Seu Nome Gravado em Mim (Your Name Engraved Herein, 2020)

O amor de uma vida!

Poderoso, doloroso e belo, “Seu Nome Gravado em Mim” é uma experiência impactante. O filme narra a história de amor de dois garotos, Chang Jia-han (A-Han) e Wang Po-te (Birdy), na Taiwan de 1987, logo depois da queda da Lei Marcial… o filme é sensível, lindamente interpretado e vai nos fazer sentir muitas coisas – da beleza de um amor puro e real à dor do preconceito e do medo. Com protagonistas fortes que conseguem nos fazer sentir exatamente o que eles estão sentindo, o filme se destaca por conseguir tocar-nos profundamente, culminando em duas cenas que me destruíram… duas cenas ao som da música-tema que leva o título do filme. Eu adorei o filme, mas ainda estou com o coração apertado e um nó na garganta. Não é o filme com o final feliz que eu esperava, mas também não é o filme com o final triste e trágico que eu temia que ele fosse.

Mas é melancólico.

A beleza e a dor da mais pura realidade brilhantemente representada.

O filme é apaixonante e sincero, e parte de mim queria viver eternamente naqueles primeiros 30 ou 40 minutos do filme, em que tudo era tão novo, tão aconchegante – em que a expectativa emulava o que sentimos quando nos apaixonamos pela primeira vez… quando olhamos para a pessoa que amamos e que desejamos ainda de certa distância, ainda ansiando cada aproximação, cada sorriso, cada toque… o primeiro beijo. É impressionante como “Seu Nome Gravado em Mim” consegue transpor isso para a tela, consegue evocar esses sentimentos e memórias de dentro da gente. Edward Chen, que interpreta o A-Han, e Jing-Hua Tseng, que interpreta o Birdy, se entregam de corpo e alma aos seus papéis, expressando toda a sensibilidade do amor nascente em cada olhar. Esse início é uma beleza intocável, uma obra de arte.

Birdy vem transferido para a escola em que A-Han estuda, e eles se conhecem na piscina, durante uma aula. São momentos delicados que mostram olhares furtivos em pontos muito precisos que fazem com que acreditemos naquele amor… a aproximação de A-Han e Birdy é mágica e poderosa – até por suas diferenças; Birdy é todo rebelde e corajoso, enquanto A-Han é mais engessado dentro de uma sociedade rígida. A princípio. Amo todos os momentos dos dois, seja com Birdy se escondendo na cama de A-Han para eles conversarem durante a noite ou aquelas férias que eles passam praticamente inteira juntos, invadindo salas de projeção, conversando sobre o futuro ou mesmo dividindo a mesma cama. Naquele momento, ambos pareciam muito certos do que sentiam, e parecia que nada nunca poderia dar errado para os dois.

As coisas começam a mudar no início do novo semestre, quando a escola começa a aceitar garotas, e aqui eles começam a se afastar… durante uma aula de música e umas proibições descabidas, uma garota chamada Banban se levanta para protestar, e Birdy faz o mesmo – porque esse sempre foi o estilo dele mesmo. Mas, então, Birdy e Banban começam a se aproximar, o que é uma ironia dolorosa do roteiro. Como eu acabei de dizer: Birdy sempre foi mais corajoso e mais sincero com o que sentia, com como amava A-Han, e agora é ele quem está se afastando para viver uma mentira com uma garota, tentando adequar-se a uma sociedade preconceituosa sabendo que assim será mais fácil para ele e para A-Han… mas isso depois de fazer A-Han sair de sua bolha, se arriscar, independente das demonstrações de homofobia que sofria.

Sinceramente, A-Han não merecia aquilo.

É uma subversão estranha do roteiro que me deixou confuso, cheio de sentimentos conflitantes. Eu queria gostar de Birdy, queria confiar na sua audácia e na sua determinação, mas no fim é A-Han quem realmente se joga, quem não teme o que está sentindo… enquanto Birdy se aproxima da garota, ele e A-Han se distanciam. Em uma das cenas mais impactantes do filme, A-Han ajuda Birdy a tomar banho depois de um acidente de moto e, naquele momento, o desejo deles é mais claro do que nunca… a maneira como A-Han ensaboa o corpo de Birdy, como lava seu peito, abraçando-o pelas costas, e então A-Han acaba masturbando Birdy até que ele atinja o orgasmo… e, quando o faz, Birdy beija A-Han. Depois, ele pede desculpas três vezes, e, naquele momento, eu tive certeza de que ele não estava pedindo desculpas por ter beijado A-Han, mas por tudo o que tem feito.

