Z: A Cidade Perdida (The Lost City of Z, 2016)
“We all
made of the same clay”
Não achei que
“Z: A Cidade Perdida” me deixaria tão pensativo quanto me deixou. Assisti
ao filme à noite, e fui dormir cheio de questionamentos e algumas angústias, e
passei a manhã seguinte toda conversando sobre o filme com a minha mãe – isso
que ela acabou nem o assistindo comigo. O filme é um drama biográfico que
relata as crenças de Percy Fawcett em uma cidade perdida na Amazônia, que ele
chama de “Z” e que busca, até a sua morte em 1925, encontrar e provar a
existência… o filme é um pouco longo, e ele não é recheado de ação a todo o
momento, se dividindo entre as explorações na Amazônia, as discussões de
Fawcett na Real Sociedade Geográfica e um pedaço de sua vida em que ele precisa
lutar na Primeira Guerra Mundial, mas o visual é meticuloso e envolvente, quase
como se vivêssemos aquilo tudo ao
lado de Fawcett.
E ansiamos
por sua descoberta como se fôssemos ele.
A primeira
coisa que me chama atenção no filme, que faz com que eu ainda continue pensando sobre ele e sobre Percy Fawcett, é essa
incerteza, o fato de não sabermos a
respeito de tanta coisa que é parte de
nossa história – nós falamos muito sobre os mistérios do universo, sobre os
mistérios do oceano, mas quando nos projetamos ao passado, costumamos jogar a
mente para tempos tão remotos para quando os
humanos ainda nem existiam, por exemplo, mas existe TANTO que desconhecemos
sobre a nossa história. A história conhecida e registrada é bastante recente, se comparada ao tempo em que estamos na Terra, e eu adoro explorar
antigas cidades sobre as quais pouco sabemos… coisas que talvez jamais venhamos
a entender de fato, e isso me intriga, ao mesmo tempo em que me incomoda – é uma sensação bastante curiosa.
E o filme me
fez pensar em coisas que estão tão próximas
e, de modo geral, ignoradas. Além de
ser recente, o registro da história é
falho, por a quem dá voz, quem
escolhe ouvir. A história sempre foi
contada pelo colonizador, nunca por quem foi explorado. Um trecho
interessantíssimo do filme mostra Fawcett ressaltando a precisão matemática das plantações de uma tribo indígena, e
exaltando o fato de eles terem cultivado
essa floresta há anos, mas o colonizador o vê como “selvagem”, não lhe dá
atenção, não vê o que ele tem a mostrar, e
não lhe dá voz. Pouco se ouviu ou se escreveu sobre os nativos dessas
terras, por exemplo… se, há tantos anos, eles tivessem sido ouvidos, quanto poderíamos ter conhecido, ter visto, ter entendido
a respeito de como era a vida aqui há
muito mais tempo. São coisas que escolheu-se
perder.
E quando se
vai atrás, às vezes pode ser tarde.
Nós não
sabemos até que ponto Fawcett estava correto, ele nunca conseguiu provar o que dizia, e acredita-se que
ele foi influenciado por algo que ouviu de índios (o filme tem uma cena que
mostra isso) e um documento descoberto, de 1753, que falava sobre “as ruínas de
uma cidade antiga, com arcos, estátuas e hieróglifos), e então ele passou a
vida buscando, encontrando evidências de que realmente existira uma civilização em lugares que nunca antes
tinham sido explorados. As crenças, explorações e descobertas de Fawcett
geraram um livro, escrito pelo jornalista David Grann, publicado em 2009, e é
esse o filme que dá origem ao filme sobre “A
Cidade Perdida de Z”. Muita gente acredita, atualmente, que a cidade que
Fawcett buscava e chamou de “Z” pode ser Kuhikugu, que foi descoberta depois da morte de Fawcett, presumidamente
em 1925, época de sua última exploração, quando ele foi acompanhado de seu
filho, Jack Fawcett. E agora eu estou
fascinado por essas histórias!
O filme é
interessantíssimo e explora a Amazônia e tribos indígenas que Fawcett e seus
companheiros descobrem ao longo do tempo. Sua primeira expedição para a região
foi em 1906, e ele foi enviado para ajudar no mapeamento da divisa entre Brasil
e Bolívia, mas quando ele ouviu sobre a
tal cidade revestida em ouro, isso se tornou uma obsessão… durante anos ele
buscou o apoio e financiamento de pessoas e organizações para continuar a sua
exploração, para tentar chegar até a Cidade de Z, e o filme me deixou profundamente triste em momentos como
quando a viagem deles é sabotada por um dos biólogos que os acompanharam – era
a jornada de uma vida! Também quando Fawcett precisou se desligar disso tudo e
lutar durante a Primeira Guerra Mundial e, como resultado da guerra, ele fica
temporariamente cego e acha que nunca
mais poderá voltar à Amazônia.
Também temos
a história de Percy Fawcett com seu filho, Jack. Em uma cena importante do
filme, Jack discute com o pai, sobre como ele
nunca está presente, e como já está
pensando em ir embora novamente, e aquilo é de partir o coração, mas gera
aquele momento emocionante depois da
Guerra, quando Percy, cego, pergunta do filho, e Jack abraça o pai, chorando.
Anos depois, Jack incentiva o pai a retornar para a Amazônia, dizendo que pretende ir junto com ele, porque “isso é tudo o que ele sempre quis”.
Assim, Fawcett organiza a sua última expedição, que devia durar 3 anos, dessa
vez determinado a encontrar a Cidade Perdida de Z, mas, no filme, vemos Percy e
Jack serem capturados por uma tribo indígena… não sabemos se eles foram mortos
ou se eles foram incorporados à tribo… Nina,
a esposa de Percy, acredita que eles estão vivos.
E ela tem motivos para acreditar nisso…
afinal de contas, ela recebeu a informação de um brasileiro, que Jack e Percy
estariam vivendo numa tribo indígena, e ela recebeu a bússola que Percy
prometera enviar de volta caso
encontrasse a Cidade Perdida. Não sei o que foi de Percy Fawcett… se ele
foi morto por índios ou se ele encontrou o que sempre buscou. Segundo a
narração final do filme, Nina esperou o seu retorno até 1954, o ano de sua
morte, e as crenças de Fawcett foram ridicularizadas durante 100 anos, mas então antigas estradas foram descobertas
na Amazônia, estradas que levariam para onde ele dizia ser a Cidade Perdida de
Z… então, talvez ele tivesse razão o tempo todo. E, lamentavelmente, esse é
o infeliz caminho sempre, não? Galileu Galilei não foi condenado à morte pela Inquisição por defender o heliocentrismo?
Uma crítica
interessante, um filme interessante…
Um filme que
me deixou muito, muito, muito pensativo…
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