Elvis: A Musical Revolution (Brasil, 2024)

“There will be peace in the valley for me”

Escrito por Sean Cercone e David Abbinanti, baseado na concepção de Floyd Mutrux, “Elvis: A Musical Revolution” é o musical biográfico autorizado de Elvis Presley, a estrela do rock que revolucionou a música e marcou gerações. Depois de montagens internacionais nos Estados Unidos e na Austrália, o musical chegou a São Paulo no início do mês de agosto, no Teatro Santander, sob a direção de Miguel Falabella – com direção musical de Jorge de Godoy e coreografia de Bárbara Guerra. Com um visual belíssimo e de tirar o fôlego, as grandes músicas de Elvis Presley ganham vida e são a força de um espetáculo que é, na verdade, muito mais musical do que, de fato, biográfico. Vago em muitos sentidos, a experiência vale a pena pelo show.

Sinto que há muita controvérsia e polêmica em torno da vida de Elvis… assim como de tantas outras estrelas que fazem parte da história da música. “Elvis: A Musical Revolution” é muito vago nesse sentido. A trama não traz grandes explicações, algumas coisas parecem simplesmente jogadas pelo roteiro, e muito é camuflado no meio do show… a relação de Elvis com Priscilla é pouco explorada, por exemplo, bem como os vícios do cantor, a derrocada no cassino em Las Vegas que culminou em sua morte e a participação do Coronel nisso tudo. Não tenho a impressão de que deixo o teatro sabendo mais do que eu já sabia sobre quem foi Elvis Presley, e é estranho perceber tão claramente as lacunas que foram propositalmente deixadas porque “não se queria falar sobre isso”.

Mas se a abordagem é fraca, se algumas coisas parecem desconexas e outras são ignoradas deliberadamente, eu gostei muito de como o musical se volta a algo mais íntimo, que é talvez mais fantasioso, também, mas que funciona dentro de uma obra que, de uma maneira ou de outra, é também fictícia. Percebemos que o conceito de “Elvis: A Musical Revolution” é se voltar à representação, seja ela real ou não, do Elvis como pessoa, antes de como estrela da música. Nós vemos o seu quadril inquieto e sensual causando frenesi e/ou incômodo, mas nós também vemos a relação de Elvis com a mãe, desde a infância, e essa relação é uma espécie de fio condutor dentro da obra, mantido graças à presença de um “segundo” Elvis, que é uma versão mais jovem do personagem.

Em um primeiro momento, eu confesso que não entendi a necessidade de dois atores interpretando o Elvis – já que é teatro e a mudança de idade não é um problema. Mas a presença de dois Elvis é a alma de “Elvis: A Musical Revolution”. Eu diria mais: é o que faz com que o musical funcione. Ter um ator mais jovem interpretando um Elvis que apresenta a relação do personagem com a mãe (a cena em que ele ganha o seu primeiro violão é lindíssima) é importante porque esse ator é mantido durante o restante do musical, como uma voz interna do Elvis adulto. Minhas cenas favoritas TODAS envolvem o Jovem Elvis, e gosto muito de como memórias são encaixadas em momentos-chave de forma inteligente, o que de fato humaniza o personagem…

E era a intenção do musical.

É com o Jovem Elvis que vemos a maior parte das cenas da mãe dele, mas isso é algo que ecoa dentro do Elvis Adulto – o fim do primeiro ato é um exemplo perfeito de como essa dinâmica funciona. Quando a mãe fica doente e o Elvis vai visitá-la, nós vemos ambos os Elvis sofrendo com isso, e tudo escala de uma maneira emocionante e pungente, com uma música impactante, até o momento em que os Elvis se abraçam no centro do palco. Aquela cena é tão cheia de significados, e a contagem dessa história só é possível dessa maneira pela presença de dois Elvis. A mãe retorna em memórias no segundo ato, e inevitavelmente nos perguntamos se as coisas poderiam ter sido diferentes caso ela não tivesse morrido… mas a verdade é que nunca saberemos.

O segundo ato apresenta um Elvis diferente. Da ascensão e do sucesso, começamos a ver a caída de Elvis Presley, de uma maneira que fica quase sufocante. Se tínhamos um Elvis que se realizava através da música inicialmente, encontramos aqui um Elvis que não está mais inteiramente feliz com o que ele faz – e o musical inteligentemente nos lembra disso ao mostrar o Jovem Elvis aprendendo e tocando blues porque isso era o que o fazia feliz… é como se ele não se lembrasse mais por que faz isso enquanto trabalha incessantemente, faz filmes dos quais não gosta só por causa do dinheiro e termina em Las Vegas, visivelmente infeliz. Uma grande estrela da música, um espetáculo em pessoa, ovacionado e amado… mas, no seu mais íntimo, secretamente infeliz…

Visualmente, “Elvis: A Musical Revolution” é um espetáculo. O cenário, por si só, é de tirar o fôlego e nos arrebata no momento em que entramos no teatro. Toda a estrutura repleta de escadas e diferentes níveis é bem aproveitada narrativamente, o que é um acerto e tanto. Os números musicais incluem músicas como “Peace in the Valley”, “That’s All Right”, “Heartbreak Hotel”, “Trouble”, “Can’t Help Falling in Love”, “Are You Lonesome Tonight”, “Love Me Tender” com o Frank Sinatra, e o impactante final, com “A Little Less Conversation” e “Jailhouse Rock”, que são construídas para serem uma apresentação arrebatadora que arranca aplausos da plateia e nos faz deixar o teatro com uma sensação boa… o figurino e o letreiro com o nome do Elvis acentuam a sensação.

A versão brasileira do musical conta com Leandro Lima e Robson Lima como titulares nos papeis do Elvis e do Jovem Elvis, respectivamente, mas eu assisti em uma sessão de quinta-feira, com Daniel Haidar dando um show como o Elvis – preciso dizer que ouvir a voz dele falando e cantando é uma delícia –, e Gustavo Waz como o Jovem Elvis – ou, como ele chama carinhosamente, o “Elvinho” –, e, como eu disse, eu sinto que essa versão do personagem é a alma do espetáculo e foi uma delícia assisti-lo! O elenco brasileiro também conta com Luiz Fernando Guimarães como o Coronel Tom Parker – embora eu goste muito do ator, eu acho que a comédia estava fora do tom –, Fabiana Gugli como Gladys, a mãe de Elvis, e Caru Truzzi como Priscilla.

O musical está em cartaz em São Paulo, no Teatro Santander, até dezembro!

 

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P.S.: Minhas fotinhas com ambos os Elvis que deram um SHOW no musical!

 

 


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