X: A Marca da Morte (X, 2022)

“I will not accept a life I do not deserve”

Escrito e dirigido por Ti West e protagonizado por Mia Goth – nos papeis tanto da protagonista quanto da antagonista, Maxine Minx e Pearl, respectivamente –, “X” é um slasher delicioso, com gostinho de clássico. Lançado em 2022, o filme que no Brasil recebeu o subtítulo (desnecessário) de “A Marca da Morte” deu início a uma franquia que conta com dois outros filmes igualmente protagonizados por Mia Goth: o primeiro deles uma prequel intitulada “Pearl” e lançado ainda em 2022; o segundo uma sequel intitulada “MaXXXine” e lançado em 2024. A produção da A24 entrega tudo o que se espera de filmes slasher, referências a grandes obras do gênero, especialmente no tom e ambientação, e alguma discussão a respeito de sonhos e envelhecimento.

Maxine Minx é uma jovem atriz pornô que sonha com o estrelato – ela diz a si mesma que é um símbolo sexual e que não vai aceitar uma vida diferente da que merece. Maxine é parte de um grupo formado pelo elenco e pela produção de um filme pornográfico que será gravado em uma fazenda no interior, e é o cenário perfeito para um filme slasher: um grupo reduzido de personagens confinados em um lugar remoto, acompanhados de anfitriões misteriosos. Como poderia dar errado? O filme tem um tom provocativo, mas também cômico, e eu acredito que esse tom de comicidade combina demais com as propostas slasher“X” se sai muito bem apresentando seus personagens, motivações, os “vilões” e, é claro, nas sequências sangrentas…

Parte do filme se dedica à gravação do filme pornográfico na fazenda… Bobby-Lynne Parker, que parece saída de um daqueles anúncios dos anos 1950, é uma das grandes estrelas do filme, ao lado de Jackson Hole e da própria Maxine, todos acompanhados por Wayne, o produtor e responsável por tudo. RJ Nichols, por sua vez, é o diretor, que planeja fazer algo além de um mero filme pornográfico – ele também quer fazer arte e revolucionar o ascendente mercado de home vídeo (o filme se passa em 1979). Por fim, o grupo é completado por Lorraine Day, uma garota aparentemente puritana que gosta do que vê durante o primeiro dia de gravação e anuncia que “ela quer fazer uma cena”, para o desespero de RJ, seu namorado.

Eu gosto de como o filme brinca com os seus gêneros, e como o faz bem!

É depois que Lorraine grava a sua cena e RJ resolve ir embora sozinho que a grande matança começa… Pearl, a idosa que é a dona da fazenda na qual eles estão gravando e assistira através da janela a uma gravação mais cedo, quer também ter um pouco de ação – o auge de sua vida parece ter passado, e ela é uma pessoa amargurada e sedenta que parece nunca ter realizado seus sonhos e não ter mais os prazeres pelos quais seu corpo anseia… prazeres que aquele grupo de “visitantes” parece saber explorar tão bem. Depois de rejeitar Pearl, RJ é o primeiro assassinado, e então o filme entra em uma espiral de matança conforme todo o grupo é assassinado, um a um… RJ do lado de fora do carro, Wayne no celeiro, Jackson por Howard, o marido de Pearl…

As mortes das mulheres da equipe são, talvez, diferentes, porque a relação de Pearl com elas é diferente… é como se, de alguma maneira, ela se visse nelas, desejasse ser elas e/ou se ressentisse delas. Bobby é jogada no lago para ser devorada por um jacaré da maneira mais brutal possível; Lorraine é presa no porão da casa, como um “presente” para Pearl, mas Howard acaba atirando nela quando ela tenta escapar; e Maxine é quem mais chama a atenção de Pearl, porque é a garota que ela considera mais parecida com quem ela era (a ironia de ambas serem interpretadas pela mesma atriz não passa despercebida). Na conclusão do filme, Maxine vence sobre Pearl em uma cena bizarra, mas que tem tudo a ver com o gênero!

Gosto das discussões e das ironias do filme… gosto de como escancara a hipocrisia do moralismo frente à naturalidade do sexo, e de como o sexo é tratado e definido como um combustível – a única diferente entre pessoas como Bobby-Lynne, Lorraine ou mesmo Pearl é que algumas pessoas não têm medo de seus desejos, de seus prazeres, de admitir que gostam de sexo… essa é uma crítica f*da a uma sociedade conservadora, hipócrita e preocupante. E sexo é mesmo, de certa maneira, o combustível que move o filme: protagonistas e antagonistas igualmente. E, para completar, o filme ainda tem um tom satiricamente cômico com aquela pregação barata que está acontecendo o tempo todo na televisão da casa de Pearl e Howard…

Eu não acho que seja uma grande revolução cinematográfica, embora acredite que algumas pessoas possam ter captado mais do que eu enquanto assistiam ao filme, mas é um filme que funciona dentro de sua proposta e dentro de seu gênero e é bastante competente em desenvolver a sua premissa e envolver o telespectador. Sendo um grande sucesso de crítica e de público, sinto que “X” já ganhou o seu espaço quase como um “clássico instantâneo” dentre os slashers, e estou bem curioso para saber o que será explorado nos outros filmes… primeiro, “Pearl”, que deve dar escopo à antagonista desse filme; depois, “MaXXXine”, que nos apresenta os efeitos dos eventos de “X” sobre a protagonista. Realmente, ainda tem história a ser contada aqui!

 

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