A Invenção de Hugo Cabret (Hugo, 2011)
O mundo é uma máquina sem peças sobressalentes.
Misturando
história e ficção, “A Invenção de Hugo
Cabret” é uma belíssima homenagem à arte de trazer sonhos à vida que é o cinema. Baseado no livro homônimo de
Brian Selznick, o filme de 2011 traz o grande cineasta Georges Méliès como um
personagem de uma narrativa emocionante e visualmente impactante, e é um grande
presente a todos os apaixonados por essa arte. Assim como o livro de 2007
explora diferentes linguagens em uma maneira singular de fazer literatura e
encantar, o filme de 2011 brinca com a metalinguagem e se constitui como uma
obra tanto inspirada quanto inspiradora, que te conduz pela história e
curiosidade de Hugo Cabret, enquanto ele tenta consertar um autômato esperando
uma mensagem do pai… e conserta mais de uma “coisa quebrada”.
“A Invenção de Hugo Cabret” é um
daqueles que eu chamo de “filmes da minha vida”. É um filme que me marcou demais, e que fez parte do
começo da história da minha vida adulta – assisti ao filme pela primeira vez em
2011 mesmo, por exemplo, e comecei minha faculdade de Letras em 2012, e estudei
uma disciplina optativa justamente de História
do Cinema no primeiro ano, onde me aprofundei nos filmes de Georges Méliès
e me apaixonei pela maneira como toda essa magia, essa paixão e essa inspiração
ajudaram a fazer do cinema o que ele é hoje… e o cinema sempre foi algo pelo
que eu sou apaixonado. Por isso, assistir a “A
Invenção de Hugo Cabret” é algo muito pessoal, e eu me sinto como Hugo e
Isabelle no cinema, encantado com cada detalhe.
Gosto muito
de como o filme “esconde” o seu verdadeiro propósito inicialmente, e como a
narrativa acompanha o ponto de vista do pequeno Hugo Cabret, um garoto órfão
que foi morar com o tio em uma estação de trens depois que o pai morreu em um
incêndio no museu em que trabalhava, e que agora vive sozinho se esgueirando
por dentro das paredes, cuidando dos relógios da estação para que ninguém dê
pela falta do tio e fugindo do cruel guarda, que quer pegá-lo e mandá-lo para o
orfanato… seu grande objetivo é terminar de consertar um autômato que o pai
encontrara abandonado no sótão do museu e trouxera para casa, e no qual eles
trabalharam juntos por muito tempo, mas cujo conserto não tiveram a
oportunidade de terminar antes da tragédia.
Agora, é a única coisa do pai que lhe resta…
e consertá-lo pode deixá-lo mais perto do pai.
É muito
bonito como o filme parece quase despretensioso
inicialmente, mas fascina por seu visual impecável e uma atuação inspirada de
Asa Butterfield (ator que já tinha protagonizado “O Menino do Pijama Listrado” nessa época), que dá ao seu
personagem uma força e uma determinação convincentes e nos faz torcer por ele…
os personagens de “A Invenção de Hugo
Cabret”, que têm algo de muito
teatral, poderiam se render à caricatura facilmente, mas ficam no limiar e,
curiosamente, são profundamente humanos por isso. Há muita verdade nas reações
do Hugo, na curiosidade incansável de Isabelle, no amor e proteção de Jeanne, e
na dor de Georges, mesmo antes de sabermos os eventos que o deixaram tão
amargurado e, mais do que isso, tão triste.
Com a ajuda
de Isabelle, Hugo consegue a última peça
que faltava para consertar o autômato, e a mensagem desenhada é a clássica
imagem do filme “Le Voyage dans la Lune”,
de 1902, por Georges Méliès, do foguete que aterrissou no olho da lua – o primeiro filme que o pai de Hugo Cabret viu e
que despertou a sua paixão por cinema. E, naquele momento, o filme se transforma
lindamente em um tributo à história do cinema e a Georges Méliès, conforme as
crianças passam a investigar o passado do “Papa Georges” e, com isso, descobrem
que antes de ele ter uma loja de brinquedos na estação, ele fazia sonhos… Georges Méliès começou sua carreira como mágico,
mas assim que ele conheceu a invenção dos Irmãos Lumière, ele sabia que
precisava se dedicar àquilo.
A
importância de Georges Méliès para o cinema é inegável. Ele viu o cinema como
um meio de dar vida aos sonhos, foi pioneiro em vários sentidos, e produziu
mais de 500 filmes que foram marcantes para uma geração e quase todos perdidos
nos anos da Primeira Guerra Mundial – até que o trabalho de Méliès voltasse a
ser lembrado, valorizado e resgatado…
não por completo, mas muitos dos filmes foram recuperados (atualmente, quase
200 filmes de Méliès sobrevivem). “A
Invenção de Hugo Cabret” se dedica justamente a essa fase da vida de
Georges Méliès e mescla história e ficção nessa romantização da recuperação do seu trabalho (de fato ele
foi afetado por essa perda e foi trabalhar em uma loja de brinquedos em uma
estação), culminando no seu merecido reconhecimento.
O filme “A Invenção de Hugo Cabret”, assim como
o livro original de Brian Selznick, é MARAVILHOSO e eu o amo de todo o meu
coração. É tanto encantador acompanhar Hugo Cabret, torcer por ele e ficar
feliz quando ele encontra uma família e um lar, quanto é fascinante conhecer um
pouco mais de Georges Méliès, do seu trabalho e da história do cinema, algo que
amamos tanto e que nos faz tão bem. O filme tem um tom introspectivo, com um
quê de melancolia, mas uma mensagem de amor e de esperança que acabam por
torná-lo aconchegante – e terminamos
de coração aquecido. Para mim, é um filme obrigatório a todos os amantes da
arte do cinema, e que deve ser apreciado como a obra de arte e a homenagem que
ele é.
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