The Matrix (1999)



“There is no spoon”
Eu adoro “The Matrix” – é uma das grandes obras-primas do cinema e do gênero de ficção científica. A obra dos então Irmãos Wachowski revolucionou o gênero, entregando tudo aquilo que uma boa ficção científica deve ter: inovação. Com um novum bem estabelecido, bem justificado e uma trama bem-escrita, “The Matrix” foi capaz de questionar a realidade (no melhor estilo Philip K. Dick, um dos mestres do gênero), fazendo o que nenhuma obra tinha feito até então, usando uma temática bem atual na época (e ainda hoje), que era o advento da tecnologia, dos computadores e da inteligência artificial. Até quando os seres humanos vão brincar de Deus e tentar criar vida? Até que a consequência seja a aniquilação de nossa própria? O filme é praticamente perfeito, com um roteiro inteligente, complexo, mas bem explicado, atuações excelentes, e sequências de ação que são de tirar o fôlego, estabelecendo o estilo stop motion.
“The Matrix”, em 1999, estabelece uma distopia marcante e revolucionária, que nos apresenta um mundo totalmente dominado pelas Máquinas, onde os humanos foram escravizados ou, mais do que isso, transformados em baterias. Assim, os humanos vivem presos (?) em um programa de computador que os faz acreditar que estão vivendo suas vidas normalmente, no fim do século XX, o ápice da sociedade humana, antes do avento da inteligência artificial. Então, com mais sucesso do que qualquer outra produção, “The Matrix” consegue questionar o mundo “real” e plantar todo tipo de dúvidas em nossas mentes, que são interessantíssimas, além de uma infinidade de reflexões. Até onde a escravidão é escravidão, se não me vejo como um escravo?
The Matrix é uma das produções mais bem-sucedidas, também, em misturar o gênero da ficção científica com a ação de maneira convincente – com cenas muito bem coreografadas, novas, e pertinentes à história. O filme criou um estilo de ação muito próprio que se consagrou mais tarde – mas na época de seu lançamento, foi uma grande inovação, e impressionou as pessoas de uma geração inteira, como a icônica cena na qual Neo para as balas que vêm em sua direção (na verdade, toda aquela sequência final do filme é de arrepiar!). E como ele pode fazer isso? Porque sabe que está dentro da Matrix, mas também porque é o Escolhido. Em partes, saber que está dentro da Matrix, sendo controlado exteriormente, faz com que você possa, você mesmo, optar por controlar o que vê e o que faz, e isso é uma ideia genial do filme, uma das premissas mais interessantes.
Mas isso demanda treinamento…
Também adoro as alegorias, como o computador conversando com Neo logo que o conhecemos, e ele ainda é um mero programador preso dentro da ilusão da Matrix, antes de verdadeiramente tornar-se o Escolhido e fazer a diferença. “Follow the White Rabbit”Alice no País das Maravilhas é citado em mais de um momento, e podemos perceber os interessantes paralelos guiando a história de maneira inteligente, da mesma maneira que Pinóquio guia outra excelente ficção científica da época: “A.I. Inteligência Artificial”. Não só isso, mas também teremos uma das mais famosas quotes do filme referenciando O Mágico de Oz, que eu adoro: “Buckle your seatbelt, Dorothy, ‘cause Kansas… is going bye bye”. Com direito a um “tornado” do lado de fora e tudo.
O filme é gigantesco, e é todo construído meticulosamente para guiar-nos em uma jornada ao lado de Neo – nada é apressado, e a complexidade de tudo nos é apresentada como se nós mesmos estivéssemos sendo acordados da Matrix e trazidos de volta para o “mundo real”. Sabe aquela sensação de não saber se está sonhando ou não? Lembro-me um pouco de “Inception” e dos contos de Philip K. Dick. Amo a cena de Thomas Anderson (vulgo Neo) na janela do prédio, guiado por Morpheus ao telefone, para fugir do Agente Smith que está tentando capturá-lo. A própria duplicidade de seu nome é importantíssima, pois ele já assume duas identidades mesmo antes de saber da ilusão e da profecia: uma de Thomas Anderson, um respeitável programador, e outra de Neo, um hacker poderoso na internet, em busca de Morpheus… e da verdade.
“What is the Matrix?”
