A Invenção de Hugo Cabret (Brian Selznick)
“Prepare-se para entrar em um mundo onde o mistério e o suspense ditam as
regras.
Hugo Cabret é um menino órfão que vive escondido na central de trem de
Paris dos anos 1930. Esgueirando-se por passagens secretas, Hugo cuida dos
gigantescos relógios do lugar: escuta seus compassos, observa os enormes
ponteiros e responsabiliza-se pelo funcionamento das máquinas.
A sobrevivência de Hugo depende do anonimato: ele tenta se manter
invisível porque guarda um incrível segredo, que é posto em risco quando o
severo dono da loja de brinquedos da estação e sua afilhada cruzam o caminho do
garoto.
Um desenho enigmático, um caderno valioso, uma chave roubada e um homem
mecânico estão no centro desta intrincada e imprevisível história, que, narrada
por texto e imagens, mistura elementos dos quadrinhos e do cinema, oferecendo
uma diferente e emocionante experiência de leitura”
UMA DAS
MINHAS HISTÓRIAS FAVORITAS NO MUNDO! Popularizado pelo filme de 2011
protagonizado por Asa Butterfield, a história de um garoto órfão que vive
escondido nas paredes de uma estação de trem, cuidando dos relógios para que
eles continuam funcionando perfeitamente e acaba esbarrando na história do cinema foi contada pela
primeira vez em “A Invenção de Hugo
Cabret”, um livro de 2007, escrito e ilustrado por Brian Selznick – e é uma
das leituras mais incríveis que eu fiz na vida. Além de sempre ter amado a
história e a maneira como ela é fascinante como a aventura de Hugo Cabret, mas, também, como uma homenagem ao
cinema e a Georges Méliès, o livro me surpreendeu por suas escolhas narrativas
que mesclam texto e imagem de uma maneira nova
e bonita, proporcionando uma experiência de leitura única.
A união
perfeita de texto e imagem me arrebatou desde as primeiras páginas, emulando
uma sensação de cinema e de quadrinhos, mas sem ser cinema ou quadrinho. Em “A Invenção de Hugo Cabret” (e,
acredito, nos seus demais livros também, que pretendo ler em breve), Brian
Selznick intercala a narração por palavras com a narração por imagens, mas não
é meramente “um livro ilustrado”. Diferente do que normalmente acontece, as
ilustrações de “A Invenção de Hugo
Cabret” não são representações visuais do que estamos lendo, mas parte
única da narrativa de modo que o que está
nas imagens esteja apenas nas imagens – é preciso lê-las com atenção, e é
brilhante como isso proporciona ao leitor uma imersão ainda maior na história, e como o autor consegue se utilizar disso
para manipular o tempo de leitura e
fazer com que sintamos o que é
necessário.
Destaco um
momento que me marcou muito e que é, possivelmente, a representação perfeita do
que Brian Selznick estava fazendo ao conceber sua história desse modo: o
momento em que o dono da loja de brinquedos pega o caderno que pertencera ao
pai de Hugo Cabret. Se o autor tivesse contado, com palavras, que o homem se
deteve em uma figura que lhe chamou a atenção e passou alguns segundos olhando
para ela, a passagem teria sido breve e, eventualmente, esquecida – era só um
detalhe. Através das imagens, no entanto, vemos o caderno do pai de Hugo aberto
em uma página com o desenho do autômato e, conforme viramos páginas e páginas
do livro, o caderno continua aberto naquela mesma página e o desenho se
aproxima, enquanto a mão do dono da loja paira sobre a ilustração… ali, o autor
nos fez ficar nesse momento por segundos…
Nos fez
sentir essa hesitação, essa confusão, esse mistério… como o audiovisual pode
fazer.
QUE
NARRATIVA BRILHANTE, DE FATO!
A história
acompanha Hugo Cabret, um garoto de 12 anos que mora sozinho em um quartinho
dentro das paredes frias de uma estação de trem em Paris, no início do século
XX. Depois da morte do pai, Hugo foi levado para morar com o tio, que era o
cronometrista da estação, e, depois que o tio simplesmente não voltou mais para casa, possivelmente morto também,
Hugo resolveu continuar ali, mantendo os relógios funcionando para que ninguém
desconfiasse de nada, e precisando se esgueirar pela estação movimentada
fugindo dos guardas e roubando comida para não morrer de fome – e pequenas
peças de brinquedos quebrados (ou brinquedos inteiros) da loja da estação, para
consertar o seu grande tesouro, um autômato que o pai encontrara abandonado no
sótão de um museu e que Hugo Cabret resgatara depois do museu pegar fogo.
Tudo o que
Hugo quer é consertar o autômato para ver o que ele faz… ele tem uma pena na
mão, o que leva Hugo a pensar que ele vai escrever algo – talvez uma mensagem
do pai, como seu coraçãozinho inocente e esperançoso imagina. Eu adoro a
construção de Hugo como personagem, porque ele é fascinante! E eu adoro como o
seu caminho encontra o de Isabelle, a astuta e decidida afilhada do velho dono
da loja de brinquedos, aquele mesmo que parece
detestar o Hugo e que fica com o seu caderno com os desenhos do pai quando
o vê. Os dois acabam se tornando inusitados amigos, e Isabelle promete ajudá-lo
a recuperar o caderno, desde que ele compartilhe com ela o seu segredo e,
eventualmente, ele precisa fazê-lo, porque ela tem a chave que é a última peça
de que ele precisa para fazer o autômato funcionar, no fim das contas.
