Hoje é dia de Maria, Primeira Jornada – Episódio 7: Neva no Coração

Gelado.

Que sensibilidade e que beleza! No episódio mais longo de “Hoje é dia de Maria”, Letícia Sabatella se despede da personagem em um episódio repleto de emoção e poesia. Conforme a primeira jornada de Maria se aproxima do fim (ou do começo), felicidades e tristezas a esperam em seu caminho, como Rosa lhe conta ao ler sua sorte. E a primeira grande alegria de Maria em “Neva no Coração” é um reencontro pelo qual esperou há anos, com o Pai, que caminha por onde Maria se apresenta com os Saltimbancos e escuta a voz da filha, que ainda é capaz de reconhecer mesmo depois de tantos anos, enquanto ela recita palavras belas e repletas de significado… o reencontro de pai e filha é um momento terno e a representação da poesia de “Hoje é dia de Maria”.

A grande alegria de Maria, no entanto, não vai durar muito – como, no fundo, ela talvez sempre tenha sabido, porque quando Rosa lhe advertiu disso, ela aceitou conformada com a realidade de que o bem e o mal sempre estiveram muito conectados em sua caminhada. Asmodeu encontrou maneiras astutas e perversas de manter o Pai afastado de Maria enquanto pôde, durante anos de caminhada sem rumo certo, mas eventualmente ele não pôde mais impedir o que o destino queria reunir há tanto tempo. Assim, pai e filha se tornam parte de uma mesma companhia de teatro, e é bonito ver a maneira como a vida dele encheu-se de significado e de paz quando sua busca aparentemente interminável chegou ao fim… e ele sentiu que podia morrer em paz.

O Pai teve a oportunidade de estar com Maria durante alguns dias antes de partir desse mundo, mas ele já estava com a idade avançada e com a saúde debilitada de tantas caminhadas sob o sol, e tudo o que ele queria era poder ver a filha mais uma vez antes de partir. Toda a sequência de sua morte é dolorosa, mas muito bonita, porque ele sai caminhando pela neve gelada durante a noite e encontra Conceição, a esposa que morreu há tanto tempo, e os dois sorriem, conversam e revivem momentos ao redor da fonte em que tiveram o seu primeiro encontro e o seu primeiro beijo… em paz, o Pai morre sentado ao lado da esposa de quem tanto sentiu falta, e Maria o encontra mais tarde, caído no gelo já sem vida, e Rosa precisa convencê-la a deixá-lo ali.

A dor de Maria com a perda do pai ainda é agravada pela estranha ausência do Amado. Na última noite em que estiveram juntos e ele tardou a querer se despedir dela, ela teve um pressentimento de que algo ruim estava por acontecer, e ele simplesmente não retornou nas noites seguintes… no fundo, ela sabe que não é por vontade própria e que alguma coisa o deve estar impedindo, mas, ainda assim, ela sofre com a sua ausência e o busca diariamente, enquanto Quirino é cada vez mais tentado por Asmodeu para colocar em prática ações que estavam apenas em sua mente – e se não fosse por Rosa, talvez Quirino tivesse mesmo matado o amor de Maria na esperança de que isso lhe desse qualquer chance de estar com ela… o que jamais foi possível.

Quando o Amado escapa com a ajuda de Rosa, Asmodeu dá um jeito de mantê-lo afastado de Maria, fazendo algo que nunca associamos ao demônio, mas que é perfeitamente justificado em “Hoje é dia de Maria”: Asmodeu convoca o gelado de seu coração e de suas maldades para se solidificarem em forma de neve que toma conta da paisagem… um frio que leva o pai de Maria, espanta a audiência dos saltimbancos e congela o Amado até que o seu coração aparentemente pare de bater. Enquanto isso, Maria segue buscando por ele, ainda mais quando Rosa convence Quirino a contar-lhe toda a verdade e Maria vê a jaula na qual seu Amado foi preso durante várias noites. Ela não sabe se ele está vivo, mas ela quer acreditar que sim e talvez seja justamente isso o que o mantém vivo.

Maria encontra o Amado congelado e “Hoje é dia de Maria” entrega uma sequência que é um tanto desesperadora, mas também tem uma pungência teatral e dramática tão intensa que nos arrebata. Maria oferece todo o seu calor – em forma de abraço, de toque, de sangue, de fogo –, enquanto implora para que o Amado retorne à vida e retorne para ele, e assim o seu coração volta a bater… um coração em um peito trancado, mas que pode ser aberto por Maria e a chavinha que ela perdera ainda na infância: o seu tesouro é o seu amor. Com o coração do Amado em suas mãos, Maria o aquece e o dá vida, até que os dois estejam reunidos novamente, satisfeitos e entregues um ao outro. Não canso de dizer: a beleza e a poesia dessa minissérie me encantam.

Então, Asmodeu dá sua última cartada: se o amor de Maria lhe faz bem e lhe dá tanta vida, ele pode arrancar isso dela lhe devolvendo aquilo que ele mesmo roubou e, portanto, é o único que pode devolver… e devolve a Maria a sua infância. Assim, aqueles anos perdidos ficam todos para trás, bem como as experiências de Maria quando se tornou adulta. Ela está de volta às suas trancinhas, aos seus laços vermelhos, ao seu vestido original e à trouxinha que carrega nas costas. De volta à sua jornada pelas estradas em busca das franjas do mar ou, quem sabe, em busca de casa, não sabemos. Assim como é impactante ver Maria crescer, é impactante vê-la voltar a ser a Maria de Carolina Oliveira que conhecemos no início de “Hoje é dia de Maria”, e nos encaminhamos para a conclusão da primeira jornada…

O próximo episódio é um dos mais lindos de toda a minissérie.

 

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