É atormentador conhecer as maneiras como a Matrix funciona, e ver cenas tenebrosas como o momento em que Neo perde a boca, ou então o bug colocado nele pelo seu umbigo – certamente, uma das cenas mais angustiantes de todo o filme. Não que o filme não vá brincar com esse tipo de cena o tempo todo antes de Neo ser retirado para o mundo real, nos fazendo questionar o que era sonho e o que era realidade. Isso se alguma coisa foi sonho e se alguma coisa foi realidade. Sempre as cores escuras ou então esverdeadas, que conferem ao filme seu estilo clássico do qual sempre nos lembramos. As imagens que nos vêm à mente quando pensamos em Matrix sempre, sempre, evocam essas cores, e a fotografia do filme é muito bem construída em cima desses princípios.
“The Matrix” consegue questionar a nossa realidade de uma maneira singular. Ao ver o filme, duvidamos de tudo e de todos (assim como Morpheus pede que Neo desconfie, enquanto o treina e ele se distrai com a mulher de vermelho), olhamos para as ruas e lugares como se fossem todos criados e passíveis de mudança a qualquer momento, servindo a propósitos maiores que não cabem a nós. Toda rua vazia, todo prédio, toda pessoa é questionável, e o clima do filme sugere uma ilusão o tempo todo – como um sonho, como um programa de computador, como uma droga. E acabamos deixando o filme, após mais de 2 horas, possivelmente atormentados, olhando para todos os lados e procurando sinais da Matrix. E assustados procurando por mudanças no mundo toda vez que temos um déjà vu.
“I don’t like the idea I’m not in control of my life”
Depois do choque inicial e de toda a premissa apresentada, precisamos conhecer o mundo real – Neo é levado até ele através de sua própria escolha, apresentada na icônica cena da Pílula Vermelha e da Pílula Azul. Uma das quais lhe levará à verdade, e a outra que lhe fará acordar novamente em sua cama, acreditando no que ele quiser acreditar. “Welcome. To the real world” – conhecer o “mundo real” através de Neo é quase tão chocante para nós quanto para ele, com uma cena que marcou história no cinema e em minha vida. Aquele futuro controlado por Máquinas, a desconstrução de toda uma realidade na qual ele e nós sempre acreditamos. Aqui é que o filme se reinventa, mostra a que veio, e cria todo um novo universo, retirando-o (e a nós) da ilusão criada pela Matrix desde sempre. Aceitar toda essa nova realidade não é simples.
Estamos próximos a 2199. Através de uma simulação, Morpheus apresenta tudo o que aconteceu – “O que é real? Qual a sua definição de real?” O mundo que Neo conheceu nada mais é do que o mundo antigo, do final do século XX, que agora só existe como parte de uma simulação chamada de Matrix. A Inteligência Artificial começou a se desenvolver no início do século XXI, e isso gerou toda uma nova geração de Máquinas, e, em uma guerra subsequente, os humanos queimaram o Céu, na esperança de que então as Máquinas (que dependiam da luz solar) não sobrevivessem. No entanto, a humanidade se viu escravizada, porque a energia produzida por eles era mais do que suficiente para sustentar as Máquinas, e, como combustíveis, eles se tornaram escravos presos em um mundo de fantasias gerado pela Matrix, quando na verdade seus corpos estão em campos e mais campos de cultivação de humanos. Plantações de humanos.
De nós.
E, naturalmente, não é nada fácil para Neo, a princípio. Eu gosto muito de como o filme faz a transição, e de como Neo precisa “renascer” no “mundo real”, com aquelas terapias para refazer seus músculos atrofiados, ou os seus olhos doendo porque “nunca foram usados antes”. Daqui em diante, Neo precisa entender qual é o mundo no qual vive, se adaptar à nova vida e entender como controlar e usar a Matrix e seus conhecimentos a seu favor. O filme aposta em diferenças alarmantes entre o “mundo real” e o “mundo da Matrix”, quando na verdade os dois parecem igualmente desesperadores (!), e é difícil saber o que faríamos se estivéssemos no lugar de Neo. Quase dá uma vontade muito grande de poder voltar no tempo e escolher a Pílula Azul e deixar isso tudo para trás. Mas então, também, estaríamos vivendo eternamente em uma mentira…
Uma das sequências de que mais gosto no filme é de quando, depois de despertar no mundo real e ser capaz de viver nele, Neo começa a entrar em simulações, com Morpheus, para que possa aprender sobre a Matrix… se ele for mesmo o Escolhido, como Morpheus acredita que ele é, ele terá que voltar lá para dentro – assim, acompanhamos incríveis cenas do treinamento, e duas são especialmente marcantes. Primeiro, aquela cena do Morpheus e do Neo lutando kung fu, e embora o Neo perca na primeira vez, ele rapidamente domina algumas técnicas que não parecem possíveis, atingindo uma velocidade que apenas Agentes da Matrix atingiram… isso é um bom sinal, não? Também gosto muito da cena do “primeiro salto” de Neo, e da expectativa gerada entre os humanos que o assistem, mas ele age como qualquer um deles…
E cai na primeira vez.
