Sandman, Volume 3 – Calíope / Um Sonho de Mil Gatos
“Os sonhos moldam o mundo”
Eu adoro
grandes e ambiciosos arcos narrativos, que foi como Neil Gaiman iniciou “Sandman”, seja com o aprisionamento,
fuga e vingança do Senhor dos Sonhos no excelente “Prelúdios & Noturnos”, ou no ainda mais ambiciosos, bonito e
imaginativo “Casa de Bonecas”, mas
eu também adoro histórias independentes, e enquanto lia o terceiro volume de “Sandman”, “Terra dos Sonhos”, pensava em como talvez eu estivesse lendo o
melhor que “Sandman” tinha me
oferecido até o momento… o terceiro volume da grande obra de Neil Gaiman traz
quatro histórias independentes, uma coletânea que utiliza os personagens e o
universo de “Sandman” em histórias
fechadas nelas mesmas – uma trama de 20 e poucas páginas com começo, meio, fim
e toda a poesia, beleza, dor e horror que “Sandman”
tem para nos oferecer. Esse misto de emoções!
Esse volume
começa com “Calíope”, a perversa
história de um escritor sem ideias que aprisionou impiedosamente uma musa. Richard
Madoc é um escritor que escreveu um primeiro romance de certo sucesso, mas que
está meses atrasado em seu segundo
romance e não sabe nem mesmo por onde começar… de uma forma sombria, então, ele
vai atrás de Erasmus Fry, um outro escritor que publicou vários livros de muito
sucesso, porque ele pode lhe oferecer a “solução” para seu problema de
inspiração: então, por um bezoar, Erasmus Fry vende a Richard Madoc Calíope, a mais jovem das nove musas, que
fora musa de Homero, para que ele possa voltar a escrever… Richard Madoc é um
cara nojento, e ele estupra Calíope
em sua primeira noite com ela, antes de começar a escrever o seu próximo
romance, cheio das mais variadas ideias.
Ao longo de
anos, Richard Madoc vai se tornando um verdadeiro sucesso, publicando romances,
poemas, uma peça de teatro, escrevendo roteiros de filmes e dirigindo-os… é
interessante notar que a história começa em 1986, época em que o Senhor dos
Sonhos ainda estava aprisionado lá no início dessa jornada toda, mas quando ele
finalmente se liberta, ele vem ao auxílio de Calíope, mulher com quem ele teve
uma história no passado, que a edição trata misteriosamente – de qualquer
maneira, ele está ali por ela naquele momento, e eu adoro a conclusão da
história, de como Sandman se vinga de
Richard Madoc o atormentando com ideias sem fim que ele não consegue controlar
e/ou organizar, até que, assustado, ele finalmente liberte Calíope… por mim,
Richard Madoc continuaria daquele jeito para sempre (tipo o cara que vive um
eterno despertar), mas Calíope
intercede por ele, e Sandman o liberta desse tormento, fazendo-o esquecer-se de
tudo.
O que é
pior? Um autor com ideias demais que não pode escrever ou sem ideia alguma?
Adoro a
ironia sombria de “Sandman”.
Depois,
entramos no reflexivo e, de alguma maneira melancólica, divertido “Um Sonho de Mil Gatos”, uma edição
diferente de tudo o que vimos em “Sandman”,
porque é protagonizada por uma gata, e institui a ideia de que “os sonhos
moldam o mundo”. Aqui, conhecemos uma gata que vaga pelo mundo falando com
gatos de todos os lugares, tentando “revelar a verdade” para eles, e eu achei
tudo criativo e fascinante… não é à toa que Neil Gaiman é elogiado pelos
roteiros incríveis de “Sandman” e por
toda essa vibe muito bem construída
do Sonhar. Essa gata costumava viver
tranquilamente com humanos que a alimentavam e a acariciavam, e gostava da vida
que levava… até que ela encontrou o prazer, deu à luz a vários filhotinhos, que
foram brutalmente retirados dela. Ali ela
percebeu a verdade aterradora: que ela não estava no controle de nada.
Depois
disso, ela caminhou pelo mundo em busca do Gato dos Sonhos, que é uma
manifestação de Sandman em forma de gato (AH, EU ADOREI!), que lhe mostra um
mundo, em outro tempo, no qual os gatos eram gigantes, reis e rainhas do mundo,
e os humanos eram apenas pequenas criaturas que os gatos caçavam… até que um
humano começou a falar sobre “sonhar um mundo diferente”, no qual os humanos
eram a criatura dominante. E, quando ele convenceu pessoas o suficiente a
sonharem com ele, o mundo mudou – e
mudou desde sempre e para sempre. Se tornou o mundo que conhecemos, com o sonho
de mil humanos. A missão dessa gata, agora, é fazer com que mil gatos acreditem
e sonhem com ela, para que o mundo mude novamente. A ideia da edição é
incrível, e brilhantemente bem conduzida… como
um delicioso e desconfortante sonho.
“Sandman” é um passeio guiado pela Terra
dos Sonhos. Em toda sua beleza e horror.
E eu adoro isso.
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