Sandman, Volume 2 – Casa de Bonecas (Partes 6 e 7)

Sandman vs o Vórtice

WOW, QUE FINAL DE TIRAR O FÔLEGO PARA ESSE ARCO. “Casa de Bonecas” chega ao fim de forma eletrizante e, como sempre, emotiva e poética – é bem diferente de “Prelúdios & Noturnos”, mas eu amei como Neil Gaiman criou a atmosfera e fez com que nos preocupássemos com Rose Walker e com sua família antes de explicar-nos o que, de fato, era um “vórtice do sonho”. E o motivo de Sonho estar sempre a vigiando de perto. Gostei muito de como alguns caminhos se cruzam, mesmo que de maneira discreta, como o fato de Rose ser a neta de Unity Kinkaid, que conhecemos no primeiro arco, ou como a melhor amiga de Rose, Judy, morreu em um massacre em uma lanchonete de cidade pequena, durante aquele pavoroso e sangrento conto de horror que fez parte de “Prelúdios & Noturnos”, enquanto Sandman não recuperava seu rubi…

Wow.

As duas últimas edições de “Casa de Bonecas” nos mostram a verdadeira e perigosa natureza de Rose Walker, e eu adoro todo esse universo de SONHO que é construído, porque “Sandman” tem uma mitologia ampla e inteligente, com muita coisa ainda a ser explorada, e o tema do sonho sempre me fascinou… em “Noite Adentro”, a sexta edição do arco, Rose Walker se preocupa com a avó morrendo na Inglaterra e o irmão morrendo no hospital (“Nas últimas três semanas, encontrei uma avó desconhecida e um irmão perdido há muito tempo. Agora parece que posso perder os dois”), enquanto Sonho percebe que terá que enfrentar um vórtice novamente (“Então, tudo começa mais uma vez. O primeiro vórtice desta era […] Devo lidar com este vórtice, como já fiz com outros no passado. Como devo lidar com qualquer coisa que ameace o Sonhar”).

E embora se fale sobre o VÓRTICE desde o começo de “Casa de Bonecas”, não sabíamos, até então, o que realmente era um vórtice do sonho, mas essa edição nos mostra a imensidade do perigoso poder que Rose tem e que nunca soube… acompanhamos os bizarros sonhos das pessoas que dividem a casa com ela… os sonhos de Ken, de Bárbara, de Chantal, de Zelda e de Hal… Rose Walker é a última a dormir, por causa de todas as preocupações que tem na cabeça, mas eventualmente ela consegue dormir e, ao sonhar, ela sente-se maior do que ela mesma… ela consegue ver, sentir e tocar cada um dos sonhos ao seu redor. Os sonhos de Ken, Bárbara, Chantal, Zelda e Hal, em um primeiro momento. E enquanto ela os via e os misturava, derrubando as paredes que os separavam, percebemos o quanto ela era poderosa e, principalmente, perigosa.

Por que o Sonho estava atrás dela, afinal…

 

“Todos procurando um lugar ao qual pertencer, todos buscando um canto para se sentir seguros. E ela vê como é tudo tão simples. Vê como são finas e frágeis as paredes que os separam. Vê como seria simples esmigalhá-las. Ela estende sua mente e dá um pequeno cutucão. E as paredes… as paredes vêm abaixo”

 

“Ela pode senti-los: por toda a cidade, um desfile de mentes adormecidas. Cada uma cria e habita seu próprio mundo; e cada mundo é apenas uma pequena fração da realidade que é o Sonhar… e ela pode tocá-los, pode tocar a todos. Começa, então, a libertá-los, perdendo-os no fluxo. Por toda a cidade, os sonhos começam a se unir e se integrar e, ao fazer isso, mudam os sonhadores para sempre”

 

Eu achei simplesmente FASCINANTE. Eu entendo o porquê de o Sonho se assustar e saber que precisa detê-la, mas a noção é incrível… eu acho que o sonho é uma das coisas mais misteriosas da mente humana, e Neil Gaiman se aproveita disso para criar uma história envolvente e intrigante que nos deixa pensando a respeito de nossos próprios sonhos… acho que, depois de ler “Sandman”, os nossos sonhos jamais serão os mesmos. Porque cada vez que sonharmos com algo “estranho”, nos perguntaremos se isso é parte de algo maior… se há algo a mais acontecendo, algo que não sabemos. Rose derruba as paredes entre os sonhos dos sonhadores de maneira inocente – ela está curiosa, descobrindo isso tudo, não tem noção do que está fazendo. E eu acho que esse é o principal perigo do vórtice: não saber que é tão perigoso.

E ela pensa em transformar tudo em um único e grande sonho.

