Acquaria (2003)
“Ah, e a
caixa que o Zavos me deu? Ela era mesmo ‘especcional’!”
Um dos filmes que fazem parte da minha história e
que realmente me trazem ótimas recordações… assim que aquele logo do Evidências e Debates apareceu na tela,
com a musiquinha e a entrevista “otimista”, antes do mundo destruído que
encontramos em Acquaria, meu coração
já deu um pulo, meu rosto se iluminou com um sorriso. Eu lembrava de tudo aquilo, e eu estava preparado para reviver tudo. Acquaria é um filme de aventura e ficção
científica, lançado em 2003 e tendo Sandy e Junior como protagonistas, nos
papéis de Sarah e Kim, respectivamente – e é um filme excelente! Com uma
temática interessante, tratada de forma instigante, o filme narra um futuro
pós-apocalíptico fazendo uma importante referência a acontecimentos da
atualidade sobre os quais precisamos nos lembrar. Com cenários muito bonitos e
bem construídos, nós temos uma fantástica ambientação em um futuro bastante
hostil, sem água, com muita areia, sol e calor para todos os lados… eu acho
impressionante como o filme é sério e bem escrito, e como deve ser valorizado.
Claramente, uma ótima produção brasileira <3
O filme se inicia através de uma televisão e uma
entrevista em um programa chamado Evidências
e Debates, no qual a crise da falta de água é tratada de maneira leviana,
como se as espécies entrando em extinção e as lutas por água potável não fossem
dignas de muita preocupação. Assim, descobrimos que estamos em um satélite
sobrevoando a Terra, antes que o cenário mude de figura e conheçamos o planeta
como o veremos dali em diante: estéril,
amarelo, só com areia. Com o tal satélite já se despedaçando, descemos à
Terra para conhecermos aquele famoso réptil de duas cabeças e Mingus, o
cachorrinho do adorável Guili! Esse é o local onde a ação do filme ocorrerá,
acompanhando alguns personagens em uma antiga vila abandonada, sendo eles
Gaspar, Kim e Guili. O primeiro, assistente de um casal, pais de Kim,
assassinados 15 anos antes por um grupo de nômades mutantes, e Guili um
garotinho que foi deixado pelos pais quando passaram por ali com sua caravana e
a mãe estava muito doente.
Vocês percebem que Sandy e Junior fizeram um filme
que exaltava a ficção científica e fazia isso de uma forma muito boa? Porque é
toda a construção de um ambiente pós-apocalíptico, convincente, e que é gerado
através de conseqüências de atos reais, provocando uma crítica interessante e
cabível – também há elementos da ficção científica muito bem apresentados, como
o próprio ambiente no qual se passa a história, e elementos como os Hollogs, o
Campo de Força Vital e os nômades mutantes. Acredito que, na época, se você
esperasse um filme da dupla, talvez estivesse aguardando algo mais na linha do
seriado que passava aos domingos, mas o filme tem uma qualidade verdadeira e
admirável, com todo seu tom sério e tudo o mais. Eu adoro, é um filme muito bom
e muito delicioso de assistir – gosto do tipo de narrativa, gosto das
possibilidades como eles as apresentaram. Também, a cargo de curiosidade: eles fizeram um filme de uma sociedade
pós-apocalíptica bem antes que filmes como Jogos Vorazes, Maze Runner ou Divergente existissem.
Uhm.
A construção do ambiente se dá de forma
satisfatória e bem inteligente, com seus detalhes e precisões – e algumas
viagens. Mas acontece que, nesse futuro árido onde a pouca água que existe
precisa ser captada das raríssimas chuvas através de sistemas muito modernos, os seres humanos precisaram se
adaptar a viver em condições muito diferentes daquelas a que estavam
acostumados. É um triste e desesperador futuro, fruto de nosso presente
inconseqüente. Gaspar e Kim continuam os trabalhos dos pais do garoto – embora
com enfoques distintos. Gaspar continua os experimentos e as pesquisas que eram
realizadas 15 anos em relação a uma máquina que seria capaz de produzir água,
ou melhor, acordar as águas adormecidas no fundo do Planeta. Kim continua a
produção de instrumentos musicais que o pai conduzia, fazendo música. E Sarah é
encontrada no meio do deserto e levada para a casa, onde ela acaba mudando a
vida e a rotina das pessoas ali, enquanto age com bastante mistério ainda sobre
o seu passado e sua origem.
