Reinações de Narizinho – O Gato Félix


É o momento de valorizar o personagem do Visconde como um sábio!
O Gato Félix nunca foi a minha história favorita em Reinações de Narizinho, mas eu reconheço suas divertidas insinuações, e adoro o modo como Visconde de Sabugosa é valorizado. Ele tem um momento que é todo seu, ele cresce em meio aos personagens do Sítio do Picapau Amarelo, lentamente ascendendo à posição importante que ocupa entre os protagonistas. Também é uma história tradicional, e o momento em que Monteiro Lobato estabelece que o pessoal no Sítio tem costume de uma história antes de dormir. Pode ser uma história contado por uma das crianças, pode ser histórias de Dona Benta ou lições… que futuramente darão base a livros como Peter Pan ou Serões de Dona Benta.
A história começa com o suposto Gato Félix, que apareceu pelo Sítio no final da história passada, e Narizinho se vê ansiosa para conhecer as aventuras da figura. A história está organizada em três capítulos. Primeiro, A história do gato. O Gato conta uma história meio absurda, meio sem-pé-nem-cabeça, que vem lá do descobrimento da América, passando por alguns velhos que ele conheceu, um navio se afundando (que me faz pensar em Titanic), uma temporada vivo no estômago de um tubarão (“Jonas era profeta e Seu Félix é quadragésimo. Dá na mesma”) e a busca pela Terra onde o demo perdeu as botas. Trata-se de uma sequência de maluquices desapontadoras, que terminam com Emília dizendo que pode fazer melhor.
E la vai ela.
Acho muito interessante ver Emília contando uma história. É uma história razoavelmente simples, e repleta de todos os clichês possíveis. Tem, sim, todos os defeitos apontados pelo Gato: como a facilidade dessas histórias de virar. Qualquer dificuldade que aparece eles resolvem virando em outra coisa. Mas é uma história bonitinha, com lição de moral e tudo, que valoriza a boneca por seu intelecto – ela está deixando de ser a burrinha e asneirenta de antes para ser uma boneca inteligente, e é um crescimento bacana. Também tal inteligência se revela no fato de saber dizer se uma pessoa está mentindo, assim como o Gato Félix está mentindo: ele não é americano, não é parente do Gato de Botas e não foi engolido vivo por um tubarão…
Mas quem resolve toda a história é o Visconde. Desde o aparecimento do Gato no Sítio do Picapau Amarelo, pintinhos vêm sumindo, e Tia Nastácia não entende o que está acontecendo… o Visconde de Sabugosa conduz toda uma investigação, inspirado pela época em que passou enrolado num fascículo de Aventuras de Sherlock Holmes, e chega a um resultado: que conta no seu capítulo, na sua história, no terceiro dia. Visconde é o responsável por revelar, todo sabido, que o Gato Félix é um impostor, e é quem vem comendo os pintinhos no Sítio. Uma festa toda ao Visconde, ao “nosso Sherlock Holmes”, e Dona Benta o coloca em uma posição muito mais importante no Sítio, além de prometer que vai curar-lhe do bolor e tomar conta dele…
“O relógio bateu as dez horas, e enquanto os meninos se recolhiam a velha pegou o Visconde e guardou-o bem guardadinho na sua estante, entalado entre uma aritmética e uma álgebra – fato que iria ter notáveis conseqüências futuras.”

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