O Filme da Minha Vida (2017)
“Eu cheguei
e ele partiu. O resto, eu não posso contar”
O Filme da
Minha Vida é um filme brasileiro, dirigido e roteirizado por Selton Mello,
baseado no livro Um Pai de Cinema, de
Antonio Skármeta. Eu estava esperando por esse filme desde que ouvi falar dele
pela primeira vez, e quando vi o trailer, fiquei deslumbrado, instantaneamente
apaixonado. O Filme da Minha Vida é
um dos filmes mais bonitos, poéticos e melancólicos que eu assisti nos últimos
anos! Filmado na Serra Gaúcha e ambientado em 1963, o filme faz um detalhado
trabalho na sua construção fotográfica, que recria espaços e figurinos da época
com uma interessante paleta de cores, aliado a uma trilha sonora encantadora,
um conjunto que parece nos transportar diretamente de volta no tempo. E, também
as atuações são arrepiantes! Johnny Massaro interpreta brilhantemente Tony
Terranova, um garoto que precisa aprender a conviver com a ausência do pai.
Sua narração é belíssima, serena, quase bucólica.
Ele fala sobre o pai, e sobre como uma vez ele lhe dissera que “só assistia ao
começo e ao final dos filmes; o começo para conhecer a história, e o final
porque os finais sempre são bonitos”. Tony Terranova foi para a capital
estudar, e quando ele retornou à sua cidade com o diploma de professor na mão,
o seu pai embarcou no mesmo vagão, de volta para a França. Desde então,
diariamente, Tony vai com a sua bicicleta até a estação, na esperança de que,
talvez, o seu pai possa retornar, mesmo depois de ter passado dois anos sem
notícias suas. Tony é um rapaz encantador, apaixonante. Jovem e cheio de vida,
ele é fofo, sonhador e cheio de esperança. Podemos ver na maneira como leva as
suas aulas de francês à sério, ou como olha para as irmãs Madeira treinarem uma
coreografia, ou como fala do cinema.
“O fim eu
não posso contar”
Tony também é cheio de memórias do pai, as mais
bonitas memórias, que vem a ele em diversos momentos, e que significam muito.
Memórias como quando o pai lhe ensinou a andar de bicicleta, um momento tão
singelo e tão marcante, que quase me levou às lágrimas. Uma construção
belíssima e comovente do filme, para nos mostrar esses momentos que faziam com
que a relação de Tony com o pai fosse admirável. Quando eles arrumavam a moto
juntos, por exemplo, e o pai prometia que ela um dia seria dele, desde que ele
ajudasse a consertá-la agora. Tony Terranova tem um sorriso contagiante, que
não é de alegria, mas também que não é de tristeza… é de esperança. Machuca quando ele tenta falar sobre o pai com a
mãe, e a mãe fica brava e sai batendo a porta, dizendo que “ele também não
tentou fazer nada”.
Doeu.
Na vida de Tony Terranova, também existe a doce
Luna Madeira, interpretada por Bruna Linzmeyer, e eu acho o seu encanto
irresistível. A maneira como Luna fala de seu sonho mais bizarro, quando estava
indo para a lua em uma moto voadora, em que o piloto era a Miss Brasil, e então
um marciano conversa com ela na lua… ela
não lembra do final do sonho. Ela é uma garota também doce, o par perfeito
para Tony. Sonhadora, apaixonada e apaixonante. Eu gosto das relações dos dois.
Como ela fala expansivamente, enquanto ele é tão silencioso, mas um ótimo
ouvinte. Como eles compartilham momentos como aquele à beira do lago,
eternizado em uma belíssima fotografia que ela mesma revela. Os dois me fazem
suspirar, me fazem pensar em filmes como “God
Help the Girl”, filmes poéticos que ganham festivais ao redor do mundo.
Como quase
tudo nesse filme.
