Black Mirror 2x03 – The Waldo Moment

 

Qualquer semelhança com a realidade não é mera coincidência.

Eu me lembro de ter visto esse episódio em 2017, e ele não era dos meus favoritos… acabei de reassisti-lo, no entanto, e agora estou em choque: QUE EPISÓDIO BOM! Talvez seja o desespero das eleições presidenciais de 2018 que tenha me ajudado a entender mais “The Waldo Moment”, e agora eu aplaudo esse episódio desesperador, revoltante – mas importante, pertinente e real. Gosto muito das possibilidades de “Black Mirror”, que consegue nos causar angústia nos mais diversos gêneros… não temos uma grande utopia, nem um futuro tecnológico nem nada disso; “The Waldo Moment” está centrado no nosso mundo e na maneira como lidamos com a política… talvez, em 2017, eu nunca tivesse parado para pensar na maneira como as pessoas são capazes de eleger palhaços despreparados para um cargo importante… mas veja onde chegamos.

O episódio está centrado nas eleições para um cargo político em uma cidade dos Estados Unidos, e temos dois grandes competidores, a princípio: um que é um homem provavelmente corrupto e criminoso, que está na política há anos e vai manter as coisas como estão; outra que é uma mulher que quer fazer o seu currículo, mas que ao menos acredita em alguma coisa e talvez tivesse alguma chance de vencer, embora achasse que não. E então ganhamos Waldo. Waldo é um personagem interpretado por Jamie Salter: um urso azul em animação que foi concebido para ser a piada grosseira de um programa, e ele ganha certa visibilidade quando eles “pregam uma peça” no Sr. Monroe, um dos candidatos para o cargo… é ofensivo, é sem-noção, e o Sr. Monroe não estava preparado para aquilo, mas parece que todo mundo adora as piadas e xingamentos de Waldo.

E isso ganha proporções nunca antes imaginadas. Com toda a grosseria e o despreparo notório de Waldo (até porque Jamie Salter nunca se interessou por política), ele vai ganhando destaque com provocações constantes, piadas de baixo calão e momentos realmente constrangedores… ele não é um personagem inteligente e revolucionário, ele não tem ideias, não defende nada, não sabe articular-se em um debate (embora pelo menos ele a debates), mas é justamente essa a crítica de “Black Mirror”: a maneira como as pessoas são capazes de se apegar a alguém como Waldo, uma figura desprezível e, pior, despreparada, com a desculpa de que “estão fazendo a diferença”, que “querem mudança”, entregando a cidade ou o país na mão de cada ser… acho que o mais revoltante é ouvir o discurso que se levanta da multidão: que Waldo representa a “mudança”.

O próprio Jamie Salter sabe que isso não faz sentido: ele sabe que Waldo não é real, que ele não tem preparo nenhum para assumir um cargo político, mas ele acaba se tornando um nome tão forte, comentado no Twitter e aparecendo em programas de TV, que ele acaba se tornando um candidato ao cargo político do Sr. Monroe, e acaba se tornando um concorrente cada vez mais forte – por mais absurdo e revoltante que tudo possa parecer. É um episódio intrigante e muito bem construído, por isso eu amo “Black Mirror”. Podemos citar, no mundo real, um nome que foi feito de chacota, que foi zoado por certo programa de TV, e cuja visibilidade, eventualmente, ganhou o Twitter e toda a internet, ganhou a televisão e, como resultado, as eleições de 2018. Como seriam as coisas se aquele programa de TV não tivesse “subido” esse nome, para começo de conversa?

Acho que estamos vivendo em um episódio de “Black Mirror” mesmo.

De quebra, além de criticar a política, os candidatos e os eleitores, “The Waldo Moment” ainda tem uma crítica extra no personagem bem construído de Jamie Salter – e eu gosto de como ele é distante de Waldo… porque, diferente de muita gente, ele entende que Waldo É SÓ UM PERSONAGEM. Mesmo assim, ele não teve forças o suficiente para ser contra isso tudo… não até que fosse tarde demais, pelo menos. É angustiante ver a maneira como ele se rebela, mas as coisas já se tornaram muito maiores do que ele e, consequentemente, não há como voltar atrás… Jamie vê seu personagem ser roubado porque, embora fosse dele, pertencia ao canal e ao programa para o qual ele foi escrito, e então Jamie assiste tudo de longe, enquanto Waldo fica cada vez mais importante e a sua vida cada vez pior… a sequência final, dos créditos, é desesperadora.

Um episódio muito bom!

 

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