Nosferatu (2024)

“We are here encountering the undead plague carrier... the vampyr... Nosferatu”

Certamente, um MARCO do gênero! Lançado no final de 2024 nos Estados Unidos e chegando aos cinemas brasileiros nos primeiros dias de 2025, “Nosferatu” é um remake do clássico filme alemão de terror de 1922, que, por sua vez, é uma espécie de adaptação do romance de Bram Stoker, “Dracula”, embora apresente algumas diferenças, especialmente nos nomes dos personagens, por se tratar de uma “adaptação não-autorizada”. Assistindo a “Nosferatu”, mesmo à versão de 2024, conseguimos entender com facilidade a importância de “Dracula” como história e de “Nosferatu” como obra audiovisual para o gênero… percebemos como grandes obras posteriores aproveitaram ideias, conceitos, técnicas e visuais para compor suas próprias narrativas.

A sensação, ao sentar-me em uma sala de cinema para assistir à versão de 2024 de “Nosferatu” é a de que eu estava assistindo a um clássico… é interessante como o filme, lançado agora, tem a aparência e a energia de um clássico, e é uma obra extremamente competente em sua parte técnica. Eu sinto que o filme funciona muito bem como um suspense bem construído, que te deixa constantemente apreensivo, até nervoso, e certamente funciona muito bem como terror, que é o gênero no qual se enquadra oficialmente. Há algo de constantemente macabro, mas também sedutor, e não estou falando sobre relações interpessoais… estou falando sobre florestas, sobre castelos – parece algo claramente assustador, mas que também exerce um fascínio que te faz querer se aproximar.

O que, por sua vez, tem tudo a ver com o conceito de “Nosferatu”.

“Nosferatu” é um filme visualmente impecável. Gosto muitíssimo da “limitação” proposital nas cores, do uso de luz e sombra, de como se constrói aquela área nebulosa que nos faz indagar o que é verdade e o que não é… aquela separação tênue entre realidade e sonho e/ou pesadelo. Há algo de estranhamente empolgante na dúvida, no incerto, e é em cima desse princípio que grandes cenas do filme são construídas, como o momento em que Thomas Hutter é “convidado” a entrar em uma carruagem vazia para ser levado até a casa do misterioso Conde Orlok, com quem ele tem um negócio a fechar… um negócio, por sua vez, que vai muito além da venda de uma casa em Wisborg, na Alemanha, que é o que ele acredita que está indo negociar em sua viagem de 6 semanas.

O elenco do filme faz um trabalho impressionante dando vida a esses personagens e, consequentemente, a essa história: Bill Skarsgård é o temível e estranho Conde Orlok, uma figura amaldiçoada e transformada em um “vampiro”, o mortal Nosferatu, que dá título ao filme; Nicholas Hoult dá vida a Thomas Hutter, o protagonista que é atraído até a casa do Conde Orlok, a seis semanas de distância, para fechar um contrato cujo bem ele desconhece; Lily-Rose Depp é a enigmática Ellen Hutter, uma das figuras mais interessantes do filme, com a sua conexão estranha com Nosferatu, estabelecida desde cedo, em contraponto à sua relação com Thomas e com seus amigos; o filme ainda conta com Willem Dafoe, Aaron Taylor-Johnson, Emma Corrin, Ralph Ineson e Simon McBurney.

A base da história é a mesmíssima de “Drácula”, talvez sendo uma adaptação mais fiel à obra de Bram Stoker do que algumas outras adaptações que já vimos por aí… com outros personagens bons orbitando a trama, o centro da narrativa está no Conde Orlok, em Ellen e em Thomas. Ellen é uma mulher que despertou o interesse e, mais do que isso, a obsessão de Nosferatu, e agora Thomas é atraído até a sua casa para assinar um contrato no qual “entrega” a esposa a ele, e é justamente daí que saem algumas das melhores cenas de “Nosferatu”, na minha opinião: esse jogo constante e ameaçador entre Orlok e Thomas, as reações de Thomas conforme percebe que ele está sendo aprisionado e que os vários avisos que recebera anteriormente são verdadeiros…

Enquanto Thomas está aprisionado na casa do Conde Orlok, acompanhamos cenas de Ellen voltando a ter sonhos que são muito mais do que isso: a conexão psíquica com Nosferatu cobrando seu preço, a “tirando” desse plano, como eventualmente é defendido pelo Prof. Von Franz, embora nem todos acreditem nas suas palavras sobre um demônio que a “possui”, e essa “maldição” vai, eventualmente, se espalhar… tomar as pessoas próximas a Ellen até que ela aceite Nosferatu, especialmente quando Thomas consegue fazer o inimaginável e escapar do Conde Orlok e trilhar seu caminho de volta à Alemanha, contra todas as possibilidades. Nosferatu, então, parte escondido em um navio, em caixas com terra de onde foi enterrado, para a Alemanha…

E assim começa a guerra contra o demônio/vampiro.

São três noites de desespero e de apreensão crescente, conforme se desenha o clímax de “Nosferatu”. Ellen começa a perder as pessoas que ama, em uma chantagem que expressa o quão doentio é o Nosferatu, enquanto Thomas, tendo se recuperado parcamente de suas recentes experiências, decide matar a criatura que está “assolando a cidade com a praga” e acabar com essa história de uma vez por todas… mas o Professor Von Franz sabe o mesmo que Ellen Hutter, embora ela adoraria negar, sabe: ela é a única que pode deter Nosferatu. Em um plano simples e doentio, que gera inegável desconforto e até repulsa na audiência, Ellen se entrega a Nosferatu e o mantém em sua cama até o amanhecer longe das terras onde foi enterrado, quando a luz do sol finalmente o consome…

O sacrifício de Ellen salvando o mundo.

Cito três obras que me vieram à mente enquanto assistia a “Nosferatu” no cinema: as cenas de Ellen falando como que afetada por Nosferatu me fizeram pensar em clássicos de possessão como “O Exorcista”; a relação de servo e lorde entre o Conde Orlok e o Herr Knock talvez tenha influenciado a relação entre Voldemort e Rabicho, em “Harry Potter”; e toda a questão de Ellen no meio de Orlok e Thomas, Nosferatu tentando usar Thomas para atingi-la e o fascínio através do qual Nosferatu manipula Ellen desde muito jovem me lembra um pouco a dinâmica toda de Christine, Raoul e o Fantasma em “O Fantasma da Ópera”. São coisas que ME vieram à mente assistindo ao filme, mas que ajudam a entender a importância de “Drácula” e “Nosferatu” para histórias, de modo geral.

Classifico “Nosferatu” como um grande filme, especialmente por sua excelência na forma como faz terror. É um filme em que o terror está agarrado nas entranhas de sua concepção: história, visual, efeitos, direção… é inteligente como o filme é cuidadosamente impactante nos momentos certos (a própria sequência de abertura!), mas como constrói um ambiente macabro e assustador que gera apreensão e, eventualmente, medo – sem a necessidade de jump scares, por exemplo, que podem ser apelativos e considerados a forma mais fácil de fazer terror. “Nosferatu” não; “Nosferatu” de fato se debruça sobre o gênero para construir uma história inteira que transborda perversidade, incerteza, desconforto e horror. Certamente, assistir a esse filme no cinema foi uma experiência e tanto!

 

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