O Garoto Está de Volta (Meg Cabot)

“Não sabia que era possível ser feliz assim”

Ler Meg Cabot é sempre divertidíssimo… com histórias fluídas, um monte de referências legais, personagens carismáticos e sacadas inteligentes e hilárias, a autora entrega horas de leitura prazerosa, com risadas garantidas. “O Garoto Está de Volta”, lançado pela primeira vez em 2016, faz parte de um projeto da autora de resgatar grandes sucessos de sua carreira – pudemos ler um novo livro de “O Diário da Princesa” e um novo livro de “A Mediadora”, por exemplo, duas grandes séries que consagraram Meg Cabot no início dos anos 2000 (e, por sinal, fizeram com que eu me apaixonasse por sua escrita). “O Garoto Está de Volta” faz parte da série “Boy”, livros que se passam no mesmo universo e compartilham um ou outro personagem, mas que não são realmente uma sequência.

A série começou em 2002 com “O Garoto da Casa ao Lado” – que, de certa maneira, continua sendo o meu favorito. Inusitado, o livro é 100% escrito em forma de e-mails, o que rende uma leitura diferente, cativante e memorável. Depois do sucesso do livro de estreia, a série seguiu com “Garoto Encontra Garota”, de 2004, e “Todo Garoto Tem”, de 2005, verdadeiras comédias românticas que mantiveram a ideia epistolar dos e-mails, mas também começaram a brincar com outras possiblidades de escrita não necessariamente tão convencionais dos romances… fruto de uma nova época, “O Garoto Está de Volta”, que foi lançado em 2016, mantém um pouco dos e-mails, que é a marca registrada da série do qual faz parte, mas Meg Cabot precisa ir além deles.

E o faz.

Em “O Garoto Está de Volta”, além de ocasionais e-mails, também encontramos matérias de jornais como a Gazeta de Bloomville e o Diário de Nova York, mensagens e publicação de eventos no Facebook (bem como comentários), chats online, avaliação de anúncios em sites de compras, a transcrição de uma entrevista, o diário de agradecimentos de Becky Flowers, e muitas conversas instantâneas. Em alguns momentos, é impossível não perceber que o diário de agradecimentos, por exemplo, se aproxima demais da escrita em prosa, e as mensagens de texto ao diálogo, o que talvez vá de encontro à proposta original da série, mas sabemos que a ideia da série surgiu em uma época em que os e-mails estavam explodindo… e a autora fez de tudo para retornar a algo próximo.

Assim, Meg Cabot mescla diferentes tipos de escritas e publicações para entregar uma história divertida, inusitada e bem-conduzida – como sempre faz. Ler Meg Cabot é viciante e leve, e costumamos nos afeiçoar à protagonista e nos apaixonar pelo protagonista, o que segue garantido aqui! A protagonista de “O Garoto Está de Volta” é Becky Flowers, uma mulher que trabalha com a realocação de pessoas da terceira idade, e que é chamada para ajudar em uma crise familiar que envolve ninguém menos do que os pais do seu namorado de escola… alguém que ela não vê e com quem não fala há 10 anos, porque aparentemente as coisas acabaram em um desastre sobre o qual toda a cidadezinha de Bloomville sabe – e que o leitor fica ávido para descobrir.

Reed Stewart, o tal “namorado do tempo de escola”, se tornou um jogador de golfe bem-sucedido (mesmo que esteja perdendo todas as partidas, recentemente), e embora nunca tenha voltado para Bloomville por causa dos eventos aparentemente catastróficos do passado que envolvem tanto Becky Flowers quanto seus próprios pais, chegou o momento de fazê-lo – afinal de contas, aparentemente Richard e Connie (como ele chama os pais) precisam de ajuda depois de terem sido acusados de dar um golpe no restaurante Trapaça (nome sugestivo), tentando pagar uma conta com um selo que supostamente valia centenas de dólares, mas que vale menos do que a taxa de serviço cobrada pelo restaurante… eles podem até ser presos se a acusação for levada adiante!

A galeria de personagens do livro também inclui Nicole, a irmã de Becky que não quer que ela dê uma nova chance a Reed; Leanne, a melhor amiga que decide voltar do Japão porque “não pode perder isso”; Graham, o novo namorado de Becky, também conhecido como queijeiro hipster; Lyle, o tio com quem Reed foi morar depois de ter sido praticamente expulso de casa; Marshall, o irmão mais novo de Reed, que está em negação a respeito “do problema dos pais”; Carly, a esposa de Marshall e uma das personagens mais divertidas do livro; Trimble, a manipuladora, arrogante e insuportável irmã de Reed e Marshall; Dolly Vargas, que retorna como agente de Reed Stewart; e uma série de outros personagens menores que povoam a trama.

