A Mulher Rei (The Woman King, 2022)
Agojie.
SERÁ QUE
TEMOS AQUI O VENCEDOR DO OSCAR 2023? Fascinante e intenso, “A Mulher Rei” está preparado para arrebatar prêmios no mundo do
cinema – atualmente com 94% de aprovação da crítica especializada e 99% de
aprovação do público no Rotten Tomatoes, o filme é possivelmente o filme mais
bem avaliado e mais bem comentado do ano, deslumbrando audiências. Ambientado
na África Ocidental do Século XIX (mais especificamente 1823), o filme é um
drama histórico perfeito, contando a história das Agojie, um grupo de
guerreiras do Reino de Daomé, a “arma secreta” daquele povo, peça
importantíssima na batalha contra o Império de Oyó e contra o regime escravista
alimentado por eles… com visual e atuações impecáveis, sequências de ação de
tirar o fôlego e uma trilha sonora incrível, “A Mulher Rei” é mesmo um marco!
Também vale
ressaltar a participação feminina na parte criativa e de produção – o filme é
dirigido por Gina Prince-Bythewood, e o roteiro é escrito por ela e Dana
Stevens; Viola Davis é o primeiro nome que aparece entre os produtores, além
de, é claro, ela dar vida brilhantemente à Nanisca, a intensa protagonista de “A Mulher Rei”, aquela mulher forte,
determinada e dura, com uma história difícil, e a sua atuação desempenha um
papel importantíssimo no estrondoso
sucesso do filme, porque ela transmite muita verdade em cada cena, e faz com que gostemos de sua personagem, que
não é caracteristicamente carismática. O que Nanisca faz conosco é gerar, com
maestria, admiração, algo que nasce
no prólogo do filme, quando vemos as Agojie em ação pela primeira vez (e é uma
sequência de nos deixar vidrados!), mas que se intensifica a cada cena.
O roteiro é
muito bem conduzido… temos a iminente guerra entre o Reino de Daomé e o Império
de Oyó bem apresentada na narração inicial e na primeira cena, que mostra
prisioneiras dos Oyó sendo libertadas pelas Agojie, mas o filme consegue se
tornar mais didático, sem perder seu
fôlego ou sua força, quando chegamos ao Palácio e conhecemos o Rei Ghezo de
Daomé e o lugar onde as Guerreiras Agojie vivem e treinam… é através de Nawi,
uma jovem de 19 anos que é “doada” pelo pai ao rei, porque ela não quer se
casar com homens violentos que bateriam nela, que adentramos com mais calma na
história, habilidades e propósitos das Agojie, e eu acho toda a trama que se
desenvolve a partir dali incrível…
entendemos de onde vêm as Agojie, como as garotas se juntam às guerreiras e
acompanhamos o intenso treinamento que lentamente as transforma.
Nawi é uma
personagem interessante – e um contraponto interessante à disciplina das Agojie
representada por Nanisca. Jovem e rebelde, Nawi quer ser a melhor guerreira das Agojie, o que pode diferenciá-la das demais
de uma maneira positiva ou não… ela tem ideias bacanas que podem ser
aproveitadas, como a pólvora usada para causar explosões, mas ela também
desobedece a ordens diretas e foge dos planos, e as Agojie são guerreiras
praticamente invencíveis que trabalham juntas há anos e que funcionam por um motivo… o seu desrespeito às
regras, no entanto, pode ocasionalmente apresentar características muito
importantes para uma guerreira, como quando ela retorna para ajudar uma amiga
durante o teste final para se tornarem guerreiras, ou quando ela fica para trás
para ajudar Nanisca e apenas graças a isso Nanisca se salva.
