Sandman, Volume 5 – Um Jogo de Você (Chacina na Quinta Avenida / Cantigas de Ninar da Broadway)

Bárbara e Wanda!

SEMPRE é fascinante começar uma nova obra de Neil Gaiman, seja ela em prosa ou em quadrinhos… e há uma sensação de “algo novo” toda vez que iniciamos um novo arco/volume de “Sandman”. O quinto volume da HQ, intitulado UM JOGO DE VOCÊ, começa com duas edições eletrizantes e competentes, que exploram personagens humanos em suas complexidades (alguns que já conhecemos e estamos revisitando, outros que são novos, todos cheios de possibilidades), e cenários e conceitos característicos da mitologia de “Sandman”, que nunca falha em fascinar e impressionar. Há muita magia e muita força nesse começo de “Um Jogo de Você”, e já sinto que ele pode vir a se tornar o meu Volume favorito na publicação – ou ao menos um deles.

Neil Gaiman é um contador de histórias magistral. Eu pouco mais de 20 páginas, ele enche sua trama de informação sem sobrecarregá-la, entregando um primeiro capítulo desse novo arco que é brilhantemente introdutório, claro, e, ainda assim, intenso. Gosto muito das primeiras páginas de “Capítulo 1: Chacina na Quinta Avenida”, que traz um diálogo misterioso e do qual parece que ainda entendemos muito pouco, entre personagens que não são vistos, mas cujos nomes vamos conhecendo: Luz, Wilkinson, Prinado… em paralelo, veremos mais tarde o Senhor dos Sonhos aparecendo apenas em duas páginas, ao lado de Matthew, como um espectador da história que está se iniciando em “Um Jogo de Você”: por enquanto, sua única função é observar

E eu adoro quando ele faz isso.

A grande força desse primeiro capítulo está na verdade que os seus personagens transmitem. Reencontramos Bárbara, aproximadamente dois anos depois de “Casa de Bonecas” e, nesse tempo, ela se separou de Ken e se mudou para Nova York, onde recomeçou a sua vida… desde então, ela não sonha mais. É diferente de “não se lembrar dos seus sonhos”, porque Bárbara ainda se lembra dos sonhos que costumava ter antes disso tudo, mas ela realmente não sonha mais… há dois anos. Essa informação vem à tona durante uma conversa despreocupada com Wanda, e eu ADORO como a amizade das duas é apresentada com tanta potência, porque acreditamos nela desde o primeiro momento, quando Wanda aparece a convidando para irem fazer compras…

Mesmo que as duas estejam sem nenhum dinheiro.

Percebemos rapidamente que Wanda é a protagonista agora, pelo menos desse primeiro capítulo – porque Bárbara ainda desempenhará um papel grandioso em “Um Jogo de Você”, ao que tudo indica. Wanda é uma mulher forte, carismática, envolvente… é difícil não se apaixonar por ela já nas suas primeiras páginas. E o fato de ela ser uma mulher trans poderá trazer discussões interessantes ao longo desse arco de “Sandman”, a menos a julgar por aquela fala tão certeira e tão importante quando Bárbara descobre o nome que ela tinha antes: “Wanda é o meu verdadeiro nome, bebê-Barbie. Alvin foi o nome que me deram quando eu nasci”. Isso é tão sucinto, mas tão forte e tão bem-colocado que me deixou profundamente contente. E amo a representatividade.

Em uma HQ de 1991. Neil Gaiman incrível!

Voltando à Bárbara, parece que eventualmente ainda descobriremos mais a respeito do motivo de ela não sonhar há dois anos… até porque as coisas estão começando a voltar à tona para ela. No caminho para o café-da-manhã antes de irem babar nas vitrines da Tiffany’s, Barbie e Wanda veem uma senhora no metrô que morre de medo de cachorro – e acaba “esbarrando” em um cachorro gigantesco na Quinta Avenida, que parece ter saído diretamente dos sonhos de Barbie… daqueles que vimos em “Casa de Bonecas”. Trata-se de Martin Dezossos, que é brutalmente assassinado como “uma criatura perigosa” aqui, mas que tem tempo de entregar a Barbie a Porpentina e falar sobre o perigo que a “Terra” está correndo graças ao retorno do Cuco.

Eles precisam da Princesa Bárbara.

E se Cuco é uma criatura aterradora que pode destruir tudo, temos os filhos do Cuco espreitando – mais perto do que Barbie pode imaginar. Em “Capítulo 2: Cantigas de Ninar da Broadway”, vemos as pessoas mais próximas de Barbie em Nova York terem que enfrentar uma série de corvos que se aproximam das pessoas adormecidas, prontas para transformar qualquer sonho que elas estejam tendo em pesadelo… foi angustiante acompanhar a transição do sonho incrível de Wanda para algo traumatizante. Neil Gaiman volta, nessa série de pesadelos, a brincar com o bizarro e o aterrador, entregando histórias de duas páginas sombrias e macabras, todas motivadas por corvos que saíram de dentro de um dos moradores do prédio em que Barbie está morando: George.

Novamente, parece que teremos uma galeria interessante de personagens morando nesse prédio… Hazel procura Barbie para contar sobre uma possível gravidez e pedir conselhos, por exemplo, e Barbie se mostra bastante calma e sábia em suas palavras, dando direções do que Hazel precisa fazer agora, primeiro para ter certeza de que está realmente grávida (de quebra, ainda temos um pouquinho mais de background para a personagem). Mas estou realmente muito curioso com Thessaly, que Hazel diz não ter procurado porque “ela é muito padrãozinha”, mas o final da edição deixa claro que tem muito sobre ela que ainda não sabemos… afinal de contas, ela é a única que não é afetada pelo corvo, por exemplo, e não só desperta quando ele se aproxima, como o mata e busca George…

Toda dissimuladamente simpática, mas com uma faca nas mãos.

Thessaly pode ser uma grande personagem!

Barbie, por sua vez, ESTÁ VOLTANDO A SONHAR. Depois de tanto tempo, é como se a presença de Martin Dezossos e a Porpentina tenham a despertado novamente para esse universo e para essa possibilidade… acompanhamos uma transição interessante que perpassa por sonhos e/ou pesadelos razoavelmente típicos, até que ela se encontre novamente no que eles chamam de “Terra”: de volta no lugar de onde Martin Dezossos veio, e onde seus companheiros estão esperando por ajuda… novamente “Princesa Bárbara, Herdeira da Terra”, ela tem uma missão a cumprir, esteja ela preparada para isso ou não. Esses dois capítulos são uma excelente introdução para “Um Jogo de Você”, que tem tudo para ser um arco marcante de “Sandman”, como todos são.

 

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