Adoro como “A Invenção de Hugo Cabret” traz a
imagem do CINEMA fortíssima desde a primeira parte do livro – embora isso vá se
intensificar na segunda. Todos os personagens parecem ter alguma relação com o cinema, especialmente seus
protagonistas: Hugo Cabret costumava ir a sessões com o pai no seu aniversário,
e ele acha o mundo do cinema fascinante,
assim como o pai achava, depois de ter ficado encantado com um filme que assistira no passado, de um foguete
pousando no olho da lua… Isabelle, por sua vez, é proibida de ir ao cinema por
seu rigoroso padrinho, o que não quer dizer que ela não se esgueire para
sessões sem que o tio saiba. Os dois compartilham um momento lindo no cinema
que tem tudo a ver com a fascinação gerada por essa arte, essa arte que é capaz
de realizar sonhos. Apaixonado por
cinema como sou, eu acho tudo incrível!
Quando o
autômato é finalmente consertado, ele não escreve uma mensagem, mas, na
verdade, faz um desenho… um desenho que Hugo Cabret reconhece imediatamente como o filme que o pai
assistira quando era criança, do foguete pousando no olho da lua. Trata-se de
uma ilustração de “Viagem à Lua”, de
Georges Méliès, que é o nome assinado pelo autômato no fim do desenho, e que
Isabelle reconhece de imediato: é o nome
do seu padrinho, o dono da loja de brinquedos! Eu amo essa virada que a história dá, porque é como
se começássemos uma “nova aventura”, que não é mais o conserto do autômato, mas
tem o objetivo de desvendar o que aquele desenho significa e qual é a relação
dele com o padrinho/tio de Isabelle. E, decidido, Hugo Cabret empreende uma
longa investigação que o leva à biblioteca e a um estudo sobre filmes antigos.
Sobre a
história do cinema, sobre os primeiros filmes já feitos, sobre o grande e
visionário “fazedor de sonhos”, Georges Méliès. Eu ADORO o fato de “A Invenção de Hugo Cabret” ser uma obra
de ficção que inteligentemente traz Georges Méliès, uma figura histórica real, como um dos personagens principais
da obra. Aqui, encontramos Méliès anos depois da sua acreditada morte,
completamente devastado e frustrado com a realidade de seus filmes terem sido perdidos… durante muito tempo, acreditou-se
que nenhum filme de Georges Méliès tinha sobrevivido
e, aos poucos, vários deles foram sendo encontrados e revitalizados – hoje em
dia, embora ainda existam vários filmes perdidos, temos, também, uma grande
coleção de filmes de Georges Méliès disponíveis. E esse é o mote escolhido por
Brian Selznick para a sua narrativa em “Hugo
Cabret”.
Hugo,
Isabelle e outros apaixonados pela obra de Georges Méliès, então, começam o
dramático “resgate” do gênio, em sequências emocionantes nas quais ele parece estar perdendo a razão, e a sua esposa
pede que eles “parem de revirar o passado”, mas é lindo ver, eventualmente,
Georges Méliès voltando a ser quem ele é e a fazer o que ele ama e sempre amou
fazer, com a mesma capa que usou em “Viagem
à Lua”, por exemplo, graças à determinação de Hugo Cabret e dos demais…
acho lindíssimo o momento em que um estudioso é levado à casa de Méliès e o som
do projetor e de um de seus filmes de
volta à vida fazem com que o homem se tranque no quarto, o “remodele” por
completo e se ponha a trabalhar, porque ele
ainda tem histórias para contar. A maneira como Hugo Cabret e Georges
Méliès fazem a diferença um na vida do outro é lindíssima.
Porque Hugo
Cabret, eventualmente, é descoberto… distraído da sua “obrigação” de cuidar dos
relógios da estação, que começam a parar, ele retorna para buscar o autômato e
levá-lo a Méliès (porque, afinal de contas, foi ele quem o construiu), mas
acaba sendo pego roubando, e uma perseguição angustiante toma conta da reta
final do livro, quando ele tenta fugir pela estação apinhada de gente, mas é
observado de perto, seguido, e quase é atropelado por um trem quando cai nos
trilhos… felizmente, Isabelle estranha a sua demora para voltar com o autômato
e faz com que o tio vá ver se tudo está bem, e Georges Méliès, o outrora
rabugento e amargurado dono da loja de brinquedos, parte em defesa de Hugo em
uma cena EMOCIONANTE… e, sem família, Hugo Cabret é acolhido na família de
Isabelle da maneira mais bonita possível.
“A Invenção de Hugo Cabret” é um livro
emocionante, com uma alma gigantesca. É uma leitura envolvente que faz com que
nos apaixonemos pela história, pelos personagens e pela história do cinema, e
que sintamos por todos eles… uma mescla contínua de emoções em uma leitura
deveras fascinante e linda! Amo esse livro de todo o coração! Ao fim do livro,
encontramos a família e os amigos se preparando para um evento promovido pela
Academia Francesa de Cinema, que vai exibir os curtas resgatados (pouco mais de
80 dos mais de 500 filmes produzidos) de Georges Méliès, celebrando sua vida e
obra, e descobrimos um pouco sobre o futuro de Hugo Cabret, que se torna o
grande mágico Professor Alcofrisbas, que constrói seu próprio autômato com um
objetivo especial: contar toda a sua
história e a de Georges Méliès. Lindíssimo.
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