Mas um dos grandes destaques do filme é e sempre
será o fofo do Guili. Interpretado por Igor Rudolf, ele é um garotinho muito
fofo que concede ao filme certo ritmo e um clima gostoso de acompanhar – em
meio à toda uma história séria e uma crítica à humanidade, ele é uma criança
que se diverte, que brinca e que certamente torna a vida daquelas pessoas muito
mais feliz. Não é fofo como ele amarra aquela cueca vermelha no pedaço de ferro
do deserto para que o Kim pare de tropeçar nele toda vez que passar ali? Ou
como ele é um verdadeiro desastre, soltando um “Não foi nada” ao deixar a Casa de Zavos e outro “Não foi nada” ao quebrar o vidro da
casa com o bumerangue de Sarah? E ainda o “Ele
já tem namorada!” que ele solta ao ouvir a conversa de Sarah e Kim? Ou o
memorável “A gente já tá se divertindo,
Gaspar?” e o debochado “Eles vivem na
areia. Eles não entram dentro de casa”, de um jeito que toda criança gosta
de falar. Ele é uma fofura que só na Noite da Serpente (assustando a serpente
para ela cuspir a Lua) e no “Não”
para o Mingus, sobre ir junto à caça/pesca, como Kim e Gaspar sempre dizem para
ele.
Por isso é triste demais quando o Mingus
desaparece.
O futuro como foi apresentado traz a realidade dos
Hollogs, que eu acredito que tenha sua origem na palavra “holograma”, acho eu.
Tudo é bem caracterizado, como os banhos com um nível diminuto de água,
transformada em vapor, ou ainda o assustador mar que é, na verdade, um conjunto
de ondas de pura areia, no qual animais ainda vivem, por mais estranhos que
sejam. E a Aldeia é cercada por hastes e bolas de energia, que produzem um
Campo de Força Vital, que é o que mantém os Hollogs vivos – já que eles não têm
a capacidade de manter-se vivos no ambiente “natural” do Planeta. É assim que,
em uma inocente brincadeira, Sarah joga a bolinha para Mingus de um jeito
errado, ele passa pela “cerca” e acaba desmaterializado. É assim, também, que
descobrimos que Gaspar é um Hollog no fim do filme, quando ele não pode deixar
o Campo de Força Vital, ainda que tudo esteja sendo destruído depois do ataque
do furacão.
Um dos melhores momentos do filme fica para as
conseqüências da Casa de Zavos – um lugar estranho, repleto de caixas (que são,
na verdade, histórias – como A Chave do
Tamanho ou A Máquina do Tempo) e
que se equilibra no topo de uma pedra. Quando Kim consegue comprar uma caixa,
ele a abre com Gaspar, Sarah e Guili, e eles são transportados para um mundo de
fantasia na qual podem viver a história, sendo partes de ACQUARIA. Assim, conhecemos a Cidade das Águas, em uma das
sequências mais bonitas e mais marcantes do filme, não pela música da Sandy ou
pela sugestão do romance dela com Gaspar, mas sim pela inocência de brincar-se
com a água, a oportunidade de vivenciar algo como aquilo, para pessoas como
eles, num mundo como aquele. A paleta de cores do filme é substituída por tons
azuis muito mais calmos, aconchegantes, e nós temos a abundância de água explorada,
por exemplo, em uma sequência de dança que serve para ilustrar a diferença da
vida no passado. A idéia é chocar, é estabelecer uma diferença gritante entre
aquela “alucinação” e a realidade muito mais seca.
Com uma construção muito boa, o filme se concentra
em apresentar a vida daqueles humanos que se adaptaram a esse novo ambiente,
mas cuja vida não independe da água, e que ainda sentem sua necessidade e sua
falta. Fazendo com que criamos laços com os personagens (não tem como não
gostar do Guili ou lamentar quando o Mingus é desintegrado) e contando uma boa
história sobre como dois irmãos (Sarah e Kim) foram separados quando crianças
mas se reencontraram para fazer a Máquina de Água dos pais funcionarem. Com Kim
ao piano, tocando, e os dois cantando Planeta
Água, eles despertam a Máquina dos pais, com cordas escondidas que a fariam
funcionar. E é emocionante – me arrepia todo escutar aquela música, eternamente
lindíssima, numa situação daquela e servindo àquele propósito. É assim que um
furacão é despertado, furacão que destrói tudo pelo caminho, mas que desperta
Acquaria das profundezas do Planeta. Uma nova esperança, um recomeço para a
humanidade, ganhando a chance de fazer as coisas diferentes dessa vez, e
esperamos que as façam.
É uma mensagem belíssima, na voz do fofo do Guili…
…sobre como não há nada mais “especcional”
do que a história a ser escrita por nós!
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