Vale o Piloto? – Severance (Ruptura) 1x01 – Good News About Hell

Vida pessoal / Vida profissional

QUE ESTREIA INTRIGANTE. Chegando com um pouquinho de atraso, estou finalmente começando uma das séries mais bem avaliadas de 2022, e eu adorei o primeiro episódio do início ao fim. Com um toque de ficção científica, mistério, tecnologia e questionamentos a respeito de avanços científicos e ética, “Severance” (“Ruptura”, em português) tem um estilo que foi associado a “Black Mirror” em anos mais recentes, mas sua premissa é a cara de grandes contos e romances de ficção científica que fizeram muito sucesso no século passado – consigo imaginar um conto de Philip K. Dick lá na década de 1950 propondo algo similar ao que nos foi apresentado em “Good News About Hell”, por exemplo. Talvez até um episódio de “The Twilight Zone”, quem sabe?

A premissa básica de “Severance” é: e se você pudesse separar, literalmente, a sua vida pessoal da sua vida profissional? Se houvesse uma maneira de dividir suas memórias de uma maneira que, quando está no trabalho, você só tenha memórias do trabalho e não saiba nada sobre a sua vida do lado de fora, e fora do trabalho, você não se lembre de nada do que acontece no escritório, nem mesmo do que você faz lá… quase tentador, mas, em primeiro lugar, assustador, algumas pessoas, por motivos distintos, acabam aceitando essa proposta de trabalho, e “Severance” levanta questões a partir de então: que tipo de trabalho precisa de tamanho sigilo, e quais são as implicações desse procedimento na vida de uma pessoa a longo prazo, por exemplo?

O primeiro episódio apresenta dois pontos de vista do processo chamado de RUPTURA. Conhecemos Helly R., uma mulher que acabou de passar pelo processo de ruptura e tem dificuldade de responder a cinco perguntas que lhe são feitas através de uma caixa de som: ela não se lembra de coisas básicas como o seu nome, em que estado nasceu ou qual a cor dos olhos de sua mãe… e tudo o que ela quer é sair dali. Do outro lado, conhecemos Mark S., um homem que passou pelo processo de ruptura e trabalha na empresa há aproximadamente dois anos, e que acaba de ganhar uma promoção porque um dos seus colegas, Petey, foi misteriosamente demitido, o que quer dizer que, a partir de agora, Mark é o responsável pelos novos funcionários que chegarem.

Tudo é sinistro de uma maneira intrigante típica da ficção científica de suspense e mistério – e é um estilo de narrativa que me fisga facilmente. Já estou investido na trama, intrigado, curioso e fazendo teorias. Mesmo antes de entendermos por completo do que se trata “Severance”, podemos perceber as mudanças que acontecem em Mark a partir do momento em que ele chega para trabalhar (o fato de ele estar chorando no carro antes de entrar no prédio, mas não entender o lenço no seu bolso uma vez que já está lá dentro), o que é um trabalho excelente tanto da direção da série quanto da atuação de Adam Scott, e através de Helly podemos entender algumas coisas, especialmente quando ela tenta escapar, mas acaba ficando do mesmo jeito.

Acho particularmente inteligente e sombria a apresentação da ruptura através de Helly, tanto na sequência em que ela desperta em cima de uma mesa, quanto na sequência em que ela tenta sair do prédio, mas acaba entrando sempre no mesmo corredor (o que a leva a perguntar a Mark se ela está morta), e, por fim, no momento em que ela se senta para assistir a um vídeo seu gravado algumas horas antes, na qual ela autoriza que a ruptura seja realizada… a partir dali, ela não tem mais como voltar atrás, porque a ruptura é irreversível (supostamente), e um diálogo rápido dela e de Mark dá o tom da série de maneira espetacular, quando ela pergunta se ela tem família do lado de fora, e Mark meio que dá de ombros e responde que eles nunca saberão isso.

Uma vez que todo o processo foi razoavelmente entendido, deixamos o escritório com Mark depois das 17h, e descobrimos um pouco mais da sua vida do lado de fora – que não parece lá muito mais feliz do que a vida dele no trabalho. Solitário, cheio de dores e traumas, ele é “obrigado” a ir a um jantar com a irmã, onde uma conversa envereda para o caminho do processo de ruptura, o deixando totalmente desconfortável… e, quem sabe, em dúvida a respeito de suas escolhas, mas a verdade é que ele nunca saberá se ele está arrependido ou não da escolha que fez há dois anos. É tudo bastante intenso, e a expressão melancólica e quase vazia de Mark naquela mesa é uma das cenas mais simples e mais dolorosas desse primeiro episódio.

Foi uma surpresa ver Mark sendo observado por um homem misterioso do lado de fora da casa da irmã – um homem que o segue até o jantar que ele ganhou como um “pedido de desculpas” da empresa por um machucado na cabeça (causado por Helly, mas ele não sabe disso). E o homem misterioso aparece lhe dizendo que “a sua voz é diferente ali” (aquele momento me fez sorrir de orelha a orelha, porque eu já estava adorando o rumo que a história estava tomando), e então descobrimos que se trata de Petey: o homem que foi demitido da empresa. Embora eles fossem “melhores amigos” no trabalho, Mark não tem nenhuma memória dele, e não entende como ele pode ter “revertido” a ruptura, o que não deveria ser capaz, nem o que ele quer com ele.

Mas, aparentemente, não havia maneira de sair da empresa de “boa vontade”: o próprio Mark já tentou isso, sem sucesso. Mark está “satisfeito” com a ideia de esquecer seus traumas e seu luto durante 8 horas por dia, mas a partir do momento em que Petey planta uma dúvida em sua mente, não tem como voltar atrás, e ele vai querer saber o que Petey tem para lhe contar, e qual é a natureza do trabalho que é realizado naquela empresa – e, consequentemente, por que o procedimento de ruptura é essencial para os funcionários de lá. Tenho a impressão de que “Severance” ainda vai me surpreender muito nos oito episódios restantes (!), e estou curioso para entender tudo, mas aquela sequência final da vizinha/chefe dele me causou um calafrio. No que Mark se meteu?

Ótima estreia!

 

Para mais Pilotos de séries, clique aqui.

 

Comentários