Por como os afastou.

Mas isso se intensifica. Depois daquele momento no banho, eles continuam se afastando, e meu coração se partiu com o sofrimento constante de A-Han, que culmina naquela cena em que Birdy sofre punição por ter feito uma declaração de amor em um balão para Banban (!), e os dois brigam. Os motivos são confusos, as intenções estão todas embaralhadas… tudo o que A-Han quer é defender Birdy do pai violento, e tudo o que Birdy quer é defendê-lo, mas os dois acabam brigando entre si e, no fim, todo mundo ao redor parece querer acreditar que os dois “melhores amigos” estavam brigando por uma garota. A-Han quase diz a verdade aos pais, quase diz que ele não tem vergonha de dizer de quem gosta de verdade, mas pergunta a Birdy se ele tem essa mesma coragem… ironicamente, quem tem essa coragem, agora, é apenas A-Han. Não Birdy. Birdy se esconde.

Os dois passam um último momento juntos quando A-Han, depois de praticamente ter se assumido para a família, foge de casa… e Birdy o segue. O que inclui ir atrás dele na rua, dentro de um trem, em uma balsa, até uma ilha distante. A-Han está em silêncio o tempo todo, ignorando sua presença, mas Birdy não sai do seu lado, até aquele momento em que Birdy ameaça ir embora e diz que “não vai se importar”… é quando A-Han se volta para ele e pergunta quando ele se importou. É tão doloroso ver um amor que não se pôde viver por causa do preconceito e, principalmente, por causa do medo. Eu “julgo” Birdy, porque eu queria que eles tivessem sido felizes juntos, mas, ao mesmo tempo, eu sei que não posso julgá-lo porque ele tinha medo e sabia que assim seria mais fácil para ele e para A-Han… mas eles vivem um último dia de amor naquela ilha, naquele mar, naquela praia.

Também poderíamos ficar ali para sempre.

Mas a narração de A-Han diz que eles não se viram mais depois daquilo… então, nosso coração se aperta, mas não sabia, ainda, o quanto ele seria dilacerado alguns minutos depois, com uma ligação de A-Han a Birdy. Provavelmente aquela foi a última vez que eles conversaram por muitos anos, quando A-Han ligou para Birdy para saber como ele estava e, mais do que isso, para dizer como ele se sentia – e ele não diz isso abertamente, ele não diz isso usando suas palavras, mas ele coloca para tocar uma música que escrevera para Birdy, e esse é o exato momento em que a gente fica destruído… o momento em que “Seu Nome Gravado em Mim” começa a tocar, e Birdy desmorona do lado de lá do telefone, chorando sentado no chão, enquanto A-Han desmorona do lado de cá. Tudo o que ele sempre quis dizer para o Birdy… em uma canção.

CARAMBA, QUE CENA FORTE.

O filme, então, nos leva 30 anos para o futuro – muito tempo depois e muitos quilômetros longe da última vez em que vimos A-Han e Birdy. Os dois estão no Canadá para o velório de um antigo professor da escola em que estudaram, um padre que ajudou muito A-Han e que ouviu toda a sua história, e eu achei muito bonito como o A-Han adulto teve todo um desenvolvimento e cenas emocionantes, mesmo que fosse um novo ator com quem ainda não tínhamos nenhuma relação… mas toda a emoção e a construção perfeita do filme fizeram com que estivesse tudo ali, com que víssemos que era, sim, A-Han. Ele visita o túmulo do padre, ele descobre que ele abandonara a igreja há muitos anos e que vivia casado com um homem (com quem A-Han pode conversar) e depois ele acaba em um bar, no qual o seu destino e o de Birdy voltam a se encontrar.

Birdy está ali.

Ansiamos por esse reencontro, é verdade, mas não sabemos bem o que esperar dele. Seria um recomeço para Birdy e A-Han? Seria a possibilidade de enfim viver tudo o que não viveram? Afinal de contas, os tempos são outros. É um verdadeiro soco no estômago assistir a “Seu Nome Gravado em Mim” e pensar em todas as pessoas que amaram como Birdy e A-Han se amaram, mas que não viveram uma vida toda por causa do medo. A-Han é a representação de uma vida não vivida, sempre preso à expectativa, à esperança e à saudade; Birdy é a representação de uma vida vivida em uma fuga, em uma mentira infeliz que não o levou a lugar algum. Ali, eles se reencontram, e as almas conversam uma com a outra. É um diálogo apreensivo, movido pelo nervosismo, pela expectativa não dita, por tudo o que eles dizem com palavras e tudo o mais que eles dizem com os olhares…

Eu acredito no recomeço. Eu acredito no amor enfim sendo vivido.

