O Telefone Preto (The Black Phone, 2021)

“It’s for you”

Facilmente um dos MELHORES FILMES que eu assisti esse ano! Dirigido por Scott Derrickson e baseado no conto homônimo de Joe Hill, “O Telefone Preto” é um suspense emocionante e tenso que conquistou tanto a crítica quanto o público (atualmente, o filme conta com 83% de aprovação da crítica no Rotten Tomatoes, e 88% de aprovação do público). Lançado no fim de 2021 em um festival, “O Telefone Preto” chegou mesmo ao grande público em 2022, contando a história de um subúrbio de Denver no fim da década de 1970, uma cidadezinha aterrorizada pela ameaça do Sequestrador. Não considero o filme do gênero terror (embora tenha uns jump scares competentes), mas mais um thriller psicológico com roteiro profundo que gera angústia e nervosismo, enquanto torcemos por Finney, o protagonista de 13 anos que pode vingar todas as mortes que vieram antes dele.

O filme tem uma carga dramática muito densa que torna a experiência ainda mais imersiva, porque sentimos toda a pressão, a incerteza e o medo de Finney enquanto está sequestrado – a atuação de Mason Thames também merece elogios, porque é ele quem sustenta uma boa parte do filme, transmitindo com verdade todos os sentimentos do personagem, em um processo de amadurecimento inesperado, forçado e poderoso para Finney. No início do filme, Finney é um garoto que é provocado pelos “valentões” da escola, apanha porque nunca aprendeu a revidar (mesmo que “seu braço seja um míssil”), e conta apenas com a ajuda de Robin, um amigo muito bom de briga de quem todos têm medo… no fim do filme, toda a experiência traumatizante obrigou Finney a fazer o que Robin dissera que ele teria que fazer um dia: aprender a se defender.

A ambientação do filme também merece destaque. Ambientado em 1978, o filme transmite aquela vibe da transição dos anos 1970 para os anos 1980, um cenário que parece combinar muito com esse tipo de suspense, e toda a primeira parte do filme nos apresenta a cidade, alguns dos moradores, a família de Finney, e o medo constante que paira no ar: o Sequestrador, alguém sobre quem as pessoas até temem falar. O primeiro ato do filme, ambientado todo antes do sequestro de Finney, mostra o sequestro de Bruce, o garoto contra quem Finney estava jogando no início do filme, e de Robin, um dos melhores amigos de Finney, e vemos como isso pesa sobre ele… também conhecemos os “poderes” de Gwen, a irmã de Finney, que recebe sinais em sonho, sobre quem depositamos esperanças quando Finney também é capturado pelo Sequestrador.

Toda a tensão que acompanha os momentos logo após o sequestro de Finney é desesperadora. O medo de Finney e a apreensão parecem prestes a consumi-lo – felizmente, o perverso criminoso por baixo da máscara sinistra gosta de fazer “joguinhos” antes de matar suas vítimas, e é isso o que dá a Finney o tempo de reagir. E ele tem ajuda. No porão onde ele está sendo mantido trancado, existe um telefone preto – embora o telefone esteja desconectado e o Sequestrador diga que “ele não funciona”, Finney o escuta tocar algumas vezes e, inicialmente, não ouve nada ao atendê-lo… até escutar alguém do outro lado dizendo o seu nome. Ficamos apreensivos e ansiosos ao lado de Finney, esperando entender o que vai vir do outro lado, até o momento em que o Sequestrador deixa a porta aberta, mas uma voz no telefone manda Finney não subir…

É uma armadilha do Sequestrador.

O telefone preto, que dá título ao filme, é mesmo o grande diferencial da narrativa, e é o que sela a obra-prima do suspense que estamos assistindo, porque, assim como a irmã, Finney também tem certa conexão com o que não faz parte do mundo mortal. Do outro lado da linha, Finney recebe a ajuda das vítimas do Sequestrador que foram mortas antes dele: Bruce Yamada, Billy Showalter, Griffin Stagg, Vance Hopper… e nós sabemos que a última ligação vai ser de Robin Arellano, seu amigo, o último sequestrado antes dele. A direção das cenas das conversas de Finney com os espíritos das vítimas antes dele é brilhante, tanto pela maneira como a voz vem através do véu/do telefone, quanto pelos momentos em que os espíritos nos são mostrados, “interagindo” com Finney sem que ele possa vê-los, e geram cenas incríveis de tirar o fôlego.

