Centro do Meu Mundo (Die Mitte der Welt, 2016)
“I love you”
É poético,
excitante, melancólico e belo… não é o filme gay com final feliz que eu adoro
assistir, mas também não é o filme gay com um final deprimente que me deixa
para baixo – “Centro do Meu Mundo”
está lindamente posicionado em algum lugar entre esses dois extremos… foi uma
experiência linda. Com uma brilhante atuação de Louis Hofmann (muito além de “Dark”), a beleza estonteante de Jannik
Schümann como seu par romântico e uma direção incrível, o filme tem um visual
belíssimo e uma história marcante que nos arrebata, em mais sentidos do que eu
podia esperar. Eu conheci o filme em 2017, depois de ver Louis em “Dark”, e o que eu sabia era que se tratava de um romance gay… um quente
romance gay. Mas o filme é muito mais do que isso e fala sobre as
dificuldades de relacionamento de uma família formada por uma mãe e dois filhos
gêmeos.
Assim, o
filme está o tempo todo alternando entre o presente e o passado, para que
conheçamos Phil, sua irmã e sua mãe da
melhor maneira possível – a narração de Phil é emocionante, e eu gosto de
como alguns trechos ganham referências, fotos e dos cortes que acompanham todo
o filme, uma direção inteligente que nos guia pelos sentimentos dos
personagens… Phil e sua irmã gêmea, Dianne, sempre foram parceiros um do outro,
mas muito diferentes entre si. Ele é alegre, expansivo, sempre tem um sorriso
pronto no rosto e parece levar a vida com mais leveza que a irmã que, por sua
vez, tem problemas de relacionamento com a mãe, resultado de um mistério que os
acompanhou durante toda a vida: quem é o
pai dos dois? Durante anos, Phil e Dianne perguntaram sobre isso para a
mãe, e ela sempre inventou histórias para não dizer a verdade…
Quando Phil
retorna para casa depois de umas semanas em um acampamento durante as férias,
ele percebe que não é apenas uma tempestade que devastou o lugar – mas algo
aconteceu entre Dianne e Glass, sua mãe. As duas não falam uma com a outra e
têm dificuldade em dividir o mesmo espaço, mas nenhuma quer falar sobre isso, e Phil vai deixando
levar… o trauma de Dianne tem a ver com a mãe nunca ter dito a verdade, e com
um escudo que ela mesma projetou para não se permitir machucar-se novamente. A mãe
namorou outros homens, e toda vez que Dianne permitia que eles se aproximassem e se
tornassem importante, alguma coisa acontecia, Glass acabava discutindo e
eles iam embora e a garota tinha a sensação de ter sido abandonada mais uma vez… por isso dessa vez, com Michael,
ela nem mesmo quer tentar. Diferente de Phil.
Por isso,
Phil adora viver “um conto de fadas” quando um novo aluno aparece na escola –
Kat, sua melhor amiga (?), anunciou o novato e a possibilidade de “ele ser gato”,
dizendo que ele morava ali há alguns anos, foi embora, e agora retornou, e então
Nicholas, o deus grego do Nicholas, entra pela porta, e deixa Phil sem
ar… adoro a cena, porque é como nos sentimos na adolescência, quando vemos o crush: sem ar. Parece que tudo para, que
só existe você e a pessoa para quem você está olhando e, para Phil, ainda tem
algo mais do que isso: ele se lembra de
ter visto o garoto uma vez na infância. Pode não ter sido mesmo o Nicholas,
e ele nem sabe o quanto daquela memória é real,
mas ele se lembra do garoto em quem esbarrou na frente do supermercado,
derrubando todas as garrafas de água, e então o garoto sorriu para ele… e se parece muito com o Nicholas de agora.
E, agora, ele sabe seu nome.
Phil está
encantado – é uma possível memória do passado alinhada a um cara bonito,
interessante e misterioso… o entendemos
perfeitamente. Assim, ele passa a assistir aos treinos de Nicholas diariamente. Enquanto Nicholas se
exercita na pista de corrida, Phil observa cada detalhe de seu corpo, de sua
postura, até filmando um pouco para decorar cada segundo daquilo. Até que um
dia Phil acaba não aparecendo… ele não
está lá no treino para ver Nicholas, mas ele casualmente o encontra mais tarde
no supermercado (!), e então Nicholas se aproxima dele e pergunta “onde ele
esteve”, porque “sentiu sua falta no treino”. Aquilo me arrepiou como se fosse eu
que estivesse sendo cantado daquela maneira… o flerte, a intensidade do olhar,
a piscadinha de Nicholas depois de convidá-lo para “ficar depois do treino” no
dia seguinte, se ele quiser.