Os dois se vendo jovens naquelas ruas, cantando “Seu Nome Gravado em Mim” juntos, correndo, rindo, se amando… aquele momento foi o que me destruiu por fim. Um final melancólico, sim, mas acredito que também cheio de esperança. Um filme belo, poético, sensível, sincero. Amei.

 

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Comentários

  1. Comentário tão sensível quanto o filme. Parabéns!

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    1. Nossa, a narrativa foi exatamente o que eu senti ao assistir essa obra de arte. Pensei que somente eu estivesse dessa maneira, pensando em ter vivido uma amor assim. Essa canção na sai mais da minha cabeça, esse filme também não sai dos meus pensamentos. Uma melancolia profundamente dolorosa e boa ao mesmo tempo, como pode?
      Só sei que acabei de assistir a esse filme e já estou com saudades dos meninos sabe, uma saudade que me deixou muito triste.

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    2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Tô com medo de assistir. Chorei lendo sua resenha...

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    1. O filme mexeu bastante comigo mesmo...
      Se decidir assistir, volte contar o que achou! :)
      Muito obrigado pelo comentário!!!

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  3. Uau!!! Eu assisti o filme e, em seguida, comecei a procurar resenhas para ver a leitura que outras pessoas fizeram dele. Emocionante e doloroso, são esses os adjetivos que reputo adequados pra definir esse filme e a sua análise rs

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  4. Meu deus você nessa resenha conseguiu descrever tudo com palavras o que eu não tava conseguindo... Também fiquei muito mexido com esse filme de verdade impactante... E essa cena do telefone e a do final me destruíram também 😢😢😫

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  5. Acabei de assitir o filme e não consigo parar de chorar...tão belo, tão poético e tão doloroso...vc descreveu tudo que senti ao ver essa linda e sofrida historia de amor. E saber que é inspirada na vida do diretor...ah isso acabou comigo!

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  6. Lindos o filme e também sua resenha.

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  7. Esse filme foi maravilhoso melhor foi o reencontro ele maduros

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  8. Falou tudo oque eu tbm senti. Que filme delicado e tão real. Amei

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  9. Esse filme é incrível emocionante, a resenha acima descreve toda sensação que tive. Quase morri de tanto sofrer com o final. Precisei assistir 3 outras vezes para me acalmar e aceitar aquele final exibido. Aconselho fazerem tbm, vai dar outra perspectiva .A música salvei na minha play list, e está " gravada em mim"! O amor não deveria doer , por isso criei na minha mente o meu próprio final, onde eles retomam seu romance.

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  10. Amei o filme e essa resenha foi perfeita, descreveu tudo que o que senti...

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  11. Finalmente assisti ao filme. Para minha surpresa não chorei, rsrs.. Mas achei um filme muito emotivo, sensível. Principalmente naquela cena do chiveiro onde os dois se abraçam e choram. Enfim, um filme lindo, atores impecáveis, fotografia perfeita. Não é um filme, que eu assistiria três, quatro vezes, mas valeu muito a pena conferir.

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    1. Eu lembro que eu sofri bastante quando assisti, é um filme muito bonito, mas muito triste, por isso nunca voltei a ele. E acho que nem pretendo tão cedo haha Mas guardo ele com carinho no coração, é emocionante.

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    2. Sabe, eu gosto muito desses filmes com a temática do primeiro amor e descobrimento da sexualidade. Já assisti muitos, alguns com finais triste e outros felizes. E o que eu sempre revejo de tempos em tempos é Hoje Eu Quero Voltar Sozinho.

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    3. Ai, "Hoje Eu Quero Voltar Sozinho" é minha paixão, amo demais! Você viu que eu já escrevi sobre?

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    4. Se quiser ler, lê o texto que eu escrevi em 2020, não o de 2014, por favor. São muito distantes um do outro, tenho medo dos meus textos antigos kkkkk

      https://www.paradatemporal.com/2020/02/hoje-eu-quero-voltar-sozinho-2014.html

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    5. Olha só, vou conferir sim! Ah, vou ler o do curta se tiver também. Eu gosto dele. Mas vou deixar pra ler amanhã. Vou ver se assisto algo agora antes que o sono me vença. :D

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    6. Pior que eu nunca escrevi sobre o curta, sabia? É uma boa ideia, vou escrever ainda! :)

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