Philip K. Dick’s Electric Dreams – Kill All Others

Perturbadoramente real.

Acho desesperador assistir a episódios como esse – porque, infelizmente, nós vemos tanto da realidade que estamos vivendo atualmente que é assustador e angustiante. “Kill All Others”, que tanto na televisão quanto na Prime Video encerra “Philip K. Dick’s Electric Dreams”, é um episódio inteligente e com uma crítica política astuta e extremamente atual, e começa a partir de um discurso feita pela “Candidata” em rede internacional, quando ela fala algo a respeito de “matar todos os Outros”… mas ninguém parece dar atenção ao que ela disse, a não ser Philbert Noyce. A história é baseada no conto “O Enforcado Desconhecido”, que foi escrito por Philip K. Dick e publicado pela primeira vez em 1953, e é outro excelente episódio de “Electric Dreams” e, agora posso dizer: a série é muito boa! Tem seus altos e baixos, mas entregou vários episódios excelentes e com reflexões interessantes.

A ideia de “Kill All Others” tem a ver com o discurso de ódio aparentemente “naturalizado” em um sistema no qual México, Estados Unidos e Canadá se uniram em uma única grande nação, no qual se vende a ideia utópica de perfeição e democracia, mesmo que eles só tenham um único partido político e um único candidato. A noção absurda disso parece passar despercebida, no entanto, pela maioria das pessoas, e Philbert, portanto, já é “diferente” dos demais por ser um dos poucos que questiona esse sistema. As coisas se agravam demais quando Philbert escuta, durante o discurso da Candidata, ela falar “Matem todos os Outros”, e é algo sobre o que ninguém está comentando – ninguém parece nem mesmo ter ouvido! Cheios de distração e conformismo, todos os cidadãos parecem querer continuar vivendo a vida de fantasia, enquanto atrocidades acontecem.

É brutal – e é assustadoramente real. Toda a ideia de uma política absurda que é vendida como algo sem defeitos; o discurso de ódio transformado em algo “normal” ao qual ninguém mais dá atenção; um bando de minions ridículos que defendem qualquer coisa que a Candidata disser ou fizer, por mais absurdo que seja. Enquanto tenta entender o que está acontecendo e quem são os tais “Outros”, Philbert vai aos poucos se transformando ele mesmo em um Outro, sem perceber, porque os “Outros” são todos aqueles que conseguem pensar além de toda a manipulação e distração ao seu redor, todos aqueles que ousam ter pensamentos próprios que não são ditados pela Candidata ou por todo o sistema, todos aqueles que se permitem levantar questionamentos… todos aqueles que são tratados como “arruaceiros” ou, pior, “terroristas” por pensar.

A perversão do episódio está na maneira como tudo é facilmente distorcido. Philbert é um cara inocente, na verdade, e sabemos porque o acompanhamos… tudo o que ele fez foi fazer algumas perguntas, foi se horrorizar com o que feria direitos humanos, como aqueles outdoors espalhados pelo país, com letras garrafais que diziam “KILL ALL OTHERS”, inclusive com um corpo pendurado na frente dele… e ninguém dá atenção a essa incitação à violência, a esse discurso de ódio claro e nojento. Enquanto a angústia cresce dentro de Philbert Noyce e ele busca fazer com que as pessoas enxerguem o que é óbvio e está bem ao lado dele, suas ações são demonizadas e ele é transformado, pelo sistema e pela Candidata, no “vilão” – no “Outro” que causa problema e que precisa ser exterminado, enquanto se mantém um discurso enfeitado, fantasioso e mentiroso.

O final é desolador – mas o único possível para “Kill All Others”. Sabíamos que Philbert não tinha poder suficiente para lutar contra aquela opressão institucionalizada, e que se compraria facilmente a ideia de que ele precisava ser exterminado. O suspense construído no episódio nos encaminha a um clímax que não é revelador, não é catártico, mas nos faz chacoalhar a cabeça com nervosismo, porque entendemos o que eles querem dizer. Perverso e cruel, ainda vemos as pessoas trocarem o canal depois de toda aquela “confusão” protagonizada pelo Sr. Noyce em frente a um outdoor de “KILL ALL OTHERS”, e continuar a sua vida como se nada tivesse acontecido, porque é isso o que acontece na maioria das vezes… é mais fácil continuar alienado, fechando os olhos para o que está acontecendo do que tentar mudar as coisas e levar o mesmo fim de Philbert.

Episódio cruel e angustiante, mas brilhante. Uma crítica forte e atual!

 

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Comentários

  1. Acabei de ver e gostei da resenha, só achei um pouco óbvio, mas acho que era a intenção desde o início

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