Quando
traficantes de escravos europeus chegam à África Ocidental porque eles têm um
acordo com Oba Ade, eles estão prestes a descobrir que as coisas estão finalmente mudando… o Rei Ghezo e as Agojie não acham que eles devem continuar vendendo
seu próprio povo. Interessante toda a abordagem do filme do sistema
escravista, do ponto de vista dos africanos, porque entendemos como a briga
entre diferentes tribos favorecia o abuso europeu. Nawi, novamente
desrespeitando regras das Agojie (dessa vez em relação a não flertar com nenhum
homem), acaba se aproximando de Malik, um europeu que é filho de um homem branco
e de uma mulher do Reino de Daomé, e que a alerta sobre como o Império de Oyó
está planejando um ataque a Daomé em breve…
então, Nawi participa de sua primeira missão oficialmente como uma Agojie…
Embora
inspirado por fatos reais, “A Mulher Rei”
naturalmente toma liberdades criativas que intensificam a dramaticidade da
trama – como quando Nanisca descobre que Nawi é sua filha. Há muitos anos,
Nanisca foi feita prisioneira, foi abusada inúmeras vezes, e, quando finalmente
conseguiu escapar, estava grávida e deu a filha assim que ela nasceu… quando
Nawi completa o seu treinamento para se tornar uma Agojie, orgulhosa e com suas
primeiras cicatrizes de guerreira, Nanisca a parabeniza por ter sido a grande
vencedora, e acredita reconhecer uma marca que ela tem nas costas como a marca
que fizera na sua própria filha e onde escondera um dente de tubarão, para “marcá-la” ou algo assim. A sequência na
qual Nanisca fala sobre isso e corta a marca de Nawi, revelando o dente ainda escondido lá dentro é uma das mais
impactantes do filme.
Todo o filme
é eletrizante, e temos sequências angustiantes no clímax do filme, quando os
Oyó são atacados, as Agojie lutam bravamente e Nawi, Izogie e outras são
capturadas… Izogie teme que elas precisem fazer aquilo que Nanisca lhes ensinou
e morrer, ao invés de serem aprisionadas ou vendidas, mas Nawi está determinada
a escapar, e eu fiquei profundamente mexido pela conclusão dessa empreitada,
que eu jurei que daria certo – mas não dá. Três Agojie tentam escapar enquanto
estão sendo vendidas como escravas para os europeus, e por mais que elas sejam
guerreiras treinadas e praticamente invencíveis no combate corpo-a-corpo, não
há muito que elas possam fazer contra as
armas de fogo dos europeus, e a morte de Izogie me pegou totalmente de
surpresa e eu chorei com Nawi… o grito
repleto de dor de Nawi é de arrepiar.
Depois da
morte de Izogie, Nawi está mais
determinada a escapar do que nunca, e ela poderá contar com a ajuda de
Nanisca e outras Agojie – mesmo que Nanisca esteja prestes a ser coroada Mulher
Rei ao lado do Rei Ghezo, ela desobedece a uma ordem dele para fazer aquilo que
acredita ser necessário e resgatar as prisioneiras… dentre elas, sua filha.
Sendo um belo paralelo com a cena inicial do filme, temos aqui a batalha mais
intensa e sangrenta das Agojie, que derrotam o Império de Oyó e retornam para
casa sujas e ensanguentadas, mas de cabeça erguida com a vitória: chega de vender seu próprio povo aos
europeus. Tudo aquilo é tão grandioso, tão inspirador, tão épico que nós
assistimos de peito estufado e orgulhoso, e é prazeroso ouvir a satisfação do Rei Ghezo enquanto reconhece a
força e a liderança de Nanisca, a tornando Mulher Rei do Reino de Daomé.
“A Mulher Rei” é forte e marcante. A
trama é conduzida, principalmente, pela história de Nawi e Nanisca como
guerreiras Agojie e mãe e filha, e na guerra dos Daomé contra os Oyó, por
acreditarem na possibilidade de uma mudança, mas consegue abordar diferentes
temas de maneira consciente… adoro o fato de ser protagonizado por mulheres
negras, que representam essas guerreiras históricas, e como isso é um pedaço de
história que poucas pessoas conhecem: “A
Mulher Rei” vai ser responsável por levar essa história para além da África
Ocidental do Século XIX ou de estudiosos contemporâneos da história africana,
atingindo o grande público em cheio. O filme também brinca magistralmente com
diferentes gêneros, como a ação, o drama, a ficção histórica, construindo um
épico digno de todas suas críticas positivas. Certamente, um dos melhores
filmes do ano!
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