Life is a Cabaret
Meio em choque com o filme. Ele é muito
diferente da peça. O que não é uma crítica negativa, porque eu gostei
bastante do filme, mas eu fiquei surpreso. Confesso que fiquei muito surpreso…
a quantidade de músicas tiradas, os nomes e nacionalidades mudados, as
histórias retiradas e aquelas acrescentadas… o filme é de 1972, e vagamente
baseado no musical da Broadway, de 1966, vencedor de 8 Tony Awards – que já
ganhou vários e vários revivals, e
uma versão brasileira (confira
a crítica aqui).
Não consigo escrever esse texto sem entregar-me às
comparações. Portanto, vou tentar começar por aqui, para que depois eu possa
avaliar o filme apenas como filme – que por sinal é muito bom. O
principal baque está nas canções – várias importantes foram colocadas apenas
instrumentais – mas uma coisa que me surpreendeu bastante foi o Cabaret em si.
O Emcee perdeu muito de seu espaço, e isso é fácil de se compreender, afinal a
linguagem de teatro e a de cinema são diferentes; e sua interação com o público
não é o forte para cinema. Mas o Cabaret em si perdeu um pouco de seu brilho, pois
ele pareceu muito à parte da história, como se estivesse perdido, deslocado,
parte de outra história…
Tudo isso se deve à distinção teatro x cinema,
então não dá para entrar em críticas. Afinal, o filme possui maiores cenários e
precisa utilizá-los… mas o que mudou bastante foi então apresentar Sally como
uma boa cantora, não apenas em seus sonhos… Cliff Bradshaw virou Brian Roberts
– de americano virou britânico, mas tinha bem uma cara de alemão, não tinha? A
contraparte americana do longa fica para Sally, também transformada no filme…
ao menos a bissexualidade de Brian não se alterou.
E eu gostei bem mais dessa parte tratada no filme,
apenas para comentar. As primeiras olhadas na fila do banheiro do Cabaret me
fizeram esperar por uma cena como a da peça. Que não aconteceu. Portanto
esperei que esse lado do longa fosse abafado. Mas com a chegada de Max, o ciúme
e tudo o mais… presenciamos algumas trocadas de olhares e sorrisos memoráveis
(como na dança, ou no momento em que Brian acende o cigarro de Max, antes do
hino dos nazistas). Eu vibrei, mas achei que isso fosse ficar nas entrelinhas…
Mas… as cenas com Sally foram as que
finalizaram essa história toda com perfeição. Logo no começo, quando ela o
beija pela primeira vez e as coisas não dão muito certo, amo sua fala de “Maybe
you just don’t sleep with girls” – a qual ele responde genialmente (cena
presente na peça). Mas o melhor fica para a discussão quando Max vai embora;
Brian está mais alterado do que o normal, e ao gritar: “SCREW MAXIMILIAN!” ela responde:
“I do”. O mais surpreende, que me deixou de queixo caído por alguns segundos,
tentando me recompor, foi a fala seguinte de Brian: “So do I”.
Com certeza fica para as mais memoráveis do longa.
Max nunca existiu na peça, apenas para constar.
Para quem não conhece Cabaret, é a história de Sally Bowles, uma dançarina do Kit Kat
Club que sonha em ser uma atriz. Conhece o escritor/professor
americano/britânico Brian/Cliff, e os dois acabam tendo um caso em meio à essa
vida de Cabaret e a ascensão do Partido Nazista na Alemanha. A parte do nazismo
é uma das melhores, e de certa forma achei-a mais presente no filme.
Difícil fazer essa comparação, mas o caso foi
apresentado mais cedo (embora a apresentação com Tomorrow Belongs to Me tenha sido muito emocionante na peça; não
teve toda aquela carga no filme, eu acho), e portanto mais incorporado à
história. Mesclado com músicas agitadas e alegres, as cenas da violência
nazista se tornam ainda mais chocantes – algumas horríveis, como Natalia vendo
seu cachorro morto ao abrir a porta de casa. E Fräulein Schneider mal teve
importância no filme (nem lembro se escutei sua voz), muito menos um noivo
judeu…
Mas o caso dos amantes judeus x nazistas fica para
Natalia e Fritz, em um subplot que não existia na peça. Inicialmente esperava
que ele fosse um Ernst Ludwig, como na peça, mas o personagem é absurdamente
diferente. O que é uma pena, porque o jeito malandro, a mala no trem, o adepto
do nazismo revelado mais tarde… isso tudo era muito interessante. Fritz, o
amigo de Brian no filme, é um judeu (que não diz que é judeu), que se apaixona
por uma judia que não aceita se casar com ele por ele não ser judeu como ela…
uma complicação toda, mas uma história interessante.
Sally teve um pequeno subplot envolvendo o pai
(que não vemos), mas que foi uma das partes mais emocionantes da história.
Gostei demais de Maybe This Time e de
como foi colocada no filme, após a primeira vez de Sally e Brian… as cenas
mescladas com a apresentação no Cabaret ficaram belíssimas. A música não estava
na versão original da peça, mas foi incorporada (em um contexto diferente).
Comentário solto: amei a clássica cena do grito de Sally quando o trem passa…
não tinha como colocar isso no musical.
Pois é, como eu comentei, fazer o comentário desse
filme sem misturá-lo com a peça é inevitável. Mas, sim, eu gostei do filme,
desde que saibamos avaliá-lo independentemente de comparações pejorativas…
algumas coisas eram melhores na peça, mas algumas tramas acrescentadas ou
alteradas se tornaram bem interessantes… o casaco de pele, a gravidez, o
aborto, no entanto, permanecem o mesmo… senti falta de uma Sally acabada,
sofrida, maltratada e chorando para cantar Cabaret…
o final foi muito alegre no filme, mas enfim. É um ótimo filme, e eu deixo a
recomendação para todos! Boa sorte em procurá-lo, afinal o DVD nunca foi
lançado no Brasil, mas vale a pena a busca… ambos peça e filme são fantásticos,
não deixem de conferir! Até mais…
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