar o livro. É um livro perspicaz, instigante, emocionante, bonito, triste. E acima de tudo, real. Um grande convite a ponderar sobre nossas vidas e as vidas ao nosso redor. Não é uma leitura fácil.
Eu digo: leia! Leia sim porque o livro é fascinante e perfeito. Mas esteja preparado psicologicamente. Porque o livro é torturante em vários momentos, angustiante, perturbador. Mas é um livro que todo leitor precisa ter em sua estante, é algo que lemos e apreciamos, e depois gostaremos de ler novamente. É algo que esperarei ansiosamente pela série da BBC. É algo que eu quero que o mundo saiba que é bom, e que vale a pena. Rowling mostrando uma face sua nunca esperada, com a mesma perfeição que já fez antes. Leiam!

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