Enquanto Unity está cada vez mais perto da morte na Inglaterra, e pede que Miranda dê a Rose a sua casa de bonecas, Sonho captura Rose nos sonhos que, agora, ela reuniu, porque ele precisa acabar com isso e precisa ser agora. Enquanto isso, Gilbert, que descobriremos ser “Verde do Violinista”, um dos sonhos que escaparam do Sonhar na ausência de Sandman, conversa com Matthew, o corvo de Sandman, no hospital, ao lado de Jed, assustado ao descobrir que Rose Walker é um vórtice… porque, se Rose é um vórtice, não há esperanças para ela: Sonho vai matá-la, e ele precisa fazê-lo. Como o Verde do Violinista explica, essa é a única ocasião em que o Sonho tem permissão para tirar uma vida humana – ele pode fazê-lo para proteger o Sonhar.

Por isso, ele terá que matá-la…

Antes que seja tarde demais. “Corações Perdidos”, a última edição do arco, começa com o Sonho anunciando a Rose Walker que ela é um vórtice, e finalmente explicando com todas as palavras o que é um vórtice, por que é tão perigoso e, consequentemente, por que precisa ser detido:

 

“Um vórtice surge uma vez a cada era. Nem mesmo eu sei por quê… um mortal que se torna brevemente… o centro… do Sonhar. O vórtice, por natureza, destrói as barreiras entre as mentes que sonham; destrói o caos ordenado do Sonhar… até que a miríade de sonhadores seja colhida num único e enorme sonho, até que todos os sonhos sejam um só. Então, o vórtice entra num colapso sobre si mesmo. E, por fim, acaba. Leva a mente dos sonhadores consigo e danifica o Sonhar de modo que não possa ser reparada. Deixa nada além de trevas”

 

Se Rose vive, se ela transforma tudo em um único sonho, sua mente colapsará e ela levará consigo todos os sonhadores que compartilham o Sonhar – e, assim, o universo morrerá, algo que já aconteceu uma vez, há milênios, e que Sonho jurou que jamais deixaria acontecer novamente. Por isso, Verde do Violinista, embora queira, sabe que não pode fazer nada para salvá-la. Então, ele se despede de sua nova amiga em uma cena emocionante antes de voltar a ser o que era antes de sua fuga do Sonhar: um lugar… um lugar lindíssimo. A despedida de Rose também é bonita, e dolorosa, e não conseguimos culpar o Sonho – essa é sua obrigação, e ele precisa proteger o Sonhar e, consequentemente, o mundo. Antes que ele possa tirar a vida de Rose Walker, no entanto, o Sonhar recebe uma visitante inusitada: Unity Kinkaid, a segundos de sua morte.

Unity aparece no Sonhar jovem, para salvar a neta, e explica:

 

“Rose não vai morrer esta noite. Eu vou. […] Eu deveria ter sido o vórtice. Se você não tivesse sido aprisionado longe do Sonhar, eu teria sido”

 

O que faz perfeito sentido, na verdade, porque Unity Kinkaid, como a primeiríssima edição de “Sandman” nos mostrou, sonhava com a figura misteriosa que era o Sonho quando era criança, antes de ele ser sequestrado e ela sucumbir à Doença do Sono. Ela deveria ter sido o vórtice, há muitos anos, e não sua neta. A noção é interessante e inteligente, e então Unity pede que Rose entregue seu “coração”, aquilo que a torna o vórtice, e então Unity Kinkaid assume a função que deveria ter assumido há anos, vira o vórtice e morre, como já ia acontecer de qualquer maneira, salvando a vida da neta… um último sacrifício por sua família. É tocante! Sonho fica confuso, mas o vórtice se foi, o que quer dizer que Rose não precisa morrer, e então ele pode liberá-la, e ainda anuncia que, na manhã seguinte, Jed acordará – como um presente dele.

Então, Rose desperta

O final é interessantíssimo, todo místico, sentimental e um pouco melancólico. Acompanhamos Rose Walker seis meses depois disso tudo, morando em uma casa imensa com a mãe e com o irmão, mas sem sair do quarto para praticamente nada. Ela se lembra de um sonho estranho da noite em que Unity morreu e Jed despertou, mas agora ela já não sabe se aquilo foi mesmo um sonho ou se aconteceu de verdade… os detalhes estão nublados, e ela sente que nada do que ela sempre acreditou é verdade se aquele sonho foi real… sua mente ainda está tentando achar sentido em tudo, está se organizando em volta dos acontecimentos bizarros, e eu achei legal como, seis meses depois, ela resolveu seguir a sua vida normal, deixar isso para trás, sair do quarto e seguir adiante… uma edição bastante singela, bastante tocante, eu gostei muito!

“Casa de Bonecas” foi um excelente arco!

 

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