E Phil quer.
No dia
seguinte, Phil está lá para ver Nicholas correr e está lá, depois de tudo, como
ele o convidou para estar. É uma das cenas mais excitantes do filme, e também uma das mais bonitas, sexualmente
falando. Adoro como o filme é intenso, quente e excitante, sem nunca ser
vulgar… a beleza das cenas nos envolve, nos acalenta e nos acolhe. Nicholas faz
Phil segui-lo até o vestiário vazio, e então, sem pudor e de forma provocante,
ele se vira para Phil enquanto tira a roupa – para o olhar nervoso e surpreso
de Phil. E então ele tira a cueca também (Jannik ganha um nu frontal aqui),
coloca a toalha no ombro e pergunta se “ele vem com ele”. Ali, Phil e Nicholas transam pela primeira vez, nos chuveiros
do vestiário da escola, e a cena é lindíssima. Amei tudo nessa cena… a
delicadeza dos toques das mãos, do nervosismo de Phil, em paralelo ao Phil na
bicicleta, indo embora, completamente feliz.
Depois daquele
dia, Phil e Nicholas têm uma série de encontros… a relação deles começa de uma
forma física, e as cenas de sexo entre eles são deliciosas (algumas breves,
algumas rápidas demais, uma delas
mais longa), mas também os vemos se aproximar de outras maneiras. Phil é um
livro aberto, ele fala tudo o que Nicholas quer saber, enquanto Nicholas foge
de perguntas sobre ele, e dá respostas genéricas que não significam muita
coisa… mas que talvez Phil goste – o tom
misterioso de Nicholas. E eu estava pronto para achar que Phil estava se
envolvendo mais que Nicholas, mas eu percebo, eventualmente, que cada um a está
vivendo intensamente à sua maneira… Phil está pronto para um conto de fadas,
para dizer “Eu te amo”, enquanto Nicholas, ao que tudo indica, ainda tem
problemas com a família em relação à sua sexualidade.
Mas não quer dizer
que ele não se envolva com Phil.
Porque Nicholas
se envolve… ambos se envolvem mutuamente. Para a família de Phil, ser gay não é
um problema, e ele tem uma relação aberta com a mãe sobre isso, inclusive temos
aquela cena em que Nicholas quer conhecê-la e Phil o leva orgulhoso para casa,
e Glass diz que “ele herdou o bom gosto dela”. E aos poucos vamos vendo como
eles se conectam, e como Phil o ama… como olha nos olhos dele com sentimento profundo,
como o observa enquanto ele dorme, como passa as mãos nas suas costas e desenha
um “I love you”, sem dizê-lo, porque a mãe não o encorajou a isso – talvez porque
ela mesma teve histórias de amor frustradas ao longo de toda sua vida. E quando
Phil diz que ama Nicholas, realmente o seu coração é partido, porque Nicholas
sorri, não responde, e então Phil acaba indo embora… e Nicholas quase parece não entender.
A relação dos
dois começa a passar por problemas sérios quando Kat, a “melhor amiga” de Phil
(vou colocar entre aspas de agora em diante, porque não consigo chamá-la
assim), se envolve na relação… Kat adorava dizer que “não gostava de Nicholas”,
no começo, e então, quando Phil contou sobre eles, ela disse que tentaria ser
legal, por ele, e eu achei que isso podia ser legal… eu pensei em "Hoje Eu Quero Voltar Sozinho”, e
como Giovana tinha que aprender a aceitar o namoro de Leo e Gabriel, e ela
consegue fazer isso, no fim, mas “Centro do
Meu Mundo” não é assim. Temos várias cenas de Phil, Kat e Nicholas, e
embora eu tenha adorado ver o Nicholas sorrindo, eu detestei ver o Phil se
sentindo, eventualmente, excluído… como quando Nicholas vem à casa de Phil para
uma tarde de piscina ou qualquer coisa assim e traz Kat com ele.
Aquilo foi
doloroso.
Eventualmente,
Nicholas permite que Phil adentre um pouco mais de seu mundo… ele o leva para a
sua casa quando os pais não estão, e quer mostrar toda a casa, mas Phil acaba
se fixando em uma cabana, onde descobre uma coleção de coisas que Nicholas guarda: coisas que pessoas “perderam”, a que
ele deu nova casa e novas histórias… naquele momento, compartilhando aquilo com
Phil, era como se tivéssemos visto Nicholas pela primeira vez – algo realmente
íntimo, totalmente real. E Phil também sente isso. Depois daquela visita, Phil
é uma fofura, preparando um presente para Nicholas (com a ajuda de Michael, o
novo namorado da mãe), e foi dificílimo de assistir à cena em que ele vai
entregar esse presente para Phil e o vê
transando com Kat na cabana… aquilo foi uma traição sem tamanho: Nicholas,
Kat, a cabana. Eu quase saí chorando como
Phil, e chorei com ele quebrando o presente em mil pedaços, enquanto chora.
