Desventuras em Série 1x05 – O Lago das Sanguessugas: Volume 1


“The world is scary and we should be afraid”
Os Irmãos Baudelaire são novamente transferidos de tutor e chegam à casa de Tia Josephine cheios de esperanças de que ela vá ajudá-los a conseguir algumas respostas sobre o incêndio que supostamente matou seus pais, bem como toda a questão dos códigos secretos e assim por diante. No entanto, encontram uma mulher assustada que tem medo de TUDO e que não pode lhes dar, de fato, respostas contundentes. Não mais do que avisos sobre como uma maçaneta pode explodir em mil pedacinhos e te acertar nos olhos, ou ainda servir-lhe uma sopa fria de pepino porque tem medo de ligar o fogão. O episódio passou depressa e acabou bem onde desconfiamos que acabaria, mas ainda com muita coisa para acontecer na próxima parte. Com um visual belíssimo e uma agilidade no roteiro, é um dos meus episódios favoritos!

For Beatrice –
I would much prefer it if you were alive and well.

Adorei a introdução do episódio, que mostra uma reportagem em um jornal sobre os Baudelaire, brevemente revisando o que já aconteceu até então e valorizando a estética diacrônica da série que a torna tão interessante – se nos episódios passados tivemos notícias de uma tal “internet”, nesse a câmera e o estilo do jornal é claramente bastante antigo. Vemos os Baudelaire pela primeira vez em O Lago das Sanguessugas no Cais de Dâmocles, numa introdução que se parece imensamente com o livro. Um taxi para levá-los à casa da Tia Josephine, que não veio buscá-los. Balas de menta às quais eles são alérgicos. Sr. Poe explicando o que é um táxi para a Violet, surpreso que uma garota da sua idade “não saiba”. A única diferença, basicamente, esteve no fato de a Violet jogar as balas de menta fora, o que quer dizer que eles vão precisar de outra estratégia para “ganhar tempo” na Parte 2.
Fiquei imediatamente apaixonado pela belíssima fotografia do episódio. Em O Lago das Sanguessugas, tudo se torna mais escuro, sombrio. A estrada que leva à casa de Tia Josephine, é perturbadora. A casa em si é BRILHANTEMENTE bem reproduzida! Na beira do penhasco, perigosamente equilibrada, eles souberam trazer tudo o que caracterizava o lugar bem à vida. O aviso para que visitantes vão embora. A campainha que não funciona. O telefone proibido de se usar. As paredes rachadas. O tom escuro. Os medos irracionais de Tia Josephine são representados por seus comentários que parecem saídos diretamente do livro, e um grito extra ao se ver em um espelho, que foi hilário. Tudo é engraçado, e macabramente bizarro – E ISSO SÃO AS DESVENTURAS EM SÉRIE. E então a Tia leva os três irmãos até à sua biblioteca, e a Janela Ampla que, no original, dá nome ao livro.
Tia Josephine fala sobre uma amizade com os Baudelaire pais, e conta a história de seu marido Ike, que depois de ter comida, entrou no Lago apenas 45 minutos mais tarde, e então foi devorado pelas sanguessugas que podem sentir o cheiro de comida à distância. É apavorante. [E o que é o grito de Josephine quando o mapa se solta e se enrola sozinho pra cima?] Ah, e o irritante amor pela gramática que, eventualmente, se mostrará tão importante. Diferente do livro, a intensidade de Violet e Klaus já atingiu um patamar mais visível nesse episódio. Eles QUEREM RESPOSTAS, insistem com a Tia Josephine em perguntas sobre o tempo dela com seus pais sobre os quais ela não quer conversar. Mas eles só encontram frustração em suas investidas – e detalhe para a importância de Tia Josephine comentando que imagina que Ike esteja, agora, num lugar QUENTE.
Uma parte ADORÁVEL do episódio foi a reprodução quase que perfeita do discurso de Lemony Snicket sobre “medos racionais” versus “medos irracionais”, com os seus mais perfeitos exemplos, tudo dando-nos a impressão de que estamos de volta aos livros, o que é nostálgico e delicioso para qualquer fã de Desventuras em Série. Que bom que temos o personagem de Lemony Snicket fazendo esse papel! Por sinal, o personagem já começa a se integrar à história, em menções. Vemos cenas extras, que funcionam quase como bastidores de eventos que outrora conhecemos. Como o Conde Olaf chegando à cidade, buscando informações, e então ele briga com um membro de VFD (mas o nome da organização ainda não é mencionado nenhuma vez) que diz que as crianças estão sob os cuidados do membro mais forte e formidável da “organização” – e o Conde Olaf se pergunta se é o Snicket.
De todo modo, ali ele descobre onde as crianças estão.
E se prepara para ir atrás delas.