O fio condutor da narrativa é o problema dos Stewart: como livrar Richard e Connie das acusações feitas pelo Trapaça? Mais do que isso: como lidar com todos os problemas ainda maiores que essa trama toda revelou? Afinal de contas, Richard Stewart, outrora um respeitado juiz de Bloomville, agora é um excêntrico acumulador que tem uma “coleção” de quase mil malhetes (que são martelinhos de tribunal) em casa, e pilhas e pilhas de jornais que ele se recusa a jogar fora, e Connie Stewart está gastando muito dinheiro com esculturas de gatinhos, além de estar alimentando gatos da rua, por exemplo. Além disso, aparentemente eles estão falidos, devendo horrores em impostos, e fazendo “planos” descabidos que mostram que talvez eles não estejam mais em seu juízo perfeito…

Por isso, eles precisam de ajuda.

O fato de Becky Flowers ser a dona de um negócio justamente de realocação de idosos vem muito a calhar, porque é disso que os Stewart precisam: de ajuda profissional de alguém que possa convencê-los a se livrar das coisas de que não precisam e, quem sabe, se mudar para um lugar melhor e menor… e vender aquela casa. Carly é quem traz Becky para a história toda, e embora ela seja de fato a única que pode ajudar na realocação de idosos na cidade, Carly está contente em chamar Becky para trabalhar com eles, porque Reed Stewart está voltando para a cidade depois de tanto tempo, e ela acha que pode bancar o “cupido” ou qualquer coisa assim… eu adoro como Carly pode ser exagerada e se meter onde não deve ao mesmo tempo em que é a mais sensata de todos.

É evidente, mesmo através de e-mails, mensagens de texto e entradas em diários que as coisas entre Becky e Reed não ficaram tão bem resolvidas assim no passado… ainda existe sentimento entre eles, mesmo com os 10 anos que os separam. Por algum motivo, Reed nunca entrou em contato, e saiu como um verdadeiro babaca; por algum motivo também, no entanto, Becky nunca conseguiu superá-lo. Eventualmente, descobrimos graças a uma conversa de Becky com Leanne, que as coisas foram um pouco diferentes da história que toda Bloomville conhece, e, portanto, não tão grave quanto todos acreditam tampouco. Embora Reed tenha desaparecido por muito tempo, ele o fez por causa do pai, e ele ainda foi bem cavalheiro assumindo uma culpa que não era dele para livrar Becky.

Não me surpreende que ela não o tenha superado.

Até porque, ao que tudo indica, ele é um sonho.

Os protagonistas de Meg Cabot sempre são um pouco idealizados – e eu não estou nem aí, porque adoro me apaixonar por cada um deles. Gosto do jeito um pouco sarcástico de Reed Stewart, gosto de como ele flerta constantemente e sem pudor, porque está determinado a conseguir uma segunda chance, agora que voltou a ver Becky Flowers. E ela também está completamente balançada com a sua presença. É interessante que as coisas são bem mais simples do que eu esperava em “O Garoto Está de Volta”, no fim das contas: não há tantos conflitos que Becky e Reed têm que resolver para que possam recomeçar o romance, nem no passado nem no presente, e Becky também não fica lutando contra o que está sentindo por tanto tempo…

É muito mais leve e menos dramático do que eu esperava, com certeza. E embora o romance seja o centro da narrativa, o que mais gera conflito e precisa de resolução é o caso todo de Richard e Connie – e as coisas pegam fogo quando Reed descobre que quem faliu os pais foi Trimble, a irmã dele e de Marshall, praticamente extorquindo os pais durante todos esses anos desde que ele foi embora… as coisas ficam tão tensas ali que eu queria muito que o livro tivesse mais páginas para poder explorar com mais detalhes o embate contra Trimble, mas precisamos nos contentar com uma narração dos eventos pela filha dela, na avaliação de um produto (!), e alguns e-mails ácidos que são trocados entre Reed e Trimble depois que tudo vem à tona e ameaças são feitas.

É mais um grande acerto de Meg Cabot. Eu não sei se chega ao esplendor dos três primeiros livros da série – a inovação que foi “O Garoto da Casa ao Lado” ou a história de “Todo Garoto Tem”, que é a melhor de todas, por exemplo –, mas certamente “O Garoto Está de Volta” nos leva de volta para a escrita dessa autora e para a proposta diferente dessa série e nos proporciona bons momentos de risadas, sorrisos sinceros e diversão. O problema enfrentado pelos Stewart gera momentos absurdos e hilários, o destaque na relação entre os membros de uma família quase disfuncional gera momentos de diversão e de tensão igualmente, e o romance de Becky e Reed é um daqueles romances que nos faz torcer pelos personagens e nos alegrar por eles, no fim.

Uma ótima leitura, com certeza!

 

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