Cada ligação é uma pontada de esperança cheia de tensão, e cada ligação parece uma fase de um treinamento que Finney não sabe que está recebendo – até culminar em sua fuga. Bruce lhe fala sobre um azulejo solto que ele pode tirar e começar a cavar um túnel para escapar, e é a primeira esperança de Finney; Billy, por sua vez, fala sobre uma corda que ele descobriu e que Finney talvez possa usar para escalar a janela do porão e escapar, e embora Finney encontre uma maneira de prender a corda na grade da janela, a grade acaba soltando e Finney continua preso; Griffin é quem deixa Finney mais perto de escapar, e gera uma das sequências mais tensas de todo o filme, porque ele informa a Finney que o Sequestrador está dormindo e lhe mostra onde anotou a combinação do cadeado na porta, mas ver Finney chegar à rua, correr e ser pego de volta é desesperador.

Depois, Finney recebe a ligação de Vance, que fala sobre como ele pode quebrar uma parede em frente ao vaso, que vai dar no refrigerador, e embora Finney chegue mesmo no refrigerador, ele não consegue abrir a porta do lado de dentro… aqui, temos um dos momentos mais tristes do filme, que é quando a frustração toma conta de Finney e ele chora, desconsolado e desesperado, acreditando que não há mais nada que ele possa fazer para conseguir escapar, e sentimos toda a dor do personagem (uma cena poderosa!) – e, então, ele recebe a ligação que todos estávamos esperando, a de Robin Arellano. Conversar com um amigo é importante, e quando Finney fala sobre como “já tentou tudo”, Robin lhe instrui a encher o telefone de terra e o treina para que ele ataque o Sequestrador e escape, e diz que aquela é a última ligação: de agora em diante, cabe a ele…

Mas ele precisa se livrar do Sequestrador, por todos que vieram antes dele.

E por todos que viriam depois.

A sequência final, de Finney x o Sequestrador é surpreendente e eletrizante. Tensos, torcemos por Finney com o coração na mão, e o filme entrega uma sequência inteligente (novamente, o roteiro e a direção de “O Telefone Preto” sendo pontos altos do filme) que mostra a importância de todas as ligações até aquele momento – cada conversa de Finney com os espíritos culminou naquele momento, e a todas as conversas é atribuído significado… um roteiro redondinho. É o momento de Finney, é um plano seu, mas é o resultado de tudo o que ele viveu e aprendeu enquanto esteve naquele porão, atendendo ao telefone preto. Ele usa a corda de Billy, a grade da janela e o buraco cavado graças ao Bruce para derrubar o Sequestrador em uma armadilha; depois, ele usa o ensinamento de Robin para atacar o Sequestrador; por fim, a carne conseguida graças a Vance para distrair o cachorro, e novamente a combinação de Griffin para escapar.

Certamente, uma sequência marcante – intensa e chocante, é aquele tipo de cena capaz de desencadear um sentimento de catarse poderoso no espectador, e acho que era exatamente o que “O Telefone Preto” buscava com ela. É o auge da atuação de Mason Thames quando vemos sua “transformação” ao encarar o Sequestrador de frente, e quando ele improvisa com a corda do telefone e ele toca pela última vez, mas Finney sabe que não é para ele dessa vez: a voz dos garotos mortos falando com o Sequestrador, usando, com exceção de Robin (a morte mais recente), as mesmas frases que já disseram durante o filme, em conversas com Finney, e todas se encaixando perfeitamente à situação… que cena icônica! A carga emotiva, também, do Finney destrancando a porta e saindo de dentro da casa, encontrando a irmã do outro lado da rua, para onde trouxe a polícia graças aos sonhos, e o abraço dos dois.

Wow.

“O Telefone Preto” é um filme excelente porque se sobressai em tudo aquilo em que se propõe, mesclando, de maneira surpreendente, o suspense e o horror de uma situação traumatizante com o drama e a emoção conquistados pela relação de Finney com a irmã e com o melhor amigo, a conversa com as vítimas anteriores, e o amadurecimento de Finney, que termina o filme muito diferente de como o começou… é um filme inusitadamente sensível, gerando o melhor thriller que ele poderia ser, porque nos afeiçoamos aos personagens, torcemos por eles e, mais do que isso, acreditamos neles, e isso torna o filme mais poderoso. Excelentes atuações, que mostram entrega e verdade, direção competente criando uma atmosfera palpável de tensão, e um roteiro inteligente e sem pontas soltas, construindo sua narrativa gradativamente até culminar em uma conclusão impactante e crível.

Filme recomendadíssimo!

 

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