O episódio ainda se preocupa em caracterizar a Tia Josephine e explicar-nos, mais tarde, esse discurso sobre ela ser “a mais forte e formidável da ‘organização’”, porque não é bem o que sabemos dela – a cena dos presentes (com o presente de Klaus trocado de um trem de brinquedo para um baralho) é muito igual ao livro, mas então as crianças são deixadas em casa sozinhas, onde preparam comidas quentes e acendem velas! Seus comentários falam sobre como a Tia Josephine está tentando, e por isso eles não devem reclamar, mas Klaus admite: “I wanna complain anyway”, o que mostra vulnerabilidade e humanidade no personagem, me fazendo gostar AINDA MAIS dele. Mas, ainda sozinhos, as crianças conseguem abrir o cofre da tia, com a senha IKE (9-11-5), e descobrem muita coisa que ainda deve ser devidamente explorada em momentos futuros.
Quer dizer, no cofre eles encontram uma partitura de Beethoven, a música que Ike assobiava, e fotos INSANAS da Tia Josephine, como lutando com um jacaré e vencendo, ou lutando boxe, pulando de paraquedas… destemida. Fora uma edição do “História Incompleta das Organizações Secretas”, o mesmo livro que vimos previamente na casa da Juíza Strauss. No entanto, as crianças têm outras coisas mais importantes com as quais se preocuparem quando a Tia Josephine retorna. Por um momento, eles ficam cheios de esperança por seu discurso de quem quer voltar a ser “forte e formidável”, mas ela fará isso saindo em encontros com um cara que acabou de conhecer: o Capitão Sham. E, como vocês já devem ter adivinhado, eis o Conde Olaf. É dali em diante que a Tia Josephine começa a se tornar uma pessoa bem vergonhosa, se preocupando mais com gramática do que com as crianças, e não acreditando nelas.
Mas nenhum adulto jamais acredita nos Baudelaire!
Isso é uma crítica bacana e forte, porque os adultos tendem mesmo a menosprezar as opiniões ou visões das crianças, que muitas vezes estão CORRETAS. Como é sempre o caso dos Baudelaire. Assim vemos o flashback de Tia Josephine e “Capitão Sham” se conhecendo, e a participação da trupe do Conde Olaf foi a MELHOR PARTE! E, assim, ali está o importante erro gramatical do cartão: “própia vela” ao invés de “própria vela” (“it’s own” ao invés de “its own”, no original). Eu devo ressaltar que me agrada a abordagem da série em relação a algumas coisas, especialmente à veracidade do SOFRIMENTO dos Órfãos Baudelaire. Nada disso está simplesmente sendo levado levianamente. O Conde Olaf de Neil Patrick Harris é mesmo ameaçador, vilanesco… para as crianças, é traumatizante, e o sofrimento, angústia, medo e frustração está estampado em seus rostinhos perturbados ou em lágrimas.
Eu gosto de ver isso porque é um retrato importante. Afinal de contas, os Baudelaire são crianças “fortes e formidáveis”, com ideias incríveis e uma capacidade tremenda de fugir do Conde Olaf, mas isso não quer dizer que não sofram, que não tenham medo, que não estejam assustados. E esse foi o episódio que mais deixou isso claro até aqui. E quando a Tia Josephine sai com o “Capitão Sham”, eles tentam pensar em como fugir. Sunny sugere um Uber. Como os capangas estão do lado de fora, eles pensam na janela da biblioteca, Violet amarra seu cabelo… mas isso parece arriscado demais, louco demais. Eles estão com medo, com poucas esperanças, mas a conversa de Violet e Klaus é PERFEITA. Eles se lembram de o que os pais diziam: “Façam as coisas assustadoras primeiro. Se assustem depois”. E assim, um pelo outro, eles ganham força para seguir em frente.
E ISSO É TÃO LINDO! <3
Dali em diante, as coisas acontecem DEPRESSA. Subitamente a Tia Josephine está incomodada no carro, e os irmãos estão em outra parte da casa quando escutam um barulho de vidro se quebrando. Ao chegarem à biblioteca, veem que a janela está quebrada com o formato de uma pessoa, e presumem que Tia Josephine se matou. Lemony Snicket nos garante que não há nada que possamos fazer agora para ajudá-los naquele tempo, e então acompanhamos Violet, Sunny e Klaus olharem da janela quebrada para o Lago Lacrimoso, lá embaixo, enquanto encontram e leem um bilhete de suicídio de sua tutora que, através dele, se despede deles. Ou não. Afinal de contas, devemos notar que existem erros gramaticais gritantes já no começo do bilhete, coisas que Tia Josephine não cometeria. Como dizer que sua vida chegou ao “própio” fim. De todo modo, em outro exemplo de BRILHANTE FOTOGRAFIA, vemos Lemony Snicket de pé nas ruínas da casa destruída de Tia Josephine (com uma inscrição “Beatrice” visível), enquanto ele nos avisa…


