On Broadway – Spring Awakening – I’ll never let them go…


Spring Awakening é absolutamente genial pela quantidade de assuntos que traz e pela maneira com que os trata. Como comentei na primeira postagem, o tema central é o despertar da sexualidade dos jovens em uma sociedade alemã conservadora do século XIX, em que conversas sobre sexo simplesmente não existiam – os temas abordam homossexualidade, estupro, gravidez, aborto, abuso sexual e suicídio.
Todos os assuntos são apresentados, trabalhados e bem discutidos. A peça passa todas as mensagens que pretende de maneira precisa. As músicas são incríveis (quase todas apresentadas como um show, com microfones extras, o que dá a peça um ar diferente de tudo o que já tínhamos visto – bastante inovador), os personagens são ótimos, e a história é emocionante. Não observamos riqueza em cenário ou figurino… a peça é simples, e o máximo que temos de cenário são seis cadeiras, uma mesa, e uma parte do palco que se eleva (para o fim do primeiro ato)… e ainda assim ela é grandiosa por seu conteúdo.
É um dos meus musicais preferidos. Eu ouço as músicas o tempo todo, e continuo assistindo a peça regularmente. E toda vez eu rio em certos momentos, e me emociono em outros. E nunca deixo de admirar a grandiosidade dessa produção. Fez bastante sucesso no Brasil em 2010, graças à versão brasileira estrelada por Pierre Baitelli e Malu Rodrigues (eu sou simplesmente APAIXONADO por essa imagem que foi bastante usada para divulgação!), e produzida por Charles Möeller e Claudio Botelho. Infelizmente eu não tive a oportunidade de assisti-la ao vivo, mas quem teve garante que era uma experiência e tanto…
O que torna Spring Awakening um grande sucesso é a complexidade de seus personagens, e o quanto você pode se identificar com alguns deles, ou com vários deles em diferentes momentos… além do sentimento de amizade que permeia toda a peça, com destaque para Melchior e Moritz. Melchior Gabor é o personagem que mais me faz dizer que a peça é revolucionária. Ele dá voz a essa revolução, ele luta contra a sociedade, ele enfrenta os professores, ele ajuda Moritz, ele aprende sozinho o que todos se recusam a lhe ensinar. E ele tem falas realmente memoráveis, como Are you therefore suggesting there’s no further room for critical thought or interpretation? E eu fico feliz em perceber como ele também tem suas dúvidas, suas confusões típicas da idade – It’s cold in these bones, of a man and a child.
Melchior foi primeiramente interpretado por Jonathan Groff, na versão Off-Broadway em 2006, que também o interpretou no elenco original da Broadway. Jonathan é o Melchior clássico, mas eu tenho que admitir que gosto mais de Kyle Riabko (responsável pelo personagem na tour nacional) que parece ter dado um tom ainda mais de protesto a ele. Ele me parecia um Melchior real, e ele me emociona muito mais em certas cenas, como Those You’ve Known. E em The Mirror-Blue Night eu sinto mais suas dúvidas, o vejo mais como alguém forte que pode ser vulnerável.
Wendla é uma menina doce e inocente. Tudo o que ela quer é saber alguma coisa sobre a vida, mas ninguém a explica nada. O que encanta na personagem é sua leveza, sua inocência – e é mágico vê-la querendo experimentar as coisas da vida, como querendo apanhar quando descobre que Martha apanha e ela não sabe como é… e se entregando relutante a Melchior no fim do primeiro ato, ao som embalante de I Believe, em uma cena extremamente emocionante. Os conflitos da personagem no segundo ato são tocantes, e pode tirar algumas lágrimas. É bom ver como sua cabeça está funcionando, e como tudo parece ter acontecido tão rápido a ela. A diferença da personagem no início da peça até o final…
Wendla foi primeiramente interpretada por Lea Michele, Off-Broadway e elenco original da Broadway. Foi aí que eu virei fã da atriz, por essa sua interpretação. Wendla exige olhares de dúvida mesclados com inocência, e Lea fez isso de maneira brilhante, é ótimo vê-la interpretando a personagem conforme ela vai se descobrindo. Christy Altomare fez par com Kyle Riabko, e eu gosto demais dela – de alguma maneira, ela me parece mais inocente do que Lea, mas não inocente demais para a personagem. Christy é a Wendla na medida certa, faz as cenas perfeitamente (com destaque para I hear your heart beating, Melchior) e canta lindamente.