Uma das coisas mais importantes de “The Matrix” são as suas bonitas mensagens e todas as frases de efeito que marcaram uma época, das quais ainda nos lembramos hoje com tremenda nostalgia. Como “Eu estou tentando libertar a sua mente, Neo, mas eu só posso abrir a porta. Você é quem tem que atravessá-la”, que é dito pelo Morpheus em duas ocasiões, ou a mais que perfeita cena no Oráculo em que ele conhece um garoto capaz de entortar colheres. “Do not try bend the spoon. That’s impossible. Instead, only try to realize the truth. […] There’s no spoon”. THERE’S NO SPOON! A cena do Oráculo também traz uma revelação para Neo: não, ele não é o Escolhido, no fim das contas. Mas Morpheus acredita que sim e, por isso, ele fará de tudo para protegê-lo, inclusive sacrificar a própria vida… em algum momento, Neo terá a vida dele e de Morpheus nas mãos.
Assim, o clímax do filme é uma obra-prima da ficção científica e da ação COMBINADAS! Morpheus realmente se sacrifica para que Neo possa escapar, e acaba preso pelo Agente Smith, mas Neo não vai deixar que ele morra por acreditar em algo que o Oráculo já lhe disse que não é verdade. Por isso, ele entra novamente na Matrix, para resgatar a mente de Morpheus, E O NEO ESTÁ MAIS F*DA DO QUE NUNCA! Aqui, temos as melhores cenas de ação, e Neo finalmente começa a acreditar no que o Morpheus sempre acreditou: talvez ele seja, sim, o Escolhido. Assim, ele enfrenta o Agente Smith em uma luta incrível de stop motion, depois de salvar Morpheus, enquanto tenta chegar até uma saída de volta para o mundo real… e, eventualmente, ele acaba sendo baleado e morto dentro da Matrix. E parece que tudo chegou ao fim.
Mas é quando o Neo finalmente se torna o Escolhido. Antes de sua “morte”, ele tinha soltado um IMPACTANTE “My name… is Neo” para o Agente Smith, mas agora Neo desperta depois de ter morrido e de ter sido confirmado como morto. Nem todo mundo poderia fazer isso: morrer na Matrix significa morte cerebral, significa morrer no “mundo real” também. Mas Neo é o Escolhido, e Trinity confirma isso, dizendo que o Oráculo lhe avisara que ela se apaixonaria, e o homem por quem ela se apaixonasse seria o Escolhido… então ele não pode morrer, porque “ela o ama”. E Neo se levanta, vivo e poderoso, E EU ADORO aquela cena do Neo parando as balas no ar (ÍCONE!), ou aquela luta quase que despreocupada contra o Agente Smith. Ele também consegue, agora, enxergar de fato a Matrix e seus códigos verdes… Neo se transforma oficialmente no ESCOLHIDO.
E esse é apenas o começo da história… Neo ainda tem muito trabalho pela frente… ele ainda tem que recrutar novos humanos, e tem que enfrentar as máquinas de uma vez por todas, se ele é o cara que vai acabar com isso tudo. Mas isso fica para o futuro, para as sequências. Por ora, ficamos por aqui, com aquela cena incrível do Neo voando, como o DeLorean voando no fim de “De Volta Para o Futuro”. “The Matrix” é um ícone na cultura nerd, e um marco para todos os amantes de ficção científica e, acredito, de cinema de modo geral. O filme, difícil de se igualar, traz tudo o que mais amamos: um roteiro complexo e bem amarrado, cenas muito bem filmadas, ação bem coreografada, e essa capacidade deliciosa de questionar a realidade de maneira convincente, fazendo-nos passar dias pensando a respeito das dúvidas suscitadas pelo filme…
Um marco, certamente. Amo!


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P.S.: Republicação (com alterações) de texto originalmente postado em 09/05/2014.

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