I can tell you that Aunt Josephine was not dead at all.
Not yet.


Que venha O Lago das Sanguessugas: Volume 2 ENTÃO! \o/

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P.S.: Aquela loja, “Momento Morris’ Souvenirs” propositalmente lembra o lema da Escola Preparatória Prufrock, não? Estou adorando essa maneira da série de incorporar as “dicas” das desventuras seguintes no meio do episódio, mais ou menos como, nos livros, Lemony Snicket fazia em sua carta ao editor.

Comentários

  1. Pensando agora em algumas coisas que você destacou, acho que a moral do episódio melhorou pra mim -- mas ainda não é meu favorito, definitivamente. De fato, a urgência dos Baudelaire por respostas surge muito mais rapidamente que no livro (o que é ótimo e condiz absolutamente com o antecipação dos elementos de mistério). Neste episódio, de novo, fiquei em polvorosa com as aparições do Olaf e sua trupe! O que são as gêmeas de cara branca? Maravilhosas! O Capitão Sham por si só não era tão cômico quanto o Stephano, mas as dobradinhas dele com a com o Sr Poe (outro personagem maravulhosamente detestável) ou com a trupe eram de gargalhar! A cena com a Tia Josephine foi muito boa, mas... não gostei da personagem. Confesso que talvez a encarnação da Meryl Streep ainda esteja impregnada no meu imaginário (era a melhor personagem do filme, afinal); mas me deu a impressão de que faltou algo de convincente na personagem, infelizmente. E isso comprometeu o episódio pra mim -- aliás, tive a impressão de que os dois episódios foram arrastadíssimos... Pode ser implicância minha. Foi legal ver que a sua percepção foi diferente...

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    1. Eu não sei explicar direito o que eu senti. Minha impressão não foi de que o episódio foi arrastado porque pra mim passou rápido DEMAIS. Mas também, pensando depois e analisando minhas anotações, parece que não aconteceu tanta coisa... foi meio paradoxal. De todo modo, eu gostei bastante, e a série se sustenta, se precisar, em ambientes belissimamente construídos e pequenos momentos adoráveis. Sei lá. Vou escrever sobre a Parte 2 e então vamos ver o que você acha! :D

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  2. E as referências todas são pra fã nenhum botar defeito!

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