E por fim, temos Moritz, o último protagonista. Moritz é o personagem que mais me encanta por tudo o que ele enfrenta e pela sua fraqueza. Sua mensagem está em todos os fardos que precisa carregar, que parece demais para uma única pessoa: a pressão da escola e da família, e o começo de sua vida sexual (com os famosos sonhos molhados) sem que ele entenda o que está acontecendo com ele. Em meio a muitas histórias que se desenvolvem, é demais para ele. Ele é um personagem carismático, divertido, e sofrido. Ele parece uma criança às vezes, é transtornado o tempo todo, tem alguns acessos de raiva, e você sente pena do personagem… ele realmente exige demais do ator. Seus melhores momentos são And Then There Were None e Don’t Do Sadness.
O primeiro ator a interpretá-lo, junto com Lea e Jonathan, foi John Gallagher Jr. Ele definiu o Moritz como ele deve ser – criança, brincalhão, e que não sabe o que fazer com os acontecimentos de sua vida. Mas, mais uma vez, eu prefiro o Moritz de Blake Bashoff, que fez com Christy e Kyle, porque ele é o Moritz que eu vejo. Ele além de ser carismático, e ter uma inocência bela de se assistir, deu ao personagem um tom melancólico que eu não sentia com John. Os olhares e expressões de Blake me convencem mais do que qualquer um, e ele é um Moritz perfeito… So dak… so dark… SO DARK. Sua cena com Ilse (e a que se segue) exige que o ator o emocione, e Blake me emociona pra caramba… eu sinto que ele está mesmo vivendo Moritz naquele momento, que ele entende tudo o que o personagem diz em seu monólogo, e ele faz com que eu também entenda – é grandioso, é brilhante.
Além dessas histórias se desenvolvendo, outros personagens ganham destaque, como Martha (apanhando do pai e sendo abusada) e Ilse. Acho interessante o paralelo que se faz entre as duas: passando pelo mesmo, uma saiu de casa e vive na rua, sem futuro e a outra fica em casa, sofrendo por medo do que acontecerá se sair. E Ilse tem cenas geniais em todas suas aparições – ela não tem várias cenas, mas todas suas cenas são memoráveis… especialmente sua conversa com Moritz antes e depois de Blue Wind
Entre os garotos, os maiores destaques vão para Hanschen e Ernst… os dois protagonizam um romance realmente bonito, com cenas românticas, mas especialmente divertidos. Eles conseguem fazer o público simpatizar com eles e torcer por eles até a cena final do casal – e é bonito ver como os atores se entregam à cena, nos concebendo um beijo real, natural; e Hanschen ainda protagoniza uma cena bastante divertida de masturbação no primeiro ato, com My Junk – a cena precisa ser assistida e não pode ser explicada. Mas só posso dizer que ela é divertida, natural e muito boa… o absurdo do acontecimento e a maneira despreocupada como todos os atores agem não deixam que ela fique vulgarizada. Brilhante.
A mensagem central seria algo como: não adianta oprimir, não adiante tentar esconder. Algumas coisas, como a sexualidade, são naturais e vai chegar aos adolescentes de uma maneira ou de outra. Enquanto os pais e as escolas não explicam isso direito, eles descobrem isso sozinhos, a natureza os guia para o que é tão natural… como acontece com Melchior e Wendla ao fim do primeiro ato. É algo novo e diferente acontecendo, enquanto os dois se descobrem, em uma cena bastante bonita. Nos faz pensar em coisas que talvez nunca tínhamos parado para pensar (Touch Me), e vemos coisas acontecerem sabendo que ainda acontecem hoje (como com Martha, Ilse, Moritz e a própria Wendla…). E não tem como não se emocionar e não considerar algumas coisas no momento em que prestamos atenção na letra de Left Behind. O convite final da peça é claro: PENSE! Eles deram bastante material para isso…
A peça, como eu comentei, trata assuntos importantíssimos, e faz isso muito bem. Você acaba a peça pensando, e provavelmente secando as lágrimas também. A cena final, como comentei na música da semana Those You’ve Known, é muito emocionante – é o momento mais glorioso de toda a peça. É o momento de aplaudir os atores de pé, e de parabenizar os escritores pela história fabulosa – e os compositores pela letra genial da música. Não tem como terminar Spring Awakening sem ter rido, sem ter chorado e sem estar pensando… é uma experiência maravilhosa, e que todos deveriam ter. Recomendo a peça a todos! Até mais!

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