O vidro se estilhaçando é uma alegoria ao
seu coração naquele momento.
Partido.
Arrasado.
Destruído.
Eu sofri… não
vou negar. O filme me fez tão mal nesse momento, porque eu não queria aceitar. Eu
sou romântico, eu queria o final feliz de “Hoje
Eu Quero Voltar Sozinho”. Mas, eventualmente, eu entendi. Como eu disse no
começo, o filme não era necessariamente sobre isso. O namoro (foi um namoro?)
de Phil e Nicholas é parte disso, e sempre vai ser uma história intensa e
bonita repleta de memórias para Phil, mas não vai ser o que ele queria que
fosse, no fim das contas: um conto de
fadas. Em uma das cenas na cama com Nicholas, Phil fala sobre como não
gosta de estar em casa, e prefere estar com ele, porque com ele não há
problemas ou qualquer coisa assim… e percebemos que Nicholas era isso para
Phil: uma fuga, um refúgio, um lugar perfeito onde ele não precisava pensar nos
problemas de sua família, na relação da mãe e da irmã…
E quando ele não
tem mais isso, quando o seu “lugar perfeito” deixa de existir, Phil é obrigado
a se voltar para a família, para a verdade à sua frente e lidar com esses
problemas. Então, de certa forma, Nicholas ajudou nesse crescimento de Phil. E então
ele conversa com a mãe, ele conversa com a irmã, e temos uma revelação
fortíssima que explica muito sobre a relação toda partida da família, quando Dianne conta sobre o rancor que sempre
nutriu contra a mãe por ela não contar a verdade sobre o pai deles, e como,
quando criança, ela deu um chá abortivo para a mãe quando ela engravidou: se ela não ia contar sobre o seu pai, também
não devia ter outro filho, ela pensava. É algo cruel e doloroso, mas também
uma atitude impensada e impulsiva de uma criança, e isso tudo continua pesando
na consciência de Dianne… até que ela
contou tudo à mãe numa briga durante as férias.
Por isso elas
estavam mais distantes do que nunca…
E Phil
precisa ajudar a consertar isso – e ele consegue, dentro do possível. No fim,
Phil encontra sua paz. Ele se despede formalmente de Nicholas, porque Nicholas
vem procurá-lo para saber porque ele está estranho,
e quando Phil diz que o viu com Kat, Nicholas diz que quer continuar como eles estão, que precisa dos dois… Nicholas não diz
a Phil que o ama, porque ele não tem certeza disso (ou ele tem medo de dizer
isso, e acho que é mais isso do que a outra opção), mas ele diz que “é louco
por ele”, que “não consegue mais imaginar-se sem ele” e pede que eles continuem
juntos, porque eles viveram coisas muito bonitas e muito fortes juntos, mas ele
também diz que “precisa” de Kat. O coração de Phil é partido mais uma vez, ele
beija Nicholas uma última vez, mas diz que não
pode compartilhá-lo… e é um direito que ele tem, de não querer essa relação.
Então, por
mais que doa, Phil a termina.
Vemos Phil
chorando de maneira realmente profunda, e nós sentimos tudo com ele, mas eu me
orgulho de verdade de sua coragem e de sua determinação. E Nicholas falou sério
quando disse que era importante o que viveram, e prova isso enviando para a
casa de Phil algo de sua coleção de coisas que “as pessoas perderam”: um globo de neve, aquele que Phil perdera na
infância, na frente do supermercado, quando esbarrou com ele… ele também se
lembrava de Phil, daquele dia. Uma pena que ele não tenha a força para assumir
isso de vez e viver o que seria uma linda história de amor. Mas é bom para Phil
ver esse globo de neve agora, e tudo o que ele significa: que o que viveu com Nicholas foi real e importou. Vai ser sempre uma
memória bela. Agora, Phil está focado na família, na mãe e na irmã, e está indo
fazer uma nova viagem… dessa vez para
os EUA, em busca do pai. Talvez nunca o encontre, não importa, Phil só quer se aventurar.
É um final
imperfeito e melancólico, mas não infeliz.
Me tocou
profundamente… amei, mas partiu meu coração. Que relação complicada!
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Realmente o filme é tudo isso, muita emoção o coração fica apertado com as cenas do término do relacionamento deles. Mais isso e a vida. Parabéns pela Review.
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