Garoto encontra Garoto (David Levithan)
Paul encontrou o amor de sua
vida. E depois estragou suas chances da forma mais catastrófica possível.
Agora, com a ajuda de uma líder de torcida transexual, de seu melhor amigo gay
enrustido e de seu ex-namorado obsessivo, ele se lança na improvável missão de
reconquistar seu amado de uma vez por todas.
É uma deliciosa e audaciosa escrita de David
Levithan. Mais uma.
Aprendi a realmente adorar a escrita de David
Levithan… eu sempre quis ler Nick &
Norah, e ainda não encontrei o livro para vender (e fiquei com preguiça de
pedi-lo pela internet) – li Levithan pela primeira vez, mesmo, com Will & Will, e é claro que eu
adorei! Depois encontrei, por acaso, “Todo
Dia” em uma livraria, e aquele é um dos melhores livros que eu li na vida!
Adorei a intensidade e profundidade da narrativa, como ele consegue tratar
temas polêmicos e tabus de maneira tão verdadeira. Um livro admirável! Resolvi
ler, então, Garoto encontra Garoto,
porque eu realmente adorei o tema, e sendo de David Levithan… eu sabia que
teria alguns dias de uma leitura deliciosa pela frente! E o livro me
surpreendeu, em vários sentidos.
Trata-se da história de Paul: um garoto gay que
vive em uma cidade maravilhosa, e estuda em uma escola onde a aliança entre gays
e héteros é mais forte do que nunca. Ele nunca teve problema em ser gay. Ele sempre foi gay, e sempre
soube disso – e viveu como é. É incrível como as coisas parecem fáceis para
ele, como é tranqüilo para ele ser quem ele realmente é. Em contraste a outras
pessoas ao seu redor para quem as coisas não são tão simples: como Tony, que é
gay, mas a família é super religiosa e não aceita sua orientação sexual; ou
Kyle, que é a dúvida em pessoa: seu ex-namorado, que agora está ficando com
garotas. Vai entender. Há toda essa variedade, e essa desconstrução de gênero
na literatura de David Levithan que eu adoro
– como não amar, por exemplo, Infinite Darlene, que é a quarterback do time de futebol e a líder de torcida?
Como?
Paul é o centro segundo o qual todas as histórias
se desenvolvem – porque ele é o protagonista, e é através de seu ponto de vista
que vemos tudo. E isso é incrível! Porque como Paul é gay e vê a vida de um
jeito muito fácil assim, isso se reflete na escrita de David Levithan: ele fala
sobre a homossexualidade sem preocupação alguma! Não há didática, não há
infinitas lições de morais. Ele é gay e pronto. Várias pessoas ao seu redor são
gays, assim como várias pessoas são héteros. E uma delas é um transexual. E
cada uma dessas características é apenas uma característica desses
personagens. O fato de Paul ser gay não o define, apenas nos ajuda a entender
um pouquinho mais dele. E há tanto mais que podemos entender dele. Eu adoro,
por exemplo, a profundidade do personagem de Tony, com passagens excelentes e
discussões reais emocionantes!
No início, parece que trata-se de uma visão
utópica de uma escola de ensino médio sem preconceitos… mas nem é isso. É
apenas um lugar onde as pessoas são elas mesmas, e todo mundo respeita isso.
Não importa se as líderes de torcida andam de moto, ou se eles tem uma quarterback. O lugar é todo mágico,
fofo, cheio de personagens cativantes! Uma narração irônica de desconstrução de
tudo aquilo que é tido como “tradicional”: um ex-namorado agora “hétero”
obsessivo, um adolescente transexual que é a rainha do baile, um gay que não
pode sair do armário porque sua família é extremamente conservadora. Esses são
os protagonistas de David Levithan. Os adoráveis protagonistas de David
Levithan com quem você realmente se importa, e com quem você pode,
ocasionalmente, se identificar.
“Eu fui o
primeiro representante de turma abertamente gay da minha turma de terceiro ano.
