O Clube dos Cinco (The Breakfast Club, 1985)

Por que as pessoas são tão aficionadas a rótulos?

Um amado e atemporal clássico dos anos 1980, “O Clube dos Cinco” conta a história de um sábado de detenção – quando cinco alunos, cada um de um “grupo” diferente e que nunca se falaram antes na escola, precisam passar oito horas juntos e sobreviver. No meio de uma série de brigas, eles acabam descobrindo que são mais que “um atleta”, “um nerd”, “uma princesa”, “uma neurótica” e “um marginal”. Conseguimos reconhecer a direção de John Hughes – também responsável por outro clássico que eu amo, “Curtindo a Vida Adoidado” – embora os filmes sejam bem diferentes um do outro, e é impressionante como nos aproximamos desses personagens ao longo de um dia, e como eles estão diferentes quando deixam a detenção, às quatro da tarde, do que eles eram quando entraram, às sete da manhã… se continuaram sendo na segunda, é um mistério.

O filme mexeu comigo, o suficiente para eu estar chorando no final, naquela memorável cena em que, sentados no chão da biblioteca, eles compartilham suas histórias e os motivos que os levaram à detenção… e esse é um “mistério” recorrente do filme: o que o atleta e o nerd fizeram para estar ali, por exemplo? Gosto de como o filme está concentrado no cenário da escola e em apenas um dia. Começa com a chegada dos cinco à escola, e é evidente que aquilo vai ser um desastre… o professor, amargurado e cansado da profissão, os manda ficarem sentados, os proíbe de se mover, e pede que cada um escreva uma redação sobre “quem eles acham que são”, e então os deixa sozinhos… eles estão bravos de estarem ali num sábado, cada um lidando com seus próprios fantasmas, então é natural que os adolescentes estejam no limite…

E por isso eles brigam tanto…

E porque John Bender, o “marginal”, adora provocar a todos, o tempo todo… John Bender é, na verdade, um personagem bastante infeliz, de quem nós aprendemos a gostar, eventualmente – pelo menos um pouco. Mas ele é irritante e cansativo, porque ele está com raiva do mundo, quer descontar em qualquer um e adora caçar briga… ele provoca as meninas, debocha dos meninos, e acaba compartilhando a história de sua família, e ele realmente tem uma família difícil, o que me faz pensar que ele está de detenção (e não se importou de pegar detenção pelos próximos 8 sábados, pelo menos) porque, para ele, é melhor estar ali do que estar em casa com os pais. Os outros quatro continuam irritados com as provocações e grosseria constante, mas a verdade é que eles conseguem ver o quanto, no fundo, ele precisa de um amigo.

Ou de qualquer tipo de ajuda.

“O Clube dos Cinco” também traz algumas cenas divertidas que eu adorei, embora esse não seja, no fim, o foco do filme. Dentre essas cenas divertidas, temos a cena dos cinco correndo pelos corredores da escola, tentando enganar o professor para escapar da escola (e John acaba se sacrificando por eles, no fim); ou a cena em que John é separado deles e invade a biblioteca pelo teto (!), e todos eles o ajudam a se esconder, escondendo seus barulhos com batidas nas mesas e tosses fingidas; ou ainda a excelente cena do almoço, cada personagem com a sua peculiaridade, como a quantidade de comida de Andrew, o “atleta”, ou o sanduíche maluco de Allison, a “neurótica” – destaque para o fato de John não ter trazido almoço algum; e, por fim, aquela divertidíssima cena em que eles fumam maconha juntos e temos algumas das cenas mais icônicas do filme.

Brian, o “nerd”, chapado é UMA DAS MELHORES COISAS DO FILME!

Aos poucos, inevitavelmente, estranhos laços surgem entre eles… não é que eles se tornem amigos de verdade, nem nada assim, mas eles se tornam algo – há a semente de uma possível amizade ali que nasce da compreensão e da cumplicidade. Existe a cumplicidade que fez com que John Bender se entregasse para proteger os outros quatro enquanto eles voltavam para a biblioteca quando todos tentaram escapar, ou que faz com que Brian mantenha a maconha escondida na cueca, porque sabe que o professor nunca desconfiaria dele, ou ainda o “choque” nascido da percepção de que os outros têm problemas sérios com que lidar diariamente… e uma série de diálogos menos importantes que acontecem durante o dia (a “namorada” de Brian no Canadá!), que ajudam a completar esse dia tão intenso e que significou tanto para todos.

Mas eles ficam amigos de verdade, ou algo mais que isso, naquela cena em que eles se sentam no chão e conversam – aquela cena é longa e dura quase todo o último ato do filme, e é ali que sentimos que os conhecemos de verdade… e é ali que eles se revelam, que eles permitem que os outros os vejam como eles realmente são, com os seus problemas, com as suas inseguranças e dúvidas… e seus medos. Acho que aquela cena contém todo o mote do filme: a maneira como às vezes as pessoas julgam umas às outras, mas não são assim tão diferentes umas das outras… cada um enfrenta um tipo de problema, mas isso não significa que seu problema seja maior ou menor do que o do outro. Cada um está lidando com algo, e é importante que eles percebam que os outros estão passando por coisas que às vezes a gente nem imagina.

