Substitutos
Imagine um mundo sem crimes, sem doenças, sem
acidentes… uma “sociedade perfeita”. Em 2054, isso é possível graças ao serviço
de Substitutos – são robôs de
aparências humanas quase perfeitas que funcionam como uma espécie de avatar, permitindo ao seu “dono”
comandá-lo através de uma máquina no conforto e segurança de sua casa. Sem
Inteligência Artificial, o filme inicialmente me fez recordar muitas coisas.
Primeiramente pensei no aluguel de corpos de Starters, mas o mundo sem doenças me lembrou A Ilha. Também passei por Gamer
e não pude deixar de pensar no OASIS
com esse mundo fictício no qual a humanidade se esconde.
Esse tipo de filme tende a me deixar confuso – é
daquele tipo de ficção científica deliciosa que te leva à reflexão; minha
confusão parte do princípio de: “quem eu apoio?” Ao mesmo tempo em que
reconheço os perigos e a desumanização da vida, eu me encontro fascinado com
cada cena e cada possibilidade – não podemos negar que é uma idéia genial e
tentadora. A possibilidade de ser quem você quiser e viver em segurança podendo
ter uma vida quase real através de seus substitutos… esse tipo de confecção de
uma realidade futurística me encanta, e também comecei a lembrar-me de Philip K. Dick enquanto assistia.
Ele não teria escrito assim, mas enfim.
Mas mesmo entendendo os propósitos, devemos
considerar coisas como: a maneira como a humanidade deles lhes foi roubada. O
que é muito bem representado pela cena na qual, após ter seu substituto
completamente destruído em missão e sem o FBI conceder-lhe um novo, o
personagem sai do hospital e tenta ver o mundo através de seus olhos humanos –
além dos olhares espantados que ele recebe naquele mundo totalmente falso,
também há sua incapacidade de se adaptar novamente ao “mundo real” – dificuldade
para enxergar, o medo constante de esbarrar em pessoas, os sons altos demais
para ele. Ansiedade terrível.
Que bizarra a visita à loja de subs.
E o salão de beleza.
Restauração da humanidade vira então o tema
central do filme. Chega a ser apavorante ver a face real das pessoas depois de
termos nos acostumados com seus substitutos – e é quando o filme mais acerta
nas suas reflexões, ao mostrar o estado da “humanidade”, a que elas foram
reduzidas, e como adoram viver uma vida de mentira, escondendo-se das verdades
e dos sofrimentos, confinando-se em seus quartos e vivendo através de
substitutos. E convenhamos, isso é uma bela analogia futurística com o terrível
presente que vivemos! É por isso que esse tipo de filme é tão inteligente…
Não só por isso, mas o filme também se amarra de
maneira precisa trazendo ótimas reviravoltas no seu desfecho – não podemos
dizer que tenha sido completamente inesperado, talvez porque em algum canto
escondido de minha memória o filme ainda se escondia, mas foi uma bela discussão.
Como o próprio criador dos substitutos passou da fase de achar que tinha
salvado a humanidade até se deparar com a culpa pela morte de seu próprio
filho. Descobrir suas múltiplas personalidades é quase assustador, mas isso só
torna o filme ainda mais encantador pela sutileza e inteligência de suas
proposições.
Adorei o fim com todos os subs sendo desligados,
as pessoas finalmente saindo de dentro de suas casas, e se redescobrindo como
seres humanos… é uma daquelas ficções científicas que questionam a própria
realidade atual através de uma série de símbolos, e nos levam a reflexões
pertinentes sobre a humanidade e a realidade. Consegue fazer conosco o que as
ficções científicas de qualidade devem fazer: fazer-nos pensar. Incrível como a
ficção científica parece ser talvez o gênero mais eficaz para questionar
realidade e seres humanos – como pode assumir facetas críticas e filosóficas
com tanta convicção!
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