Vi homens andando de mãos dadas na rua em uma cidade grande e li sobre mulheres
se casando em um estado não muito longe do meu. Encontrei um garoto que talvez
eu ame e não fugi. Acredito que posso ser quem eu quiser ser. Todas essas
coisas me dão força. Assim como uma coisa tão simples quanto falar com Tony no
telefone depois da hora de voltar para casa, ouvir que vamos nos encontrar na
cozinha dele sem termos que mentir. / Como falei, é uma pequena vitória. Pode
não durar, mas agora significa tudo para mim” (LEVITHAN, 2014, p. 188)
Porque além de tudo isso, temos toda aquela
narração adolescente tradicional. Paul é um adolescente como outro qualquer:
cheio de problemas em seus relacionamentos. Então ele encontra Noah,
aparentemente o namorado perfeito, e consegue estragar isso da pior maneira
possível porque ele beijou seu ex-namorado, Kyle, que não parava de persegui-lo.
Então embora ele não seja quem traz toda a temática gay ao livro, Paul é aquele
que simboliza esse mundo em que as pessoas não olham diferente para você porque
você anda no shopping de mãos dadas com outro garoto! Ele não tem problema com
isso, ninguém mais precisa ter. E Paul é o adolescente comum, que comete as
mesmas burrices de qualquer outro protagonista, que tem complicações em seu
relacionamento.
Que precisa lutar para conseguir Noah de volta.
E, diga-se de passagem, ele faz isso incrivelmente
bem! TÃO FOFO.
Já com Tony, temos outra visão dessa sociedade,
oposta, representada, aqui, pela Igreja. Mas sendo a Igreja ou não, os pais de
Tony representam a parcela da sociedade que não aceita que alguém seja gay – e
eles não querem que seu filho o seja. Enquanto para Paul tudo parece muito
simples, porque para ele é fácil ser quem ele é (e eu entendo isso, porque eu
vivo esse mundo no qual é fácil ser quem eu sou – é fácil ser gay, ter meu
namorado, e ninguém se importar com isso), não é assim para todo mundo. E
sabemos que não é. Adoro as cenas de Tony, e o seu capítulo realmente me
emocionou, a ponto de meus olhos se encherem de lágrimas, e eu me conter por
estar num aeroporto. A intensidade da escrita de David Levithan, e como aquilo
soa verdadeiro. E REAL! Porque, querendo ou não, já vimos aquelas coisas
acontecerem. Eu já vi. Então é adorável quando ele consegue enfrentar os pais,
consegue fazer com que Paul fique com ele no quarto, que Paul vá visitá-lo… as
lágrimas de Tony nos comovem. Nos machucam. E nos emocionam. E a maneira como
ele “enfrenta” os pais da maneira mais querida e respeitosa possível. Ele é um filho incrível!
Todo o livro foi lindo, o final foi perfeito.
Tivemos um único pedido de Tony: que todos os seus amigos fossem até sua casa no
dia do baile, para que seus pais lhe deixassem ir. “Todos dão um passo à frente. Garotas e garotos. Garotos héteros e uma
drag queen. Meu namorado. Meu ex-namorado. Meu irmão. Eu” (LEVITHAN, 2014,
p. 216). Aquela última dança na clareira… foi lindo,foi tudo o que o livro
representava! Não teve um final feliz com tudo mastigado… foi feito
inteiramente de sugestões. A Joni que foi buscar o Tony, o Tony com o Kyle… mas
foi bonito demais ver essa união entre todos. Foi simples e foi intenso, foi
natural e foi verdadeiro. Emocionante. Nós observamos, assim como Paul se
afasta para observar, e é maravilhoso olhar para essas pessoas felizes, para o
amor que une elas, o sentimento forte e palpável que existe ali… “Que mundo maravilhoso” (LEVITHAN, 2014,
p. 219).
Adorei. Recomendo a todos.
LEVITHAN, David. Garoto
encontra garoto; tradução Regiane Winarski. – 2ª ed. – Rio de Janeiro:
Galera Record, 2014.
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