“We
underdogs have to look out for each other, right?”
Mais uma
animação em que a Pixar acerta em cheio… alguns dos meus filmes favoritos no
mundo vieram da Pixar, e quando eu digo “filmes favoritos”, não me refiro
apenas a animações.
“Luca” tem tudo o
que aprendemos a esperar do estúdio: uma animação colorida e vibrante, uma
história criativa, uma mensagem bonita. Eu adoro como as animações do estúdio
conseguem tratar temas sérios sempre com uma leveza e uma sensibilidade sem
iguais…
“Luca”, o mais novo filme do
estúdio, fala sobre
ser diferente,
mas ser você mesmo, sobre encontrar um lugar ao qual você pertence e sobre as
pessoas que você quer ter ao seu redor, o que me parece uma alegoria a
infinitas possibilidades e, consequentemente, o filme me parece muito
pessoal. É um filme lindíssimo e
encantador que certamente vai te deixar com um sorriso no rosto e,
possivelmente, lágrimas nos olhos.
Adoro todo o
conceito escolhido para o filme… Luca é uma criatura do mar, um ser que os
humanos da vila próxima gostam de chamar de “monstro marinho”, e o filme
introduz com inteligência o conceito da
aversão
ao que é diferente, para poder desconstruí-lo ao longo do filme – os
humanos odeiam os “monstros marinhos” e querem caçá-los pelo simples fato de
eles serem diferentes, enquanto as
criaturas do mar parecem temer os “monstros da superfície”, depois de anos de
opressão. São duas visões que uma simples
vivência
pode mudar facilmente – e é exatamente o que
“Luca” se propõe a fazer, quando o personagem-título começa a se
interessar pelo mundo na superfície, movido pela curiosidade, ainda maior pelo
fato de
a sua família sempre se recusar a
falar sobre o que existe fora do mar… até que Luca tem a oportunidade de
conhecer um pouco desse mundo.
Tudo
acontece quando Luca se aventura a explorar algumas coisas do
outro mundo que foram derrubadas por
barcos, e então ele conhece uma outra criatura marinha, Alberto, um garoto que
parece bem acostumado a viver fora da água
– Luca está apavorado com a possibilidade de desobedecer aos pais e ir para a
superfície, mas a curiosidade é muito maior do que qualquer coisa, então ele o
faz. Quando na superfície, Luca e Alberto assumem formas humanas, disfarces que
podem rapidamente ser destruídos se eles se molharem, mas que parecem bem
seguros
contanto que eles estejam secos…
o conceito é interessante, e o cenário na superfície também é algo que nos
fascina! Estamos em uma pequena vila na Itália, Portorosso, em algum momento do
passado (tipo anos 1950, talvez), uma época em que as encantadoras Vespas
estavam em alta.
Particularmente,
uma das minhas partes favoritas do filme é justamente a amizade de Luca e
Alberto – tudo ali é tão intenso, e tudo é tão novo para Luca… Alberto está lhe
apresentando um novo mundo, e o está convidando para vivê-lo ao seu lado. Eu
adoro aquelas sequências dos dois tentando construir uma Vespa, por exemplo, ou
quando eles adormecem lado a lado e Luca sonha que está voando em uma Vespa com
Alberto, pelo céu cheio de peixes…
é uma
sequência tão singela, tão cheia de significado, tão bonita! Alberto sonha
em ter uma Vespa na qual ele possa
conhecer
todo o mundo e ir a um lugar diferente todo dia, e ele compartilha esse
sonho com Luca, e a parceria, amizade ou o que quer que seja que nasce entre
eles é uma das forças desse filme… no fim, um acaba mudando a vida do outro, e
fazendo com que eles saiam de suas bolhas, de seus esconderijos…
Quando os
pais de Luca descobrem que ele esteve na superfície e querem mandá-lo morar nas
profundezas do oceano com um tio, Luca foge, e ele e Alberto deixam a pequena
ilha de sonhos que era só deles para se aventurar pela
vila dos humanos – um lugar perigoso, tendo em vista que,
aparentemente, é uma vila obcecada com a ideia de
caçar monstros marinhos. Mas eles precisam ficar ali, onde eles
acreditam que os pais de Luca não o procurarão…
acontece, no entanto, que eles acabam procurando sim, e eu devo
dizer que eu me diverti bastante com as cenas dos pais de Luca, “transformados”
em humanos, procurando por Luca no vilarejo – uma série de cenas bizarras, como
aquela da mãe jogando a bola para derrubar as crianças na fonte, e tudo feito
com muito bom-humor, enquanto Luca e Alberto vão fazendo amizades e traçando
planos.
Os garotos
conhecem Giulia, uma garotinha “excluída” (reforçando a temática do
“diferente”) que quer ganhar uma corrida que envolve natação, bicicleta e
comer massas, e logo eles a convencem a
deixar que eles participem também: afinal de contas, com o dinheiro do prêmio
eles podem comprar uma Vespa e então realizar o sonho de conhecer o mundo! O
filme é divertido, traz ótimos momentos para Luca e Alberto, traz ótimos
momentos com o pai de Giulia, que apesar de ser um “caçador de monstros
marinhos” é um homem muito bom, e a mente inquieta, ansiosa e curiosa de Luca, que
parece sempre querer saber mais… quando Giulia começa a falar sobre a escola,
sobre as estrelas, planetas, galáxias e sobre tudo o que Luca não sabe, mas
quer descobrir, o garoto
quer mais, o
que acaba gerando um incômodo/ciúme em Alberto.