Acho que isso está fortíssimo nos personagens de Andrew e Brian, nessa última parte do filme… descobrimos já que Claire tem todo um problema com ser virgem, John vem de uma família abusiva, e Allison se revela “uma mentirosa compulsiva”, mas algo que ouvimos durante o filme, especialmente durante as provocações de John, é que “algumas pessoas não têm problemas”. Ele não diz com essas palavras, mas vindo de sua família e de seus próprios problemas, ele não consegue imaginar que tipo de problema Andrew, o atleta popular, pode ter; ou que tipo de problema Brian, o aluno perfeito e bom filho, pode ter. E os dois compartilham suas histórias nessa cena e é um momento fortíssimo… diz-se que essa cena, no roteiro do filme, não tinha falas, e os atores tiveram a liberdade de improvisar e dizer o que queriam.

E ficou incrível e doloroso!

Andrew, o “atleta”, compartilha o motivo que o levou à detenção, e tem a ver com bullying que ele fez contra um garoto, mas o que torna o seu relato doloroso é a forma como ele conta a história em detalhes, eventualmente nos tornando cúmplices de suas atitudes, e como entendemos que ele nunca quis fazer algo assim… ao fazer o que fez, machucando de verdade esse outro garoto, ele só consegue pensar na humilhação que foi para ele, e como foi chegar em casa e ter que explicar para sua família o que ele fez… e Andrew ainda explica que ele fez o que fez por causa do pai, não por causa dele. Ele fez porque o pai, que é um babaca, vive contando sobre o seu tempo de escola e Andrew tem medo de não ser “legal” o suficiente para o pai… é tudo movido pela insegurança, pela pressão, e isso pesa demais sobre Andrew… forte.

Mais forte ainda, para mim, foi ouvir o relato de Brian, o “nerd”, e ele me levou às lágrimas, porque muitas vezes as pessoas não dão atenção para um relato como o dele… em algum momento da cena, ainda antes de Claire “mostrar suas habilidades com o batom”, ele comenta sobre como tirou um F na aula de marcenaria porque tinha que fazer um abajur de elefante e a luz não acendia, e é muito fácil olhar para ele e desmerecer seu problema: “É isso que te faz sofrer?” Mas a gente nunca pode julgar a dor do outro… quando a fala volta para ele, quando sugerem que ele não entende a “pressão”, Brian compartilha o motivo que o levou à detenção: o diretor encontrou uma arma no seu armário. A maneira como ele fala de seu fracasso, como fala que não pode ter um F no seu histórico, e como isso lhe dói a ponto de pensar em tirar a própria vida…

Quantas pessoas não passam por isso? Eu sou professor… eu sei, eu vejo.

E isso me doeu demais. Chorei demais ouvindo o Brian!

E, depois disso tudo, os cinco realmente criaram um laço que talvez eles nunca tenham tido com mais ninguém… que eles não têm com seus “amigos” do dia-a-dia, porque ali, pela primeira vez, eles puderam ser eles mesmos, deixar que os outros os vissem como eles realmente são, e isso é íntimo demais! Eles descobrem que todos têm problemas, que ninguém se dá bem com os pais, e eles se perguntam se se tornarão seus pais quando forem adultos, e chegam à conclusão de que isso é inevitável, o que também é doloroso. E eles se perguntam, por fim, a respeito do que será deles quando a detenção acabar… como eles agirão na segunda de manhã? Eles ainda serão amigos? Na verdade, Claire e Andrew acham que não, por causa de todas as pressões sociais, e eu sofri com as lágrimas de Brian, porque naquele momento ele teve esperanças de que as coisas mudassem…

Que ele não fosse mais invisível.

O que será deles na segunda, não sabemos… eu gostaria de pensar que eles não voltaram para suas vidas antigas, para suas máscaras, para as suas fronteiras, que Allison e Brian, principalmente, não estariam sozinhos… mas não sei. No fim, apenas uma redação é escrita, por Brian, e é um verdadeiro tapa na cara do professor e da escola, porque ele diz que não há motivo para escrever uma redação sobre “quem eles pensam que são”, se ele sempre vai vê-los do jeito que ele quer, dentro dos rótulos pré-estabelecidos: o atleta, o nerd, a princesa, a neurótica e o marginal… mas a verdade é que eles são muito mais do que esses rótulos podem representar, porque todos somos. E Brian fica muito satisfeito com as palavras que escreveu, que são poucas, mas dizem tudo o que eles sentiram e aprenderam nesse dia de detenção… e ele assina como “O Clube dos Cinco”.

Emocionante! Amo o filme!

 

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