Adorei a sequência da Fronteira. Tony quer ir até
lá e leva Paco (Selton Mello) com ele. A princípio, eles estão indo para a
“zona” – talvez tenha sido os garotos da escola que colocaram isso na cabeça
dele! Mas a “Fronteira” é uma cidade grande. Tony pode andar, apreciar tudo o
que tem ao seu redor, e IR AO CINEMA. Ele é apaixonado
pelo cinema, e isso nos diz muito sobre ele. O seu sorriso ao ver um filme, a
maneira como sai de lã, sorrindo que nem um bobo e flutuando… e ele acaba mesmo
num bordel, e é uma das sequências mais brilhantes do filme! Tem tudo a ver com
a época, e a Carmélia, com o seu sonho de estudar geografia, era uma fofa –
além de hilária, porque aquele “Ah, eu
sou professor… e você?” “Puta” me deixou rindo por muito tempo. Bem como a
risada dela depois que eles transam, a
primeira vez dele.
É na segunda vez que Tony vai à Fronteira, para
levar Luna ao cinema e o pequeno Augusto à “zona”, que ele tem uma surpresa:
encontra o pai o esperando do lado de fora do cinema, e ele trabalha como o
homem que passa os filmes ali. A cena é de ARREPIAR, e um primor de
interpretação e trilha sonora. Johnny Massaro não precisa dizer nada para nos
comover. Está tudo na maneira como ele olha para o pai, como seus olhos se
enchem de lágrimas, e justamente como ele não
consegue dizer nada. Porque o pai estava ali o tempo todo, na cidade
vizinha, com um filho pequeno para criar. Uma
nova família? Tony retorna uma outra vez, mais tarde, para conversar com o pai, entender o que
aconteceu, e conhecer de fato o irmãozinho, Jean… as cenas são muito bonitas,
especialmente porque sabemos que a relação dos dois sempre foi muito bonita.
Fiquei um tanto quanto surpreso com todo o
desenvolvimento. Primeiro em descobrir que o Paco era uma pessoa desprezível.
Eu estava gostando tanto dele, do seu jeitão bronco, da maneira como ele e Tony
se relacionavam… mas foi de partir o coração descobrir que ele nunca entregou
um presente de Nicolas Terranova ao filho, nem nenhuma das cartas que escreveu…
também mentiu para ele que a mãe de Tony estava saindo com outro homem. Ainda
mais chocante, talvez, foi quando Tony perguntou: “Quem é a mãe do Jean?”, e o pai respondeu: “A Petra”. Petra Madeira, interpretada por Bia Arantes, é a irmã
mais velha de Luna, e eu confesso que é um tremendo choque descobrir isso, mas
ele até que lida muito bem com a situação… é principalmente aí que o filme
ficou incrivelmente melancólico, mas não exatamente triste.
Porque o final é bonito, poético, emocionante.
Tony vai à festa de 15 anos de Augusto, diz a
Petra que sabe que ela é a mãe do Jean, mas que esse vai ser o segredo deles, e
entrega ingressos para a sua mãe, e tudo o que ele disse foi lindíssimo.
Novamente aquela narração de Johnny Massaro, aquela voz calma, envolvente,
triste. Falando sobre a história do “filme”, de um estrangeiro que chega a uma
cidade pequena, conhece uma mulher linda e tem um filho com ela. Então
engravida outra mulher, e por vergonha e para não envergonhá-la, vai embora,
mas na verdade está morando na cidade vizinha. Isso tudo ele diz à mãe, e eu
fui ficando cada vez mais arrepiado. “O
fim? O fim eu não posso contar”, porque nós não sabemos qual é o fim, e o
fim não importa. Importa que Sofia está em um trem para a Fronteira, para
encontrar o marido que não vê há dois anos, enquanto Tony, na moto que
pertencera ao pai e agora era dele, observa de longe com Luna na garupa. O
visual era lindíssimo.
E foi só os créditos começarem que eu desatei a
chorar.
E chorei muito. Filme lindíssimo, emocionante,
para guardar no coração!
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