Talvez ele não esteja preparado para
conhecer um Luca que não precisa dele… mas a verdade é que Luca sempre
precisará. Sem saber disso, eu fiquei de coração partido quando Alberto
tentou mostrar para Luca que ele não podia ir para a escola, que ele não podia
viver ali para sempre porque não iam aceitá-lo como ele é (!), então ele se
joga na água, revelando-se um “monstro marinho”. Eu estava apavorado com as
pessoas, em especial Ercole, caçando Alberto, jogando arpões nele, mas a
verdade é que
eu já sabia que aquilo aconteceria…
eu não estava preparado, no entanto, para o Luca apontando para ele e gritando:
“Monstro marinho!”, para tentar
passar despercebido. A dor dessa cena é tão palpável e pode ser lida de tantas
maneiras diferentes, e eu acho que por isso o filme tem tanto poder:
acho que ele conversa com diferentes pessoas
de diferentes formas.
Eventualmente,
Giulia descobre que Luca também é um monstro marinho, mas não o rejeita por
isso, mas fala sobre como é perigoso, para ele, estar ali, como eles escolheram
a pior cidade possível para se
esconder… naquele momento, no entanto, Luca está preocupado com Alberto, e a
cena em que ele volta à ilha onde ele e Alberto viveram tantas coisas é
lindíssima, e profundamente triste, com Luca descobrindo que Alberto foi
abandonado pelo pai – mas Luca não vai fazer o mesmo. Ele volta para a cidade e
decide competir
sozinho, porque ele
pode ganhar a Vespa para ele e para Alberto, e então tudo estará resolvido… a
sequência toda da competição é desesperadora, porque ficamos o tempo todo com
medo de Luca ser descoberto, como naquela prova embaixo d’água, por exemplo…
o problema, no entanto, está na parte do
ciclismo…
…quando começa a chover.
O clímax do
filme é a emocionante corrida de bicicleta! Luca está se saindo muito bem, mas
a chuva que começa a cair
pode arruinar
tudo, e temos vários momentos memoráveis nessa cena. A primeira delas é,
provavelmente, quando Luca se esconde da chuva e Alberto aparece com um
guarda-chuva, dizendo que está indo até ele, e por um segundo achamos que tudo
vai ficar bem, que ele vai subir na garupa com o guarda-chuva e os dois vão
vencer a corrida, mas Ercole o derruba, e quando a água o atinge,
ele se torna a criatura roxa do mar…
daquela vez, felizmente, Luca não o nega, e corajosamente sai em defesa do
amigo, o resgatando na bicicleta antes de ele ser atacado, revelando também sua
forma de “monstro” marinho. E quando Ercole os persegue com um arpão na mão,
Giulia vem em defesa dos amigos…
uma
demonstração linda de amizade, de todas as partes.
E é isso o
que, no fim, mostra para todos aqueles humanos preconceituosos que Luca e
Alberto são apenas dois garotos de bom coração, não importa quais sejam suas
diferenças… é lindo o momento quando os dois largam tudo para ajudar Giulia,
que foi derrubada por Ercole, e o pai de Giulia, Massimo, que sempre foi
um “caçador de monstros marinhos”, parte
em defesa deles e ainda os anuncia vencedores: afinal de contas, eles são
apenas Luca e Alberto, os dois garotos que são amigos de sua filha e que ele
conheceu durante aquela semana… que eles tenham “outra forma” não os faz
pessoas diferentes daquelas que ele já conhecia. É, talvez, um pouco utópico,
mas lindo e reconfortante, e eu adorei ver Luca realizando seu sonho de ir pra
escola (graças a Alberto, que vende a Vespa para poder dar isso ao amigo, a
cena em que ele entrega as passagens me emocionou… bem como o Luca perguntando
se ele não vai também), apoiado pelos pais, e ver Alberto
ganhar uma nova família, ficando para morar com Massimo e ajudá-lo.
A última
cena de Luca e Alberto? COISA MAIS LINDA DESSE MUNDO! (E, nos créditos, Luca
escrevendo cartas para o Alberto… QUE COISA MAIS FOFA!)
Assistindo
ao filme, não consigo não pensar na realidade da comunidade LGBTQIA+ e em como
muitas vezes somos tratados como diferentes, como algo a ser “enfrentado”,
quando na verdade
as pessoas se escondem
atrás de preconceitos para nem se dar ao trabalho de nos conhecer… aquela
fala da família de Luca para ele perto do fim do filme sobre como “haverá
pessoas que não o aceitarão, mas também haverá muitas pessoas que sim, e ele
parece saber encontrar
as pessoas boas”
me tocou profundamente. Além disso, é impossível não perceber que Luca e
Alberto
são apaixonados um pelo outro,
de um jeito puro e inocente característico de produções infantis que falam sobre
o “primeiro amor” (a despedida na estação, o Alberto correndo para acompanhar o
trem e as cartas de Luca são elementos
típicos
de um filme de romance!), e eu fico muito feliz por essas histórias estarem
sendo contadas.
Com toda sua
beleza, diversão e sensibilidade, “Luca”
é mais um belíssimo filme da Pixar. Lindíssimo!
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