A noite em que Blanche Dubois chorou sobre minha pobre alma
Eis um espetáculo que eu decidi ver por acaso, sem
nem saber muito bem do que se tratava, e que me SURPREENDEU! “A noite
em que Blanche Dubois chorou sobre minha pobre alma” é um drama de
aproximadamente 60 minutos escrito por Jarbas Capusso Filho e interpretado por
apenas dois atores em palco: Inês Aranha e Daniel Morozetti. Ambos sustentam um
texto incrivelmente bem escrito, que dança pela sensualidade e pela dor de duas
vidas sofridas e frustradas, quando Estela contrata um garoto de programa, mas
ao invés de transarem, como era de se esperar desse tipo de “contrato”, eles
passam a noite inteira conversando… sobre seus devaneios, suas ambições e
sonhos, e sobre suas fraquezas e seus passados repletos de sofrimento. Em um
teatro pequeno e com a plateia muito próxima, os atores e o texto COMOVEM!
“Blanche Dubois”, que faz parte do título do
espetáculo, é a protagonista de “Um Bonde
Chamado Desejo”, uma peça famosíssima de 1947 que já ganhou inúmeras
versões ao longo dos anos, não apenas no teatro, mas também na televisão, no
rádio e no cinema… eu, infelizmente, ainda não pude assistir ao filme ou à
peça, e por isso pouco sei sobre Blanche, mas sei que Estela, a personagem de
Inês Aranha, já foi uma atriz famosa que era facilmente reconhecida na rua, mas
perdeu o papel de Blanche Dubois porque BEBIA DEMAIS, e agora está há anos
trancada dentro de casa, mal saindo para coisa alguma, afogando-se em bebidas e
mágoas por ter perdido o papel de sua vida e o seu marido. Há 8 anos que ela não
tem um encontro com um homem… a interpretação de Inês Aranha é pungente e
profundamente dolorosa.
Daniel Morozetti, por outro lado, interpreta
Johnny, um garoto de programa que vem para a casa de Estela com o único
propósito de “fazer o seu trabalho”, mas depressa percebe que ela não está
realmente preparada para isso – ela nunca
fez isso antes. Então enquanto ele quer acabar logo com isso e ela quer
conversar, e para isso oferece-lhe mais dinheiro, ele acaba se abrindo e
falando sobre os seus próprios problemas, sofrimentos e passado traumatizante. Johnny
cresceu em um cemitério, onde viu coisas dolorosas como uma mãe que todo ano
pedia para desenterrar seu filho no aniversário, e que perdeu a mãe muito jovem
porque O PAI BEBIA DEMAIS. Por isso ver Estela bebendo tanto, do início ao fim
da peça, lhe incomoda. O personagem ganha profundidade quando deixa de ser um
mero garoto de programa e expõe suas fragilidades.
E os dois se conectam de uma maneira inovadora.
O espetáculo é convincente e doloroso. As coisas
se intensificam com o passar do tempo, e você vê que não há mais para onde
escapar das coisas que já foram ditas e compartilhadas, e tudo fica
desesperador quando ela não tem dinheiro para pagar, mas pouco se importa com o
fato de ele ameaçar a sua vida… ou quando ele desiste de atirar nela e acaba
ficando por ali, velando o seu sono quando ela finalmente apaga no sofá depois
de ter bebido tanto. O dia está amanhecendo e ele a chama de “meu amor”, sem
que ela ouça, representando o fim forte e tocante do espetáculo, com um texto
impressionante e boas interpretações. Uma noite de puro sofrimento, mas
sofrimento colocado para fora, dito em palavras e, ao ser compartilhado,
possivelmente amenizado. A proposta da peça é incrível e me marcou de verdade!
P.S.: Eis, também, uma
fotinha com Daniel Morozetti, que interpretou Rui Salgado, o namorado de
Letícia em Chiquititas, e agora está
em cartaz no teatro com “A noite em que Blanche Dubois chorou sobre minha pobre
alma”. Muito simpático e bonito, foi bom conhecê-lo!
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